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DEBATE | O impeachment de Temer nos ajuda a derrotar os golpistas e a direita?

Leandro LanfrediRio de Janeiro | @leandrolanfrdi

domingo 27 de novembro de 2016 | Edição do dia

Muitos trabalhadores e jovens aplaudiram o comunicado de senadores do PT, e depois também dos deputados do PSOL, que ambos protocolariam pedidos de impeachment de Temer. Há claros indícios de crime de responsabilidade por parte de Temer que atuou para favorecer seu “amigo de longa data” Geddel Vieira.

O impeachment de Dilma mostrou que a “oposição ao PT”, na ausência da classe trabalhadora como sujeito independente, foi canalizada pela direita mais reacionária que aplicou o golpe institucional, fortalecida pela corrupção e os ajustes dos próprios governos petistas. Hoje, a raiva que compartilhamos de livrar-se do presidente golpista e aplicador de importantes ataques a nossos direitos, da aposentadoria, à garantia de saúde e educação, aos direitos trabalhistas pode ser canalizada a recompor o regime político em crise, fortalecendo ainda mais o judiciário e a direita.

Por isso, consideramos progressista o sentimento de muitos trabalhadores que consideram esse governo ilegítimo, entendendo o governo como produto de um sujo jogo político de golpe institucional. Mas partindo disso, precisamos entender que o problema de Temer não é apenas um crime de responsabilidade (entre diversos vínculos com a podre corrupção brasileira) e por isso não achamos que a solução está em um julgamento do governo por esse parlamento atual, ou seja, um novo impeachment – pois isso só fortaleceria novos setores da direita e os juízes privilegiados que, em cargos vitalícios, hoje atuam como verdadeiros “coronéis da política”. Precisamos ligar a queda desse governo com uma resposta mais de fundo, que questione o conjunto desse regime, seus mecanismos, seus esquemas de privilégios e corrupção.

Por isso debatemos nessa nota como o impeachment de Temer não pode ser nossa bandeira. Devemos, sim, lutar contra o conjunto da direita, dos golpistas e desse regime podre de corrupção e ataques aos trabalhadores através de impor uma nova Constituinte Livre e Soberana. Esse é a única posição de independência de classe dos trabalhadores, e a maneira para, ao lutar contra a direita nefasta, não trabalhar para a recomposição do PT, que abriu o caminho a ela.

Setores da direita disputam um espaço para emplacar uma política ajustadora, com a legitimidade da Lava Jato, no caso de uma eventual saída de Temer. A Folha e o próprio Globo aumentaram o tom crítico em relação ao atraso de Temer na aplicação dos ajustes. O PT, por sua parte, que não resistiu ao golpe e nos estados (como MG) e municípios onde governa implementa os mesmos ajustes neoliberais, vai buscar recompor-se para 2018.

Por isso, separar um inimigo (Temer) de outros (direita, FIESP, etc), e dos métodos de como o derrotaríamos, leva a um desvio de um potencial movimento para erguer uma nova saída ajustadora, desgastar a direita esperando o longo desfecho em 2018 enquanto vamos sofrendo ajustes. Só lembrar de que tirar um inimigo com as mãos de outros não leva necessariamente a fortalecer nossas posições. Tirando Collor pelas mãos do congresso, e com o apoio da Globo e boa parte da elite não tivemos um fortalecimento dos trabalhadores. Pelo contrário, o que se viu na sequência foi uma grande coalizão neoliberal.

O que está em jogo é como os trabalhadores se aproveitam da crise entre os de cima para erguer sua posição, com seus métodos de luta e programa, para dar fim aos ajustes e abrir questionamentos ao capitalismo.

Derrotando Temer, derrotamos os golpistas e a direita?

Quem dera o problema para os trabalhadores fosse tão simples. Que não existisse a Rede Globo questionando na TV e em matérias de seus editores se Temer já não teria legitimidade para seguir aplicando os ajustes? Vejamos o exemplo do Rio. A mesma Globo não está favorável a “punir” o PMDB carioca? E o que ela quer? Dornelles, do PP de Maluf, Espiridião Amin, partido herdeiro da Arena da ditadura para ele conduzir os profundos ataques que querem que o povo carioca sofra.

