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CHINA | O que há por trás do colapso das bolsas?

O seguinte artigo é uma versão reduzida do que será publicado no próximo Nº22 da Revista Ideias de Esquerda que estará online a partir de 12 de agosto.

Paula BachBuenos Aires

quinta-feira 6 de agosto de 2015 | 03:07

O recente choque do Mercado de Valores gerou uma queda das ações de 35% em um mês, incluída a pior queda em um dia desde o ano de 2007. Isso representa o primeiro tropeço importante que enfrenta o capitalismo chinês depois do estouro da crise de 2008 e sob a nova administração de Xi Jinping, colocando para fora os grandes dilemas de sua economia. Ainda que as causas imediatas que dispararam o choque continuam sendo objeto de múltiplas especulações, a intenção do governo durante o mês de junho de frear o endividamento das empresas e limitar a influências dos bancos, se encontra entre as determinantes centrais. Esta tentativa – falida por hora – é expressão das contradições agudas que envolvem tanto os limites do lugar da China no mundo, enquanto fonte de atração de capitais, como o esgotamento do “modelo exportador” articulado e sua dificultosa necessidade de incorporar-se ao mercado financeiro internacional. Todas as determinações associadas, em última análise, a questão da capacidade chinesa de continuar atuando como fator de contenção da crise econômica mundial, assim como sobre a viabilidade de sua tortuosa tentativa em consolidar os traços imperialistas que a caracterizam.

Xangai e Shenzhen

Ao longo do último ano os grandes índices das bolsas chinesas – correspondentes às cidades de Xangai e Shenzhen -, acumularam um crescimento vertiginosos equivalente a 150% e muitos portadores de títulos haviam tomado dinheiro emprestado colocando essas mesmas ações como garantia. Apesar das quedas recentes, ainda as mesmas ações se encontram, em média, cerca de 75% acima dos valores que marcavam há um ano. É certo que o mercado de bolsas, todavia, ocupa um lugar marginal na economia chinesa. Os mercados acionários do país movem um monte equivalente a aproximadamente um terço do PIB, em comparação com mais de 100% dos países centrais. Se por um lado estes fatores delimitam a possibilidade de que a bolsa arraste o conjunto da economia chinesa, por outro lado, a existência de um grande setor bancário não regulado – denominado “banco das sombras” –, faz pensar que uma ruptura da cadeia de pagamento no âmbito das bolsas não estaria isenta de desatar uma onda de corridas bancárias, precipitando uma crise da economia.

Fundamentos depois de um boom

Os motivos do incremento acelerado da bolsa chinesa durante o último ano estão associados a múltiplos fatores, dentre os quais ressaltamos os mais significativos. Em primeiro lugar, a China atuou desde sua entrada na Organização Mundial do Comércio (OMC) o ano de 2001, como fonte privilegiada de acumulação de capital proveniente de processos de deslocamento que se desenvolviam nos países centrais, em particular Estados Unidos. Depois da crise de 2008 e depois do gigantesco plano de estímulos fiscais do governo, a economia chinesa buscou retomar um caminho de crescimento elevado que a partir do ano de 2010 a transformou em uma clara contratendência à Grande Recessão desatada na arena internacional. Durante o período seguinte e em um cenário que a China se torna a segunda economia mundial, começava a sofrer os efeitos combinados de uma tendência interna à sobreacumulação de capitais – com uma inversão de cerca de 50% do PIB e redução da rentabilidade – e os limites que o estancamento que a economia mundial impunha ao seu “modelo exportador”. Estes fatores foram o ponto de partida da tentativa da burocracia governante de efetuar um giro para um “modelo” que permitiria incrementar o consumo interno, incentivar a exportação de capitais e uma maior internacionalização de sua moeda, o Yuan, a fim de participar com maior agressividade sobre o resto do mundo e no chamado “mercado de capitais”. Se o processo de menor crescimento – o esfriamento – da economia chinesa é uma consequência lógica, derivada dos limites da continuidade do “modelo exportador”, o ritmo desse esfriamento depende estritamente da capacidade do país de levar a cabo as transformações mencionadas. Transformações cujo êxito conjunto se associa em última instância, à possibilidade/impossibilidade chinesa de reafirmar seus crescentes traços imperialistas. Até o momento, o estado de avanço dos três elementos assinalados mais acima resulta contraditório, e não espera suprir a brecha aberta pelos limites a continuidade do “modelo” anterior. A resultante é uma complexa trama, na qual se o crescimento da economia não cai abruptamente, tampouco a transformação conseguida é suficiente para manter o nível de incremento esperado pelo governo. Esta contradição explica tanto o desenvolvimento da bolha imobiliária dos anos anteriores como a recente bolha nas bolsas.

Bolhas

O estímulo de distintas “bolhas” por parte do governo – de uma maneira não muita distinta da ocidental – é uma resposta aos limites das transformações assinaladas. Tenta gerar tanto um espaço para a “valorização” de capitais que não encontram lugar para o investimento como a criação de demanda através do estímulo do crédito. Não casualmente, o crescimento da bolha bursátil do último ano, se produziu a par da retração do setor imobiliário. Ambos os processos se encontram na base do aumento da dívida e do crescimento do sistema bancário não regulado, que desde de 2008 até hoje, passou a representar um terço do total das instituições bancárias. Mas o ascenso desenfreado do mercado de bolsas desencadeou um panorama contraditório para a administração de Xi Jingping. As tensões que estavam acumulando-se na economia conduziram o governo a tentar frear o endividamento das empresas e intervir para limitar a influência dos bancos. O resultado, no entanto, foi catastrófico, com o conhecido choque das bolsas que levou o governo a reverter sua ação inicial, retomando as medidas de intervenção estatal a fim de sustentar os preços das ações. Além de que ainda não está claro em que grau a ação governamental poderá frear essa guinada, o acontecimento põem manifestas uma série de contrariedades.

Efeito amplificador

A ação do governo frente à queda da bolsa, mostrou questões estruturais que têm relação com as dificuldade da China para liberalizar sua moeda e seus “mercados de capitais”. Por um lado o país não pôde liberalizar completamente o Yuan nem os movimentos de seus mercados de capitais e bolsas, porque isso o colocaria vulnerável aos movimentos especulativos – e não especulativos – do capital estrangeiro, fazendo-o perder o controle de sua moeda. Por outro lado, se a China quer ter maior ingerência mundialmente, deve aceitar “as regras” do mercado de capitais. Com esta contradição jogam Estados Unidos e o FMI que a pressionam para que liberalize o Yuan, enquanto impedem a entrada da moeda na cesta de moedas que integram os Direitos Especiais de Saque.

Em conclusão, por de trás dos movimentos das bolsas, se escondem fundamentalmente questões complexas. Por um lado um crescimento do PIB moderadamente – ao menos por hora – inferior ao esperado, que expressa o resultado contraditório das intenções desenvolvidas até o presente pelo governo no caminho de modificar o status da economia chinesa. No contexto internacional, a “derrapada” bursátil amplificou um fator – em cena há um tempo – como a queda do preço do petróleo, do minério de ferro, do cobre, do alumínio e outras matérias primas cujas cotizações se encontram em baixa não só pelo menor crescimento chinês, senão também, e muito especialmente, pela revalorização do dólar e a ameaça norte-americana de elevar as taxas de juros. Por outra parte, os movimentos espasmódicos que o governo efetuou com a Bolsa deixam ver que depois do véu bursátil se oculta a questão da liberalização do Yuan e dos mercados de capitais, uma das maiores contradições e perigos que enfrentará o governo chinês no próximo período.




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