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MILITARIZAÇÃO DA POLÍTICA | Muito além do vice de Bolsonaro, a crescente intervenção dos generais na política

Neste domingo foram anunciadas as vice-candidaturas de diversos candidatos. Dentre eles, o de Jair Bolsonaro, candidato pelo PSL. Após flertar com fantoches da política, como Janaína Pascoal e o príncipe, por “aproximações sucessivas”, Bolsonaro chegou a um acordo com o general do Exército Hamilton Mourão, presidente de um importante agente do golpe de 64, o Clube Militar.

Ítalo GimenesMestre em Ciências Sociais e militante da Faísca na UFRN

segunda-feira 6 de agosto de 2018 | Edição do dia

Os adoradores do torturador e assassino coronel Brilhante Ustra chegaram a uma parceria na corrida presidencial, que indica um novo avanço qualitativo na politização da a ala mais golpista das Forças Armadas, que no último ano deu diversas mostras nesse sentido.

Mourão, o autor da ideia de “aproximações sucessivas com a intervenção militar” foi defendido pelo Comandante das Forças Armadas, General Villas Boas. Mas a intervenção dos militares vai muito além do vice de Bolsonaro e é uma mostra do nível de decadência a que chegou o regime político brasileiro, em especial após o golpe, que vem permitindo cada vez mais que certos poderes “sem voto” intervenham na política.

Os militares tem ao menos 115 candidatos esse ano. Vários deles das mais altas patentes, três estrelas, como o vice de Bolsonaro e o assessor do mesmo (o general Augusto Heleno). No Ceará, o PSDB coloca outro 3 estrelas para candidato a governador e no Distrito Federal outro general golpista (este de 1 estrela) concorre a governador, vários outros concorrem como deputados em todo país.

Esse é um dos aspectos de “aproximação sucessiva” dos militares, querem montar uma bancada, ministérios, ganhe quem ganhar. E como parte deste salto de intervir na política, o atual comandante das Forças Armadas (também 3 estrelas), Villas Boas, forçou todos candidatos a se sentarem com ele para lhe pedir a benção como candidatos. Trata-se de uma crescente intervenção na política destes poderes sem voto. O que não é possível de entender sem, por um lado considerar toda a impunidade que gozaram desde o fim da ditadura, e também do papel de outro poder sem voto, o judiciário.

Toga e farda em meio a um regime político que se deteriora pouco a pouco

O Judiciário, através da Lava-Jato e juízes privilegiados, eleitos por ninguém, avalizaram o golpe de 2016 e foram a gentes diretos na condenação e prisão arbitrária de Lula, para que hoje escolhessem a dedo o candidato favorito do imperialismo, que aprofunde ajustes e privatizações do governo Temer, imponha um regime ainda mais duro de ataques a classe trabalhadora do que o PT fazia (e dava mostras de que era capaz e faria se fosse necessário).

Editorial: A Lava Jato veio para escolher a dedo o Presidente da República

Essa deterioração significou uma violação dos direitos democráticos já bastante limitados do regime democrático burguês fundado no pacto com os militares, com o imperialismo e toda oligarquia em 88. O sufrágio universal, o direito ao voto evidentemente limitado no capitalismo, foi surrupiado ou degradado por esses agentes do golpismo, o que deu espaço para poderes ainda mais autoritários rugirem de dentro de suas casernas, inclusive chantageando o STF a negar o HC a Lula, com o comandante Villas Boas sugerindo “intervenção” caso o judiciário “falhasse”.

Mas foi o general Mourão o membro das Forças Armadas a se posicionar sobre os rumos da política em tom mais abertamente golpista, membro do Clube Militar, uma organização de generais que cumpriu um papel importante no golpe militar de 64 e no regime ditatorial. Em setembro de 2017, o racista, anti-indígena, sob aplausos de companheiros maçons, analisa que “estamos numa situação de aproximações sucessivas”, até chegar o momento em que “ou as instituições solucionam o problema político por ações do Judiciário retirando da vida pública os elementos envolvidos em ilícitos”, ou então “teremos que impor uma solução”.

Como bem “esclareceu” Villas Boas, nessa ocasião fala de “aproximações sucessivas” referindo-se às a “possibilidade de saídas bruscas” com respaldo do alto escalão caso o Judiciário e essas próximas eleições não fossem capazes de reestabilizar o regime. A única retaliação ao general então na ativa por uma declaração claramente golpista foi uma transferência do comando Militar do Sul para a Secretaria de Economia e Finanças do Exército em Brasília, onde pode seguir com suas declarações e outras movimentações políticas, tais como ser vice na chapa de Bolsonaro e estreitar suas relações com o regime.