E o judiciário, com Sérgio Moro, Dallagnol, que passam a reforma trabalhista e da previdência no Supremo Tribunal, poupando Temer do desgaste, e enriquecendo com a indústria milionária de delações premiadas enquanto fortalecem o autoritarismo contra os trabalhadores não poderiam também embarcar nessa empreitada?

Ainda não há sinais claros de que a elite adotaria um “desembarque” do governo Temer como fez do governo Dilma (apesar do claro aumento na tonalidade crítica à Temer por parte da Folha, do Globo e da Veja). Mas se assim desejar, não faria isso justamente através de um impeachment e novas eleições, as mesmas bandeiras esgrimidas pelo PT, e agora também pelo PSOL?
Ou seja, pela falta de uma política independente poderíamos estar juntos à Globo. Nada de progressista pode vir por aí.

Quem faria o impeachment? Esse congresso de corruptos e reacionários?

O impeachment, tal como vimos no caso de Dilma, ocorreria mediante aceitação (improvável) da peça denunciando Temer por parte do também golpista Rodrigo Maia do DEM. Sem isso ele nem começa. Depois se formaria a comissão para emitir um parecer, toda guerra jurídica que vimos até novamente a Câmara votar e depois o Senado.

Esse processo significaria que aquele mesmo reacionário congresso, aquele mesmo que votou em nome de Deus, suas famílias, propriedade e até em nome de Ustra decidiria os rumos do país.

Por lei, se o impeachment transcorresse em tempo recorde e terminasse até 31 de dezembro teríamos novas eleições. Ou, se caso terminasse a partir de 1º de janeiro esse mesmo congresso reacionário elegeria o novo presidente da República. Isso mesmo, essa casa de muitos Cunhas, Bolsonaros e Renans, elegeria entre eles quem presidiria o país. Mesma coisa ocorreria com a cassação pelo TSE da chapa Dilma-Temer a partir de 2017.

...Mas poderíamos modificar a lei e ter novas eleições

Novas eleições relâmpago, presididas por Gilmar Mendes no TSE, sem tempo de debate, com a esquerda sendo censurada brutalmente como foi nas eleições municipais e com todas as regalias a políticos milionários, só poderia resultar em novos ajustadores, “gestores” à la Doria, ou até mesmo reacionários como Bolsonaro eleitos. É o que apostam, com a influência da eleição do xenófobo e racista Trump nos EUA. Não podemos separar a demanda política de se livrar de Temer dos métodos de como fazer isso e das demandas defensivas que temos como a luta contra a retirada de direitos, contra as demissões que as patronais estão fazendo sem parar. Essas lutas tem como inimigo não somente a Temer, mas os empresários e os projetos no congresso e principalmente o STF, que tem implementado ataques a nossos direitos, como o corte de ponto de grevistas, a reforma trabalhista e a extinção do direito a “desaposentação”.

Teríamos novas eleições sem a esquerda estar garantida nos debates televisivos, sem liberdade para que trabalhadores pudessem formar novos partidos se desejarem. Ou seja, com as antidemocráticas regras do jogo atuais (que estão piorando com a reforma política de Aécio) só podem favorecer os milionários e seus empresários.

Este é o programa da reacionária Lava Jato. Sérgio Moro e o judiciário também estão preocupados com o atraso nos ataques aos trabalhadores. A Lava Jato, embora incida sobre um setor da casta política corrupta, não quer acabar com a corrupção. Busca simplesmente “limpar” e re-legitimar o regime político corrupto para que este implemente com mais velocidade ajustes mais duros que Temer – apesar das tentativas – não consegue por sua debilidade. Trata-se de substituir um regime corrupto encabeçado pelo PT por um regime corrupto liderado pela direita.
Mas há quem pense, como alguns grupos argumentavam antes do impeachment de Dilma que deveríamos ter novas eleições para todos cargos, e até mesmo com novas regras. Mas se fossemos conseguir ter um movimento que emparedasse o STF e o Congresso para ter novas regras eleitorais porque frearíamos aí?

