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HISTÓRIA DO PARAGUAI | O Supremo Doutor Francia

Acertos, limites e contradições do presidente paraguaio que expropriou todos os latifundiários e a Igreja antes da Guerra da Tríplice Aliança.

quinta-feira 15 de setembro de 2016 | Edição do dia

José Gaspar Rodríguez de Francia governou a nação paraguaia de 1814 até 1840, período no qual os paraguaios se tornaram independentes da coroa espanhola através de uma revolução em maio de 1811. Em 3 de outubro de 1814 realizou-se, como proposta do Doutor Francia, o terceiro congresso paraguaio composto por mil representantes camponeses. O próprio Francia presidiu as sessões.

Unificou-se o poder executivo e Francia recebeu o título e caráter excepcional de ditador supremo da República do Paraguai por quatro anos, após os quais deveria se realizar outro congresso nacional e decidir sobre o sistema de governo o país adotaria. Desta forma Francia foi escolhido como presidente do Paraguai.

O absolutismo de Francia, dentro das perspectivas de seu tempo, não foi exatamente reacionário. Ele é, em certo sentido, um positivista que se liga com Rousseau e Voltaire, dentro de sua concepção pessoal, naturalmente menos universal que seus mestres europeus.

É a partir do governo de Francia que o Paraguai se converte no único país latino a deixar de ter clero e classe econômica influente, passando a sofrer uma profunda reforma. Para poder levar adiante suas medidas econômicas e políticas no país, Francia se apoiou nos camponeses, pequenos industriais e comerciantes, trabalhadores e artesãos, para esmagar a oligarquia dos grandes proprietários, funcionários de alto escalão e traficantes ricos.

O Supremo, como chamavam Francia, foi implacável na perseguição de seus inimigos, exerceu uma ditadura rigorosa. Os espanhóis e espanholistas, herdeiros dos privilégios da Coroa, foram perseguidos até o extermínio. Como essa classe privilegiada tinha ramificações por toda a Bacia do Rio da Prata, a fama de Francia foi terrível e se espalhou amplamente: foi visto como um bárbaro assassino, contrário a toda norma de civilização.

Os paraguaios, acostumados em sua maioria ao rigor dos jesuítas, abominavam os luxos e excessos que os espanhóis e espanholistas ostentavam, principalmente em Assunção. O Supremo terminou com esse reinado de pompa em um país pobre, viveu sem excessos, foi reservado e simples, desta forma ganhou a confiança popular. A remanescente elite econômica de Assunção, quando pôde – através de carta a seus iguais da Prata, principalmente de Buenos Aires – queixou-se de que Francia recebia em sua casa, com braços abertos, qualquer homem do povo, mas se negava a um simples gesto aos ricos.

Francia demonstrou que não existe independência política sem independência econômica. Suprimiu as ordens religiosas e transformou seus conventos em quarteis. Já em julho de 1815 – quatro anos depois de tomar o poder – fez a Igreja Católica presente no Paraguai romper com Roma: a Igreja no Paraguai agora é nacional. Em 20 de setembro de 1824 confiscou todos os bens da Igreja e transferiu ao Estado, proibiu terminantemente a construção de novos templos, decretou a liberdade de crença no país e extinguiu para sempre os tribunais da Inquisição.

O Paraguai é um país localizado no meio do continente sul-americano e não possui saída própria para o mar. Para exportar sua produção – o tabaco principalmente. Pensado nisso, o governo realizou um acordo com Buenos Aires que após o ocorrido não cumpriu, foi ainda mais além, proibiu a circulação de qualquer embarcação paraguaia dentro de seus limites territoriais e marítimos. O Paraguai foi isolado.

Entre 1815 e 1817 continuaram as pressões das províncias ao norte de Buenos Aires. Francia entrou em contato direto com a Inglaterra, buscando nela apoio para conseguir a exportação dos produtos paraguaios. Buscava uma aliança com os imperialistas britânicos junto ao representante inglês em Buenos Aires, Woodbine Parish.

Isolado o país, Francia precisa criar uma nova estrutura econômica. Decidiu multar imensuravelmente os espanhóis e os espanholistas e em 1823 promoveu a primeira grande reforma agrária da América do Sul. Além disso, nacionalizou o banco, fazendo assim com que todo o dinheiro que entrava ou saía do país passasse pelo Estado, e não contraiu dívida externa.

Francia não pôde ver a necessidade de formar uma classe dirigente com independência de classe que pudesse contagiar seus povos irmãos na luta pela liberdade anti-imperialista. Contraditoriamente, tentou fazer um acordo com os ingleses, quem tempos depois sustentariam contra o Paraguai uma das guerras mais sangrentas da América Latina: A Guerra da Tríplice Aliança.

Fonte: Genocidio Americano de Julio José Chiavenato




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