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IMPEACHMENT NA IMPRENSA MUNDIAL | Imprensa mundial: sedento por ataques, o imperialismo teme explosão da luta de classes

Com o triunfo do golpe institucional na Câmara e sendo improvável que o governo Dilma reverta a situação no Senado e no STF, a imprensa internacional busca posicionar-se no novo tabuleiro político brasileiro, que em algumas semanas provavelmente terá um governo Temer. Dos riscos, a luta de classes figura com destaque na preocupação imperialista.

André Barbieri São Paulo | @AcierAndy

quarta-feira 20 de abril de 2016 | Edição do dia

Os jornais internacionais receberam com frieza as notícias sobre o golpe institucional aplicado na Câmara neste domingo, como expressamos no Esquerda Diário aquie aqui. Conduzido por parlamentares “mais sujos que os julgados”, comprovadamente condenados em esquemas de corrupção e exibindo um espetáculo de obscurantismo, estupidez e reacionarismo que assombrou mesmo a imprensa habituada a nutrir uma opinião pública de direita, o impeachment traz um cenário de imprevisibilidade que preenche de incertezas os interesses dos grandes monopólios em investir no país, principalmente no que concerne a luta de classes.

Daí a cautela em tratar do tema, e a abundância de críticas inclusive em jornais das grandes finanças. Entretanto, com os acontecimentos rumando à conclusão do golpe institucional, os periódicos mundiais tratam de fazer política lançando hipóteses estratégicas ao provável novo governo. Seria Temer capaz de cumprir as funções aos quais está chamado? Como trataria as convulsões sociais mais que previsíveis na aplicação de ataques mais duros que os já implementados pelo PT, tendo o estigma do golpe estampado na testa?

Em particular, os jornais das finanças imperialistas se prontificaram a aceitar as “belezas de um governo economicamente ortodoxo”, mas especulam sobre as possibilidades de um incremento da luta de classes no Brasil. A Bloomberg diz que apesar de se tratar “de um momento de catarse positiva para o Brasil”, haverá “convulsão social e a crise perdurará por muito tempo”. Paul Rathbone, colunista do Financial Times, põe as mangas de fora e aconselha “como consertar um sistema quebrado no Brasil pós-Rousseff” sabendo que “problemas sociais virão a um governo sem mandato popular”.

Temer tem o desafio de corrigir o navio do Estado brasileiro – pelo menos por enquanto. Como pode fazê-lo? O plano de Temer está contido na chamada ‘Ponte para o Futuro’. Publicado no ano passado, o documento pede uma economia mais aberta [ao capital financeiro], mais privatização, a flexibilização das leis trabalhistas e o fim da indexação da aposentadoria com a inflação. Isso é música aos ouvidos dos investidores. Para convencer totalmente os mercados, entretanto, Temer precisará apontar chefes de peso para as finanças e para o Banco Central. Para contrapor os argumentos de que o impeachment é um golpe mal disfarçado, terá de designar um peso pesado na Justiça [...] Será capaz de fazer mesmo a metade disso? Sua chance será breve e não tem mandato popular para executar um programa abrangente de reformas econômicas”.

De acordo, Temer procura atender aos interesses ajustadores do capital financeiro com “figuras destacadas”: convidou Ilan Goldfajn, (ex-diretor do BC e atualmente economista-chefe do Itaú), e Amaury Bier (ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda governo FHC) para o Banco Central, e Murilo Portugal (presidente da federação dos bancos, a Febraban) para o Ministério da Fazenda.

O The Economist, mais cauteloso, alerta para as dificuldades de se governar sem mandato popular que autorize reformas profundas na economia. Os eufemismos para não mencionar o papel da classe trabalhadora em dificultar a aplicação de ajustes mais duros só deixam em evidência os temores das finanças, e sintomático deste sentimento de incerteza que preenche as páginas internacionais jornal britânico, que advertiu que “o discurso de um governo de unidade nacional parece cada vez mais à tentativa de um conjunto de trapaceiros tentando substituir outro. [...] Rousseff parece a caminho de deixar o cargo. Tragicamente para o Brasil, está longe de ser claro o que seguirá a ela”. Assim como a CNN e o ElPaís, fez uma lista das “motivações” dos deputados na votação de domingo, unindo ao ridículo a dúvida de “como gente assim pode aplicar um programa de reformas”.