Porque então não questionar todos os entulhos da ditadura que temos na Constituição atual (que está sendo modificada com todas as contrarreformas golpistas)? Por que não questionar a criminosa dívida que suga quase 50% do orçamento federal? Por que não reverter as privatizações dos tucanos e do PT e não colocar todos serviços e empresas públicas longe dos usos de corruptos, longe da rapina dos imperialismos, ou seja estatizadas e administradas pelos trabalhadores?

Por que não questionar os privilégios dos políticos, dos juízes, fazendo todos serem eleitos e revogáveis, recebendo o mesmo salário de um trabalhador? Por que não impor que todos crimes sejam julgados por júri popular para garantir o confisco dos bens nos casos de corrupção, fim da impunidade dos assassinatos policias? Por que em suma não lutar por uma nova Constituinte, Livre e Soberana, e no marco desses questionamentos contribuir para que os trabalhadores vejam como não há como garantir nossas reivindicações nos marcos do capitalismo, como é necessário lutar por um governo operário de ruptura com o capitalismo e o imperialismo?

O impeachment é para o PT uma manobra para se preparar para 2018

Uma parte da resposta dessas perguntas é porque a força política mais influente, ainda hoje, em setores da juventude e dos trabalhadores pela via da CUT, da UNE, da CTB, o PT não quer nenhuma ruptura com esse regime político. Não quis sequer combater o golpe. Como disse Lula naquele momento se tratava de fazer um grande movimento, mas “não incendiar o país”. O PT defende o impeachment e supostamente novas eleições mas está somente se preparando para 2018. Quer desgastar Temer, a direita e oferecer-se como articulador de uma “resistência” que vá de setores “éticos” dos empresários (e agora podem surgir novamente) a latifundiária anti-golpe Kátia Abreu, passando pelo agressivo cacique regional e ex-tucano Ciro Gomes, até os movimentos sociais.

Enquanto isso, a Lava Jato vai seguindo seu arbítrio e até mesmo ajudando os EUA a lucrarem em cima da Petrobrás. Enquanto isso os empresários vão demitindo, enquanto isso os ataques vão seguindo via STF, via Congresso...e é essa a “resistência que precisamos”?

Erguer um programa independente dos empresários, contra a direita e que não repita a conciliação do PT com a direita e os empresários

Podemos lutar contra Temer e toda a direita e os golpistas, mas com um programa independente do que um setor da elite começa desenhar que seria tirar Temer para colocar no lugar algum ajustador com mais legitimidade. Não será das mãos desse Congresso que conquistaremos algo de progressista para nós. Mas contra ele. Por isso o único programa independente do que o judiciário e parte da elite pode querer é lutar por um Nova Assembleia Constituinte Livre e Soberana.

Junto a esse programa e importante tirar lições de como o PT abriu caminho à direita para erguer um programa e uma força política que seja socialista e revolucionária, que tire lições das derrotas do PT para erguer um partido revolucionário dos trabalhadores. Trata-se de uma exigência da crise nacional. Que tire lições de como a estratégia de conciliação de classes, ou seja que empresários e trabalhadores devem ganhar juntos (o que nunca ocorre, e na crise só eles ganham, por exemplo com o aumento de milionários no país enquanto o desemprego bate recorde), de conciliação com a direita, dos ataques que começaram a implementar, de assimilar os métodos corruptos de governo de qualquer partido capitalista, e por não resistir ao golpe que chegamos onde chegamos. Tirar essas lições é chave para erguer não repetirmos erros de confiar que junto dos banqueiros, da FIESP avançaríamos.

O novo capítulo da crise política nacional oferece novos desafios e oportunidades. Essas oportunidades serão aproveitadas por uma nova direita que surge, pela reconstrução da estratégia do PT ou por uma nova estratégia, socialista e revolucionária?




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