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Ilustração: O processo revolucionário que culmina no golpe de 64 e as bases para a construção de um partido revolucionário no Brasil

Noah Brandsch

Ilustração: O processo revolucionário que culmina no golpe de 64 e as bases para a construção de um partido revolucionário no Brasil

Noah Brandsch

Desenho feito como capa das Teses Fundacionais “O processo revolucionário que culmina no golpe de 64 e as bases para a construção de um partido revolucionário no Brasil” da seção brasileira da Fração Trotskista - Quarta Internacional, o MRT.

As teses podem ser lidas completas aqui!

No desenho está representada a agitação das massas que ocorreu no país a partir da década de 50, e que se intensificaram a partir da abertura de um processo revolucionário em 1961, deixando o Brasil de ponta cabeça, mas que, infelizmente, tinha uma direção traidora e conciliadora.

No Brasil, de ponta cabeça e com diversos incêndios, estão, no topo, ou seja no Sul e Sudeste, uma massa de trabalhadores e fábricas, representando as milhares de greves e manifestações que ocorreram no período parando o país. Olhando para o desenho, no lado esquerdo do Sul/Sudeste brasileiro, está uma manifestação dos trabalhadores com uma faixa escrita “o povo quer reformas ou fará a revolução”, que foi utilizada em um comício organizado por Jango para um evento de memória ao suicídio de Vargas, no Rio de Janeiro. Abaixo, está escrito CGT, Comando Geral de Trabalhadores, expressão da organização dos trabalhadores, que Jango, apesar de ter controle da direção desse comando através do PCB (que canalizava qualquer manifestação ou greve para um apoio à burguesia “nacionalista”), fazia de tudo para enfraquecê-lo. No Sul também se nota uma arma de calibre .38, aquela que Brizola, segundo suas próprias palavras, poderia ter entregue aos trabalhadores, armando-os e fazendo milícias operárias para barrar o golpe, mas que obviamente não o fez.

Subindo o território brasileiro, na região de Goiás, está a República Autônoma de Tromba - Formoso, onde camponeses expropriaram latifúndios e criaram uma República auto reivindicada como socialista em um território de 10 mil km². Acima, está José Porfírio de Souza, um dos líderes da revolta.

Indo para a esquerda, no Nordeste, se vê camponeses, representando as revoltas que explodiam no país, como a de Dona Noca, as 218 Ligas Camponesas com mais de meio milhão de filiados, as guerrilhas e a ULTAB (União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil), o terror das oligarquias latifundiárias e também da reacionária burguesia paulista, que esperneou quando o governo de Pernambuco foi obrigado, sob pressão dos camponeses, a desapropriar o Engenho da Galiléia, mesmo que essa medida fosse feita para conter a revolta e “perder os anéis em vez dos dedos”. As revoltas traziam uma enorme convulsão ao país e poderiam se ligar com o operariado, se não fosse pela direção desses processos que os canalizava para a sustentação do bonapartismo sui generis da burguesia trabalhista; o stalinismo do Partidão não procurava ligar organicamente camponeses e operários para formar milícias armadas a fim de barrar o golpe que estava cada vez mais evidente, e levantava uma reforma agrária tímida, feita através do Estado e com indenização para os fazendeiros, e além de ser direção da maioria das Ligas e da ULTAB, que eram expressão da auto organização camponesa, o PCB procurava criar sindicatos rurais institucionalizados e atrelados ao Estado, como na criação do CONTAG em 1963.

Sobre isso: Sobre a questão agrária e as Ligas Camponesas

No canto inferior esquerdo do desenho, perto dos camponeses, estão os operários rurais dos canaviais, que em novembro de 1963 protagonizaram em Pernambuco a maior greve rural da história até então, com mais de 200 mil operários. No Norte do país também estão representadas as lutas indígenas, que a mais de 500 anos nunca deixaram de lutar, e que com o golpe de 64 foram brutalmente assassinados e reprimidos. Do lado direito, acima de onde seria o Acre, estão trabalhadores dos seringais, que também protagonizavam lutas contra a exploração e as dívidas impagáveis.