Antes de ter definido esse acordo, deu curso para pelo menos 115 militares que decidiram se candidatar nessas eleições e brigar influência direta da caserna nas decisões legislativas do país. Esse é o cenário que a crescente interferência das forças repressivas na política coloca para essas eleições.

Essa maior politização e dos militares acompanha os episódios de acirramento das frações do Judiciário, em um primeiro momento apoiando a ala mais “mãos-limpas” no auge da Lava-Jato. Depois pressionaram sucessivamente a que as diversas instâncias do judiciário decidissem por violar o direito da população votar em que quer, condenando Lula, e depois o prendessem sob chantagens golpistas de Villas Boas. Após ter dado a sua “última cartada” nessa prisão, cuja arbitrariedade ficou explícita para boa parte da população que confiava na justiça e no seu suposto “combate a corrupção”, o que abriu novas rusgas na instituição, em especial durante a Copa, com manobras de Fachin, Moraes, para impedir que a condenação de Lula fosse revista.

Nesse cenário de Congresso Nacional reacionário, corrupto e anti-operário; um presidente com impopularidade histórica graças a um programa de amargos ajustes contra os trabalhadores e a população pobre; Judiciário claramente satisfeito no seu “combate a corrupção” após impedir que o candidato com maior popularidade nas pesquisas participe dessas eleições; temos um aprofundamento do fenômeno que Gramsci descreveu com o termo de “crise orgânica”.

Há uma crise de hegemonia do Estado burguês com suas instituições, velhas figuras políticas e partidos. Sobra nesse “deus que nos acuda” certo prestígio ou menor desgaste das forças militares, que Bolsonaro se apropria para atingir maiores camadas desesperançosas da população com seu discurso “radical” de direita, agora em aliança direta com um general influente. Entretanto, ao ser um general tão ou mais golpista e reacionário que Bolsonaro é difícil ver como essa escolha de vice lhe ajude a ampliar seu eleitorado, mas meramente a fortalecer o que ele já tem.

Os militares, esta eleição e além dela

Mas como afirmamos, a influência dos generais na política vai muito além de Mourão. Os generais conseguiram mais e mais poder desde Dilma aos vários ministérios com Temer, poder arbitrário na intervenção federal, e agora com dois generais quatro estrelas trabalhando com Bolsonaro (Augusto Heleno e Mourão). Exigirão do vencedor que mantenha ou avance em seu papel na política. É de se esperar que para tentar retirar votos de Bolsonaro, Alckmin também escale generais ou lhes faça acenos.

Essa maior influência política é também o que pressiona a que Alckmin faça aproximações com o programa reacionário de Bolsonaro, que dá declarações como a que extinguirá o Ministério do Trabalho para atacar ainda mais os direitos trabalhistas. Ou que irá armar os latifundiários, aliado com a ruralista Ana Amélia.

VEJA: Alckmin = Bolsonaro? Veja as aproximações do tucano ao defensor da ditadura

Mas o próprio papel dos militares na política e a popularidade de Bolsonaro são inexplicáveis sem ver como o PT e a burocracia sindical abriram caminho ao golpe, e foram permitindo cada movimento do mesmo, como greves gerais foram traídas e como atuam para pressionar as forças políticas a lhes permitir manter algum lugar num regime político já degradado pelo golpe.

Demonstrações do caráter fraudulento que terão as próximas eleições, que só servirá para eleger um candidato que lave a cara do golpe. Qualquer candidato eleito terá que levar adiante um programa de ataques mais duros a classe trabalhadora, como a Reforma da Previdência, novos cortes com saúde e educação, privatizações, uma agenda tão impopular quanto o seu principal porta-voz, Alckmin, mas que terá quase metade do tempo de televisão para defender após ser agraciado pela ingerência da Lava-Jato e o aval do mercado e todo “direitão” conhecido como “centrão”. Para fazer frente ao golpismo e sua continuidade será preciso superar o PT pela esquerda, para poder mover as forças da classe trabalhadora, paralisadas por burocracias sindicais que aceitam o golpe e suas medidas e buscam acomodar seus candidatos e recursos financeiros para os sindicatos enquanto paulatinamente o regime vai degradando-se mais e mais.




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