×

BERGOGLIO EM CUBA E NOS EUA | O discurso ’social’ de Francisco a serviço dos poderosos

sexta-feira 2 de outubro de 2015 | 00:00

A viagem papal por Cuba e EUA mostrou mais transcendência internacional do que a esperada originalmente. À visita aos dois países que viveram sob tensão durante décadas, somou-se a repercussão dos seus discursos com um importante conteúdo social e político. O que representam estes discursos e gestos do Papa?

A turnê papal incluiu alguns encontros de relevância, como a entrevista com Fidel Castro, a visita ao presidente norte-americano Barack Obama, e os discursos no congresso dos EUA e na ONU. O tour, que segundo o porta-voz papal era a "mais larga e completa", serviu para consolidar a influência do Vaticano na "abertura" cubana e recompor a imagem e a influência da Igreja Católica na principal potência mundial.

Colocando o Vaticano como um ator na política mundial

Bergoglio voltou a mostrar, em sua turnê, que pretende colocar a Igreja Católica como um ator político. Seus gestos para a comunidade de imigrantes no Estados Unidos, onde 60% dos que conseguiram cidadania e 83% entre os 11 milhões de imigrantes sem documentos afirmam ser cristãos, mostra o interesse em ganhar influencia em um setor que ganhou importância política e social nos últimos anos.

Em Cuba, seus discursos e a visita a Fidel Castro, apresentada por um setor dos meios de comunicação próximo a burocracia castrista como um reconhecimento para o histórico líder cubano, foi um gesto que explicitou a busca do Papa por posicionar a igreja católica como o principal ator político da ilha, por fora do Partido Comunista, ao mesmo tempo que apoiar o processo geral de restauração empreendido pela burocracia governante.

Francisco aproveitou a visita a ilha para pronunciar-se sobre a negociação entre as FARC e o governo colombiano, aonde chamou a evitar-se "outro fracasso"naquilo que denominou como o "caminho da paz e reconciliação" na Colômbia. Fez isso alguns dias antes do acordo alcançado pelo governo colombiano e os representantes das FARC.

No congresso estadunidense e na ONU, Bergolglio mostrou um apoio explícito a agenda política do governo dos Estados Unidos. O papa apoiou a reforma nas leis de imigração impulsionada pelo presidente estadunidense e qualificou como promissora a iniciativa de Obama para reduzir a poluição. Também fez alusão ao "degelo" com Cuba pouco depois de ter afiançado sua aliança com a burocracia castrista.

Tomando alguns dos temas mais relevantes da agenda internacional, a aparição de Bergoglio na ONU é parte de sua busca para consolidar o papel relevante na política internacional que o Vaticano ganhou nos últimos tempos, muitas vezes acompanhando a política estadunidense.

Um discurso progressista para resgatar a autoridade da igreja.

Os discursos do Papa chamando a dar soluções a problemas urgentes de caráter social aparecem como algo inédito para o Vaticano, que vinha perdendo legitimidade desde que foram descobertos os casos de abusos de menores e de corrupção. Suas palavras despertaram simpatia em amplos setores, em especial entre os trabalhadores e o povo pobre, adotando demandas postergadas e muito sentidas. Não faltou quem chegasse a destacar que os discursos papais defendiam as demandas dos "pobres" no "coração do império", ou que o apoio do papa ao pedido do governo cubano contra o embargo era uma forma de defesa das conquistas sociais da ilha.

Porém, seu diálogo e o apoio explícito a administração Obama expressa uma forte legitimação do atual governo imperialista. Em Cuba, Bergoglio colocou a igreja a serviço das elites governantes que avançam em um processo de reforma que exigirá ataques maiores a propriedade estatal, o emprego, os sistemas de educação e saúde, e as condições de vida da população, em função da abertura ao "mercado".

Não é casual que Bergoglio tenha preferido destacar o cunho social nos seus gestos e discursos. Ainda que não tenha deixado passar oportunidades para confirmar que a doutrina da igreja católica não mudou no que diz respeito a homossexualidade, as pessoas trans, o matrimonio entre pessoas do mesmo século e a condenação ao aborto. Por outro lado, é notório o intento do vaticano para ocultar a participação do atual Papa na ditadura militar argentina. Como denunciou Estela de la Cuadra, parente de desaparecidos, no La Izquierda Diario: "O papel de Bergolglio foi proteger os executores da ditadura"

Desde seu famoso "façam bagunça" no Brasil, passando pelo tour na América Latina, Bergoglio vem buscando que a igreja cumpra um papel político ativo. A política dos chamados governos progressistas latino-americanos durante a última década, como agentes de "desvio", contenção e institucionalização de mobilizações e rebeliões populares, foram úteis para a tarefa política de Bergoglio frente a crise da igreja e sua busca em recuperar a autoridade da mesma. Bergoglio utiliza sus turnê pelos EUA e Cuba (e em boa medida desde o começo de seu papado) um discurso progressista sob princípios conservadores. Em termos eclesiásticos: Heterodoxo no pastoral e conservador nos fundamentos.

Estrategicamente seus anúncios e gestos tem um objetivo: recompor a autoridade da instituição (golpeada pela corrupção e os abusos) em um cenário de crise social e econômica e aparecer como uma mediação útil ante os questionamentos aos políticos das classes dominantes, assinalados como uma casta que governa para os poderosos.

Tradução: Pedro Rebucci de Melo




Comentários

Deixar Comentário


Destacados del día

Últimas noticias