Um estudante de 11 anos da cidade de Campinas (SP) sofreu retaliações depois que propôs no grupo de whatsapp da escola um trabalho sobre o mês do orgulho LGBT. Em resposta a ele, pais de outros estudantes disseram que a mensagem era "absurda" e a direção da escola pediu para que ele apagasse a mensagem. Um caso lamentável que mostra uma tentativa de calar o debate LGBT nas escolas. Vejam abaixo declaração da professora Flávia Telles, militante do grupo Nossa Classe Educação.
segunda-feira 14 de junho de 2021 | Edição do dia
Foto: Marcos Alves / Agência O Globo
"É lamentável que frente a uma proposta tão importante de levar o debate da questão LGBT nas escolas, um estudante de 11 anos seja retaliado dessa forma pelos pais e pela gestão da E.E. Aníbal de Freitas, em Campinas. Esse mês de junho é o mês do orgulho LGBT porque estamos há 52 anos da revolta de Stonewall, quando LGBTs, nos EUA, se organizaram para enfrentar a repressão policial e toda opressão e discriminação sexual que sofriam. Fazendo ecoar um grito contra a lgbtfobia em todo o mundo.
A importância desse debate se reafirma ainda mais em nossa cidade, uma cidade reconhecida por sua Câmara de Vereadores conservadora e reacionária, que em 2015 foi responsável pela tentativa de impor que se cale os debates de gênero e sexualidade nas escolas com a Emenda da Opressão, e foram os que repudiaram a presença de questões de Simone de Beauvoir no ENEM.
Campinas tem na sua história casos escandalosos em relação a lgbtfobia, como o assassinato do jovem LGBT Spencer Netto e da travesti Bruna em 2017. Além disso foi na nossa cidade que Quelly, uma travesti, foi assassinada e teve seu coração arrancado com um caco de vidro enquanto seu assassino ria e dizia estar salvando a sua alma. Mas também é aqui que o movimento LGBT, negro e de mulheres se organiza e protagoniza marchas e paradas importantes. Como a parada LGBT de 2016, que após ser brutalmente reprimida pela polícia teve como resposta as LGBTs ocupando o centro da cidade novamente – Parada LGBT 16.1 – para dizer “basta de violência policial e pela livre expressão da nossa sexualidade”. Além da marcha contra a "cura gay".
No Brasil da extrema direita de Bolsonaro que odeia e ridiculariza as LGBTs, onde
segundo a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), a expectativa de vida de uma pessoa trans no Brasil é de 35 anos, que só no ano passado houve um aumento de 41% dos assassinatos de pessoas trans, e que os ataques e reformas de Bolsonaro e dos golpistas aprofunda ainda mais a precarização da vida, é ainda mais importante que a escola debata temas como esses.
A escola deve ser um espaço de debates e reflexões sobre os diferentes temas que cercam a nossa sociedade e a vida da comunidade escolar, um lugar onde o pensamento seja livre. Hoje estamos diante de um retorno inseguro das aulas, de uma nova BNCC e se avança a reforma do ensino médio pelas mãos de Doria em SP para aligeirar e precarizar a formação dos nossos estudantes, e nós professores não podemos aceitar nenhum desses ataques, além disso Doria foi responsável por recolher materiais didáticos das escolas sob alegação de que reforçavam a “ideologia de gênero”. Todas essas medidas querem impor uma educação mais precarizada e onde esses debates fiquem longe do ambiente escolar.
Se eu pudesse dizer algo a esse estudante de 11 anos, diria que ele não está sozinho, que existem muitos professores, pais e estudantes que também defendem esses debates nas escolas e que lutamos por uma educação que debata e combata toda forma de opressão, que combata a censura de debates, e para que negros, mulheres e LGBTs possam ser verdadeiramente livres. Estamos com você!"