Na parte superior esquerda, subindo a partir do Nordeste, se pode ver os marinheiros da bacia do Guanabara que sacudiram as bases do Exército. Além de várias revoltas que já vinham ocorrendo, como a Revolta dos Sargentos de 1963, no dia 25 de março de 64, pouco antes do golpe no 1 de abril, os marinheiros, que recebiam um baixíssimo salário, mal podiam deixar o navio, não podiam votar ou ser votados, comiam separados por patentes e eram frequentemente castigados, começaram a se rebelar contra o oficialato e foram reprimidos, presos e assassinados. Nisso, os marinheiros ocuparam o Sindicato dos Metalúrgicos no litoral, com 4 mil homens exigindo a liberdade dos presos. Em cima, está representado também a AMFNB (Associação de Marinheiros e Fuzileiros Navais do Brasil, que continha elementos de auto organização, com delegados eleitos e revogáveis, e que era dirigida majoritariamente pelo PCB, novamente com a linha de usar o movimento para sustentar o governo Janguista), e o navio dos fuzileiros navais do choque, que foram enviados para reprimir, porém que viraram as armas e se somaram à luta dos marinheiros. Acima, está a memória de João Cândido e da Revolta da Chibata, que corria no sangue daqueles marinheiros, em sua maioria negros e nordestinos.

Ao lado dos marinheiros também está uma âncora cruzada com uma foice, simbolizando a união de marinheiros e camponeses, que organizavam treinamentos militares de auto defesa para as Ligas, que se confrontavam militarmente com jagunços dos fazendeiros.

A revolta dos marinheiros foi traída pela direção, que negociou a liberdade dos presos e a reivindicação dos marinheiros por um ministério no governo, e a mobilização foi dispersada dois dias depois. Não satisfeitos, no dia 30 e 31 os marinheiros tomaram quartéis, navios e canhões e estavam dispostos a prender o governador do RJ e articulador do golpe Carlos Lacerda, além de mandarem armas armas para os operários em luta através da CGT. Entretanto, a direção PCBista ordenou para que acatassem aos oficiais “nacionalistas” e aliados a Jango, que nada fizeram, além da CGT também não ter chegado. E o golpe foi dado no dia seguinte…

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Essa parte do desenho faz referência não só aos marinheiros, mas também à todas bases do Exército que estava disposta a se ligar aos operários e camponeses para resistir ao golpe, como os soldados e sargentos que marchavam em Brasília dispostos a guerrear e reivindicando, em suas próprias palavras, uma “República sem hierarquias”.

Todos esses elementos, na parte de cima, estão pressionando uma estrutura da parte inferior direita, a fim de esmagar o imperialismo ianque e a cúpula das forças armadas e da burguesia golpista. Essa estrutura é, justamente, o que barrou esse esmagamento e o triunfo da revolução brasileira, caso tivesse uma direção revolucionária e comunista. Jango e o PTB, representam a burguesia nacionalista, que estava interessada em desenvolver bases mais nacionais, com reformas de base e uma indústria menos atrelada ao imperialismo, Brizola era a versão radical dessa burguesia Varguista. Entretanto, elas se mostraram completamente incapazes de se confrontar com o imperialismo e de responder às demandas das massas, e para isso foi necessário desviar e conter qualquer luta trabalhadora que pudesse se desenvolver para uma independência do proletariado e uma ruptura com o capitalismo. Entretanto, para conseguir ter uma margem de negociação com o imperialismo, tal burguesia se apoiava sob o movimentos de massas, e foi o que Trotski caracterizou como bonapartismo sui generis. O PCB e Prestes, stalinistas, foram também peça fundamental para desviar todo o processo revolucionário, visto que eram direção hegemônica do proletariado, campesinato e das bases do Exército, e usaram esse prestígio para defender as instituições do Estado e o setor da burguesia nacionalista. Apoiaram com toda força Fevereiro, e deixaram Outubro passar, até chegar o Primeiro de Abril.

Sobre esse processo, recomendamos a aula 2 do Curso: A história do trotskismo no Brasil

Os balanços desse processo não foram tirados pela esquerda, que deixou outros momentos que poderiam se desenvolver para uma situação revolucionária passarem, como em 1968, em que a vanguarda estava na luta armada, e nos anos 78-80, onde se formava a burocracia sindical que posteriormente formaria o PT. Por isso, a compreensão desse processo é de suma importância para que toda a esquerda se aproprie, para que seja possível pensar os desafios de hoje.

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Noah Brandsch

Estudante | Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo
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