×

BOLSODORIA | Mortes acobertadas e apoio à MP da Morte de Bolsonaro: porque Doria não é uma alternativa para os trabalhadores

Buscando todos os meios de se distanciar de Bolsonaro e seu negacionismo, o governador de SP João Doria sempre se pronuncia tentando se mostrar como o gestor mais humano, mais preocupado com a saúde da população e mais empenhado em dar uma saída para a atual crise, que tem seu epicentro brasileiro no estado de São Paulo. Mas o empresário-governador não pode ser considerado uma alternativa coerente enquanto centenas de pessoas estão morrendo com sintomas de covid-19 sem nem ao menos serem testadas.

sexta-feira 3 de abril de 2020 | Edição do dia

Os cada vez mais intensos panelaços contra o Bolsonaro mostram como sua linha negacionista não tem caído bem na população, inclusive entre seus eleitores, dentre os quais muitos já declaram abertamente estarem arrependidos do seu voto. Enquanto isso, diversos governadores vem aparecendo como os “sensatos”, mostrando-se como os coerentes diante da guerra declarada contra o coronavírus, como se fosse muito difícil parecer minimamente coerente diante das posições bolsonaristas.

No meio deles, o governador de São Paulo João Doria vem se destacando, aparecendo como aquele que está trabalhando para dar uma saída para a crise sanitária, e inclusive sendo visto como alternativa política viável em um futuro próximo. Mas se olharmos as ações do governo Doria mais de perto, fica nítido o quanto o conhecido político empresário não faz nada realmente significativo nessa guerra e suas ações são completamente insuficientes. A realidade é que Doria está escondendo que as pessoas estão adoecendo, sofrendo e morrendo de covid-19 sem nem ao menos terem o direito ao reconhecimento do próprio diagnóstico, e suas famílias carregam além da dor da perda, a incerteza da própria vida e saúde. Isso é o que acontece se não há testes massivos para a população.

A começar pelo início da crise. O coordenador do Centro de Contingência do Coronavírus do governo do estado de São Paulo, David Uip, já disse publicamente que eles estão monitorando a doença desde o primeiro caso ainda na China, e sua projeção mundial vem sendo levada em consideração. Ou seja, tiveram quatro meses para se preparar para a chegada da epidemia, para providenciar tudo que fosse necessário para ser atravessado pela crise com o mínimo de danos possível: adiantado a produção de testes e de equipamentos de saúde, como os respiradores, equipado os hospitais, disponibilizado mais leitos, contratado trabalhadores da saúde etc. Nada disso foi feito previamente. Como ver alternativa em um governador que, sabendo do que estava por vir, nada fez para evitar que a crise chegasse tão avassaladora e impactasse tanto as vidas de toda população?

Ainda segundo David Uip, o governo estadual está trabalhando com projeções de contágio que variam entre 1% e 20% da população paulista, ou seja, entre 460 mil e 9 milhões de pessoas podem ser infectadas. Mas não existem testes suficientes para fazer esse levantamento e uma consequente quarentena, isolando apenas os testados positivamente, além do grupo de risco. A realidade da testagem da população é que, até o meio dessa semana, haviam 16 mil testes parados, sem serem analisados, além de mais de 200 mortes acobertadas, de pessoas que perderam a vida antes de terem a dignidade de conhecer a causa de sua morte. Isso porque a própria Secretaria da Saúde orientou a subnotificação, dizendo que as unidades de saúde deveriam registrar apenas os casos graves. Isso é muito grave, e o Doria se pinta de bom moço mas esconde da população a realidade que ela terá que enfrentar.