Em uma linha mais questionadora seguem jornais como o The New York Times, ainda que já se posicionando estrategicamente de acordo com o rumo dos acontecimentos que deixam Temer próximo à cadeira presidencial. Com o editorial “O impeachment de Dilma não é um golpe, mas um disfarce”, enumerou a listagem dos argumentos patéticos que adornavam o discursos que fugiam à acusação de crime de responsabilidade, para concluir que “os políticos corruptos brasileiros respiram aliviados”. Assim como o Financial Times e a revista Fortune– que adverte que o “impeachment pode significar maior corrupção ao Brasil” – está preocupado com o possível fim da Operação Lava Jato num governo Temer, já que o impeachment “providencia a distração conveniente para que escapem das investigações”. “O impeachment tirou o foco dos problemas legais de Cunha. Muitos membros do Congresso que votaram o impeachment no domingo esperam gozar da mesma sorte”.

Lembra que Temer está envolvido em esquemas de corrupção de compra de etanol; que o próximo na linha sucessória, Eduardo Cunha, é acusado de receber 40 milhões de reais nos esquemas da Petrobrás, e que Renan Calheiros também está sob investigação. Tudo isto compõe um quadro de “pista íngreme” para os ajustes. “O PMDB goza de escasso apoio popular [...] Qualquer tentativa de cortar gastos sociais e diminuir as infladas pensões incitará feroz resistência por parte dos movimentos sindicais e ativistas de esquerda”.

O The Guardian e o ElPaís seguem os mais céticos. Segundo o ElPaís, o Brasil “entra num período de transição às cegas, em um limbo político às vésperas dos Jogos Olímpicos do Rio”. “A aprovação da abertura de processo de impeachment da presidenta Dilma Rousseff por uma esmagadora maioria da Câmara dos Deputados abre uma etapa no Brasil marcada pela incerteza”. Segue afirmando que o impeachment “não resolve nenhuma das incógnitas que se observam sobre o futuro do gigante sul-americano”.

Dois fatos são inquestionáveis: em primeiro lugar, até agora, a única não acusada de enriquecimento pessoal foi a própria presidenta. Segundo, o impeachment se baseia em um tecnicismo fiscal: a prática ilegal de recorrer a empréstimos de bancos públicos para equilibrar o orçamento.”

Já o Guardian intitulou seu editorial “O impeachment de Dilma é uma tragédia e um escândalo”, argumentando que a única figura da alta política não implicada no escândalo da Petrobrás é Dilma – ao contrário dos impulsionadores do impeachment e a vasta maioria dos 150 deputados implicados em crimes votou pelo sim – e que a base jurídica para o impeachment é frágil, sendo que irresponsabilidade administrativa é uma leve contravenção cometida por todos os governos. “Uma oposição desacreditada substituirá um PT sem crédito. É difícil imaginar um horizonte mais obscuro para o Brasil”.

O fator imponderável da luta de classes para o imperialismo

Com distintos matizes, a imprensa imperialista converge em duas preocupações centrais: a necessidade de que se continue a Lava Jato e os métodos de Sérgio Moro – métodos que garantem a “estabilidade democrática” nas favelas do país, que sustentam um sistema jurídico e carcerário onde 40% dos presos (em sua maioria. negros e pobres) estão atrás das grades sem qualquer condenação – na quebra e violação dos direitos democráticos mais elementares, mesmo excetuados seus “excessos” para preservar o Judiciário como poder moderador; e a luta de classes.

O imperialismo e as altas finanças, sedentos por ataques e pela entrega dos recursos nacionais ao capital estrangeiro numa velocidade e intensidade maiores do que o PT já vinha fazendo, entendem que medidas impopulares não se farão sem forte resistência de massas. A burguesia está sem forças morais para disciplinar a luta de classes. O panorama estratégico para o qual se preparam no Brasil é que será difícil estabilizar a luta de classes com um PT enfraquecido e um bonapartismo débil de direita que não tem legitimidade nas urnas. É disso que tratam quando advertem sobre “convulsões sociais”, “feroz resistência dos movimentos sindicais”, e outros termos mais elegantes para esconder o ator social chave: a classe trabalhadora, junto à juventude.

Sem força moral para atacar, o novo governo tampouco a terá para reprimir. Avizinha-se uma nova onda de greves como a que varreu o país no “maio operário” de 2014, inspirado pelas recentes jornadas de Junho de 2013?

Por quanto tempo mais a esquerda como PSTU e PSOL ficarão sem se autocriticar por estarem nutrindo ilusões na Lava Jato e seus métodos de perseguição e repressão? Esse fortalecimento do Judiciário joga um papel chave na estratégia da burguesia internacional em estabilizar a luta de classes no Brasil pós golpe institucional. Quanto maior for a legitimidade desses métodos da Lava Jato, mais os sindicatos e a esquerda estarão vulneráveis às arbitrariedades do Estado burguês e da direita reacionária do Congresso.

É precisar repudiar fortemente o golpe institucional, com o qual o imperialismo começa a se acomodar, e colocar de pé um plano de resistência na luta de classes contra os ataques do PT e da direita, começando por cercar de solidariedade a luta do Rio de Janeiro.




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