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GRÉCIA | Na iminência do default, Eurogrupo sobre a Grécia conclui sem acordo

A reunião desta quinta-feira entre a Grécia e os comissários da Troika (CE, FMI e BCE) terminou sem acordos sobre a dívida e ameaça a Grécia com o bloqueio do financiamento emergencial. A urgência do encontro estava no prazo limite de 30 de junho para que o governo de Alexis Tsipras pague 1,6 bilhão de euros ao FMI, para o qual depende dos 7,2 bilhões previstos no acordo de “resgate” da Troika.

André Barbieri São Paulo | @AcierAndy

sexta-feira 19 de junho de 2015 | 00:01

(Charge: Ingram Pinn)

As “instituições” europeias, entretanto, condicionam a entrega deste montante a duas reformas principais que constituem “linhas vermelhas” segundo as promessas eleitorais do Syriza: a reforma das aposentadorias (com corte nas pensões) e a reforma trabalhista que equilibre os salários “de acordo com a produtividade e a competitividade europeia” (desde janeiro, os salários decaíram 16% na Grécia).

A Troika ofereceu “metas fiscais mais relaxadas” e querem uma subida de impostos (IVA) e uma reforma das aposentadorias. Ainda que aceite a ideia do aumento do IVA, o governo grego se nega a cortar as pensões. O Eurogrupo marcou uma reunião de emergência da cúpula do euro para a segunda-feira.

O Ministro de Relações Exteriores do Syriza, Euclides Tsakalotos, anunciou esta semana que a Grécia havia esgotado o dinheiro de suas arcas, e que não seria capaz de pagar esta nova parcela da dívida ao FMI. Os bancos gregos perderam 25% dos depósitos desde dezembro, e os gregos retiraram 3 bilhões de euros dos bancos somente esta semana.

Na quarta-feira, uma manifestação convocada por deputados da “ala esquerda” do Syriza, assim como deputados afins a Tsipras, através redes sociais sob o título “Tomemos o acordo em nossas mãos – Abaixo a Austeridade”, reuniu cerca de 7000 pessoas na praça Syntagma, sede do Parlamento grego.

“Estamos aqui para protestar contra a União Européia e o FMI e para apoiar o governo que se esforça em salvar os gregos, mas também pedimos ao governo que cumpra suas promessas eleitorais e desobedeça as ordens dos credores,” afirmava um jovem economista do movimento “Não pagamos”.

Este receio se baseia principalmente no caráter catastrófico que teria uma reforma das aposentadorias. Enquanto a taxa de desemprego na zona do euro se manteve entre 10% e 12%, na Grécia chega a 26% (mais da metade dos jovens não possuem emprego). 36% das famílias gregas têm pelo 1 desempregado, o que faz com que um grande número de pessoas dependam das pensões dos avós para sobreviver.

Ou seja, o desemprego na Grécia faz com que para 52% das famílias gregas a principal fonte de renda seja uma pensão de aposentadoria. Ao contrário do que diz a Troika – para justificar o corte nas pensões que exige – metade dos pensionistas gregos recebe menos de 665 euros por mês (as pensões sofreram cortes em 2011, de 15% nas mais baixas, e de 44% nas pensões de mais de 1000 euros).

Embora a Grécia exija um acordo sem corte das pensões, a proposta de reestruturação da dívida e maiores margens fiscais está vinculado a este ataque, às vésperas de um pagamento ao FMI para o qual a Grécia não tem dinheiro.

Os “4 jogos do Syriza”

Gideon Rachman, colunista do Financial Times, especulou sobre os “4 jogos que os gregos estão jogando” como perspectiva nas negociações.

O primeiro seria que o governo de Tsipras estaria blefando e aposte em que, devido os enormes riscos financeiros e altos custos políticos, a UE não toleraria a ruptura de seu mais importante projeto – a moeda única – e cederia a último momento. De fato, setores do mainstream político, como a presidente do FED norteamericano Janet Yellen, preveem que uma eventual saída da Grécia do euro desencadearia um efeito contágio para economias mais vulneráveis, como Portugal e Chipre e a presença de um “Estado falido” em plena Europa ocidental.