Na última quinta, 2, o governo estadual anunciou que está negociando a compra de 1,3 milhão de testes da Coreia do Sul, mas eles devem chegar somente dia 15 de abril. Mas quase duas semanas, em um momento no qual a cada semana se passam meses, é muito tempo. Nas últimas duas semanas o Brasil passou de algumas dezenas de casos para milhares, as mortes surgiram e agora aparecem as centenas. Diz-se que o pico da doença deve se dar entre abril e maio. E ainda levará mais duas semanas para que chegue em São Paulo uma quantidade de testes que será suficiente somente para um sétimo dos possíveis infectados. Na capital paulista, a previsão é que o SUS se esgote nas próximas duas semanas, ou seja, quando os testes chegarem, os hospitais públicos já estarão todos lotados, inclusive os dois hospitais de campanha que devem abrir na próxima quinta, 9. Mas sobre isso, nem Doria nem o prefeito de São Paulo, Bruno Covas, dizem uma única palavra no sentido de estatizar a rede privada, por exemplo, para garantir leitos públicos para toda a população.

A importação desses testes é parte de uma série de ações que vão começar a ser implementadas a partir da Plataforma de Laboratórios de diagnóstico do coronavírus, criada pelo governo, que funcionará sob a coordenação do diretor do Instituto Butantan, Dimas Tadeu Covas. Essa Plataforma pretende, em síntese, agilizar os testes e resultados de exames, avaliar os procedimentos e coordenar as pesquisas que estão acontecendo nas universidades, e avalia que conseguirá analisar 10 mil exames por dia. O governador João Doria faz sua demagogia com essa ação, mas a realidade é que nesse momento, as pessoas já estão morrendo e essa articulação entre os laboratórios e as universidades, se tivesse começado há um mês, quando já se sabia como seria a curva de contágio, poderia evitar ou ao menos diminuir essa situação. Além disso, mesmo a projeção da possibilidade de realização de 10 mil testes diários é ainda insuficiente, considerando que nesse ritmo, levariam meses para se testar todos os possíveis infectados do estado, quiçá anos se considerarmos a projeção máxima de contágio, segundo David Uip.

O coordenador Tadeu Covas fala em “mutirão” para diagnosticar as amostras, mas em momento algum fala em contratação de profissionais e estudantes da área da saúde para fazer isso acontecer. Fala em aumento da jornada de trabalho, ou seja, toda a atividade dos laboratórios que estarão totalmente voltados para superar essa crise será feita com base na superexploração dos trabalhadores e pesquisadores dos laboratórios. Para garantir uma testagem mais ampla, ainda que insuficiente, é fundamental começar contratando todos os trabalhadores da área da saúde que estiverem desempregados, e todos os estudantes que já são capacitados para atuar tanto nos laboratórios como nos postos e hospitais. É preciso garantir que o trabalho daqueles que estão hoje na linha de frente dessa guerra não seja superexplorado, inclusive levando essas pessoas a adoecerem. Um mutirão real, garantindo testes massivos, com toda a força trabalhadora que já existe na sociedade, isso sim agilizaria as ações para sairmos mais rapidamente dessa crise, organizando uma quarentena racional baseada em dados reais e científicos. Mas o governador João Doria não está preocupado com os trabalhadores, e nem mesmo faz questão de esconder isso: ele elogiou rápida e publicamente a MP da Morte de Bolsonaro, que autoriza corte de salários e de jornadas, lembrando à todos que, em seu coração de empresário, nunca deixou de ser um Bolsodoria.

Ainda dentro das “novidades” anunciadas nessa quinta, agora foi a vez do prefeito Bruno Covas ser um bom pupilo e seguir os passos do Doria, garantindo que vai distribuir um vale alimentação para 273 mil alunos da rede municipal de ensino, que estão sem merenda devido à suspensão das aulas. Isso corresponde a menos de 30% dos alunos da rede municipal, que receberão valores irrisórios para se alimentar - R$55 para alunos do ensino fundamental, R$63 para os do ensino infantil e R$101 para os alunos das creches municipais -, em um momento onde uma alimentação saudável é uma das medidas fundamentais para se proteger do coronavírus. Doria já havia anunciado seu programa Merenda em Casa, onde pretende garantir um vale de R$55 reais por mês para cerca de 700 mil estudantes da rede estadual. Ou seja, menos de 2 reais por dia para menos de 20% dos alunos se alimentarem, e Doria ainda disse que daria para uma cesta básica. O governador anda muito desatualizado sobre seu estado, já que segundo o DIEESE, uma cesta básica em São Paulo está em torno de R$500.