O segundo jogo seria que o “erro de cálculo” do blefe só estaria sendo percebido agora, em vista do fracasso na estratégia de separar as opiniões dos países da Europa sobre a dívida e convencer alguns governos a apoiar sua demanda de “negociação realista”. Os mais duros chefes do imperialismo, como Angela Merkel e Wolfgang Schäuble da Alemanha, e Christine Lagarde do FMI, persistem em argumentar que o futuro da Europa sem a Grécia “está no horizonte”.

O terceiro jogo consiste em manter o equilíbrio de poder interno conquistado pelo Syriza nas eleições. Cruzar as “linhas vermelhas” (para além de todas as concessões que o governo grego fez aos credores, como a privatização do porto do Pireu), poderia causar “a ruptura da ala esquerda e o fim da carreira de Tsipras”.

O último jogo consistiria na opinião de setores da ala esquerda que realmente desejam a saída da Grécia da zona do euro fruto do fracasso das negociações. A chamada “Plataforma de Esquerda” coloca de fato a alternativa do romper com o euro no marco de um programa de “recuperação da economia nacional”, usando o exemplo da Argentina em 2001. Este “soberanismo de esquerda” defendido pelo Ministro de Energia Panayiotis Lafazanis se reduziria a voltar ao dracma nos marcos de um estado capitalista na União Europeia, o que significaria uma desvalorização brutal dos salários e do nível de vida da população.

A conclusão francamente imperialista de Rachman não representa nenhuma saída para o povo grego. Mas se algo marcou os primeiros seis meses de governo do Syriza foi a ausência da mobilização social de setores de massas em meio às tentativas de Tsipras de negociar melhores termos para o pagamento da dívida. A estratégia reformista de Tsipras foi sempre de conseguir um acordo benéfico para os “sócios europeus” e os gregos. Tinha um traço em comum com os desejos da Alemanha: as negociações teriam de se dar num marco de “paz social”.

Isso fortaleceu as aspirações imperialistas de retirar mais direitos e atacar os trabalhadores gregos. De janeiro até aqui, o governo do Syriza foi abandonando os principais pontos do seu programa eleitoral, como o aumento do salário mínimo, a recuperação das pensões aos aposentados e o freio às privatizações. O pagamento de mais de mais de 7,5 bilhões de euros às instituições financeiras desde a chegada de Tsipras ao governo colocou a Grécia à beira do colapso.

A esquerda do Syriza não passa das declarações críticas no Comitê Central, e nos fatos segue sustentando a política de compromissos do governo reformista de Tsipras, sem propor-se como alternativa independente que rompa a “paz social” e se apoie na luta das ruas contra a austeridade. A retórica “de esquerda” esconde um ministerialismo (vários ministros numa atuação parlamentar cuja tarefa seria “empurrar Tsipras” desde dentro de um governo de conciliação de classes) que implica negar-se a desenvolver a luta de classes e a organização independente dos trabalhadores.

Pagar a dívida é condenar o povo grego à miséria por gerações

Esta quinta-feira, Tsipras se reuniu com Vladmir Putin em São Petersburgo, a fim de tentar atrair capitais russos para o país e mostrar o problema geopolítico que seria para a Alemanha ter uma Grécia aliada à Rússia no meio da Europa (em meio à crise ucraniana que enfrenta o governo russo aos governos europeus). Isto mostra como o desenvolvimento da crise grega une a economia e a política.

Entretanto, para um país que perdeu 27% do PIB desde 2010, cujo investimento na economia caiu em um terço, o reacionário governo de Moscou, que passa por problemas econômicos graves pela queda do petróleo, não pode ser nenhuma saída.

A única saída progressista frente às chantagens da Troika é romper todos os acordos e compromissos com o FMI e o BCE, declarar o não pagamento da dívida e avançar em medidas anticapitalistas como a nacionalização dos bancos e a expropriação dos monopólios gregos (que lucram com a dívida nacional) sob controle dos trabalhadores, para atender às necessidades mais urgentes da população trabalhadora.

Uma ruptura desse tipo, apoiada na mobilização social do povo trabalhador da Grécia, ganharia a simpatia não só de amplos setores cansados de sofrer os ajustes dentro da Grécia, mas em todos os países da Europa. Isso poderia avançar o questionamento das próprias bases da União Europeia imperialista e apontar a saída dos Estados Unidos Socialistas da Europa que realmente integre fraternalmente os povos e acabe com a xenofobia, racismo e islamofobia reinantes no continente.




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