Com relação aos trabalhadores informais, Doria os ignora. Apenas ampliou a linha de crédito para microempreendedores e o prazo de pagamento. Ou seja, permitiu o direito ao endividamento, mas nenhuma garantia de que não irá sucumbir diante da crise. Isso não basta. Devemos exigir que eles garantam a imediata gratuidade de luz, água, recarga de telefones, gás, aluguel, além de um salário de R$2000 para todos que ficarem sem renda, que é um valor próximo à média salarial brasileira, ainda que seja metade do que o DIEESE defende como mínimo para uma família viver.

Por fim, João Doria e os governadores do sul e sudeste também pediram ao governo federal nessa quinta, que suspendesse a dívida dos estados com a União, deixando bem claro que não é um perdão, mas apenas uma suspensão. Ou seja, os interesses desses governadores é de seguir garantindo que a dívida pública seja paga, que os bancos sigam lucrando, querem apenas uma trégua. Como é apontado por Daphnae Helena nesse artigo, “As escolhas políticas e econômicas em prol do pagamento da dívida pública, custam hoje, literalmente, a vida das pessoas.”, e por isso que não basta paralisar o pagamento: o colapso do sistema de saúde só mostra uma situação que não voltará à normalidade após a crise, esse sistema necessita de urgente investimento para que situações calamitosas como as que estamos prestes a assistir não se repitam no futuro.

João Doria não pode ser considerado uma alternativa sensata e coerente diante da crise: seu desprezo pela classe trabalhadora está matando a juventude de fome, está deixando a população morrer sem testes, com Doria encomendando covas massivas ao invés de testes massivos. Nem mesmo há uma ação para garantir condições sanitárias básicas nas favelas de São Paulo, não há sequer água chegando para população poder lavar as mãos e seguir as orientações de higiene pessoal. Não tem como confiar em quem, um mês atrás, estava batendo em professor, jogando bomba, bala de borracha e gás em quem estava lutando contra a reforma da previdência estadual, tudo para garantir em SP o que Bolsonaro garantiu pelo governo federal. Aliados, juntos contra a classe trabalhadora, essa é a realidade de João Doria.

Nenhuma confiança nos governadores, nem no Congresso, nem nos golpistas, nem em nenhum daqueles que sempre trabalharam para garantir os lucros dos empresários e jogar as contas da crise das costas dos trabalhadores e da juventude. Agora, diante dos escandalosos pronunciamentos do Bolsonaro, Doria e os governadores querem se sair como os que estão fazendo de tudo para dar uma saída da crise, mas como mostramos, é tudo insuficiente. Uma saída real e efetiva para essa crise passa por se enfrentar com todos esses setores e batalhar por um gabinete de emergência composto por trabalhadores da saúde, especialistas sanitários, sindicatos e demais organizações operárias e populares para dar conta das respostas emergenciais à crise atual. É das mãos dos trabalhadores que virão às respostas efetivas, com essa classe tomando para si o controle de toda a produção e do combate à crise. Como apontado aquiEsse gabinete de emergência teria como uma das suas tarefas centrais a convocação e organização de uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana, que concentre todos os poderes legislativos, executivos e judiciário, onde pudessem ser debatidos democraticamente toda a reconfiguração do país para responder não apenas à questão imediata de garantir empregos e vidas, mas todas as questões estruturais que condenam a imensa maioria a levar uma vida de miséria desde sempre. Na luta por este programa, defendemos o desenvolvimento dos mais amplos organismos de auto-organização, que são a única garantia de uma saída democrática para essa crise, e ao mesmo tempo a base para que possamos avançar para um governo operário de ruptura com o capitalismo.”

Saiba mais: A saída é a unidade da classe trabalhadora que, como mostrou a pandemia, é quem move o mundo




Comentários

Deixar Comentário


Destacados del día

Últimas noticias