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OPINIÃO | Greve geral histórica, e agora que fazer? O Brasil em um “espelho grego”

Dia 28 foi um dia histórico e carregado de futuro. Poderemos derrotar um futuro sombrio sem direitos, sem aposentadoria? Ou a partir do 28 se abrirá um futuro que derrotemos os ataques, Temer e os empresários e daí teremos uma situação mais favorável aos trabalhadores e para uma resposta anticapitalista? Cada grevista olha para a jornada histórica de anteontem e se pergunta, o que resultou, como seguir? Como vencer?

Leandro LanfrediRio de Janeiro | @leandrolanfrdi

domingo 30 de abril de 2017 | Edição do dia

Para contribuir nessa reflexão apresentamos as ideias em 3 artigos conectados: um versando sobre o que analisam os principais analistas da grande mídia, outro sobre o que opinam as centrais sindicais sobre a greve geral e o que fazer, e este sobre a greve geral e a austeridade olhando o Brasil desde um “espelho grego, país que passou por 33 greves gerais em poucos anos, ergueu ao poder uma esquerda que se dizia radical, o Syriza e continuam todas as medidas de austeridade.

O Brasil é um país com pouca tradição de greves gerais, pode-se contar umas sete ou menos de dez em toda história, se aí incluirmos algumas greves locais nos anos 50 e 60. Gerações nunca tinham visto uma, este autor entre elas. A mais recente, a de 1996 foi possivelmente a menor e menos perceptível no rol que inclui 1917, 1983, 1986, 1989, 1996 e agora 2017. A ideia de parar tudo sempre parecia aos trabalhadores como um sonho distante. Não haveria disposição da classe trabalhadora acostumada a ver-se como categorias, ou meramente como indivíduos consumidores, não haveria união dos sindicatos, centrais. Eis que dia 28, sem a radicalização de outras greves gerais, como a de 1917 que durou 30 dias em São Paulo, o país parou. De Manaus a Recife a Porto Alegre, e até mesmo Brasília.

Vendo diante de seus próprios olhos a força da classe trabalhadora dezenas de milhares de trabalhadores se perguntam: mas e agora o que fazer? Como seguir para vencer?

A burguesia e seus analistas ainda analisam que é possível manter todos os ataques já implementados por Temer, pelo Congresso, pelo STF e por cada capitalista individualmente. Para salvar as reformas desse imenso desgaste alguns analistas mais sóbrios apontam a necessidade de Temer comprar mais deputados ou buscar comprar o apoio da Força Sindical em alguma negociação, a qual ela já se dispôs livremente a participar, como mostramos nesse artigo sobre a leitura das centrais sobre a greve geral e que propostas articulam . A CUT por sua vez parece limitar a perspectiva a pressionar os senadores para que estes nos salvem da barbárie da Câmara.

Seria essa pressão suficiente para barrar a reforma da previdência? Difícil afirmar. Mas seguramente está aquém de revogar a lei da terceirização irrestrita, revogar a PEC 55/241 e diversas outras medidas que cabem à lata de lixo da história.

Frente ao poderoso e novo fato da greve geral e da entrada em cena da classe trabalhadora pensar nossas medidas, nossos rumos, olhando outros países pode ser produtivo. A Grécia com suas 33 greves gerais em poucos anos oferece um rico ponto de reflexão. Com os limites de não ser conhecedor profundo da riqueza dos processos políticos e da luta de classes naquele país, oferecemos algumas ideias preliminares para pensar nosso país.

A Grécia arrasada por crise econômica desde que eclodiu a crise capitalista de 2008 amargava em 2015 uma queda de seu PIB em mais de 25%, o desemprego chegava a catastróficos 28%. Governo atrás de governo, primeiro com a social-democracia, o PASOK, depois com os conservadores da Nova Democracia alternavam-se em odiosos planos de austeridade ditados pela troika (Banco Central Europeu, FMI e Banco Mundial). Esses planos incluíam diminuição de salário de aposentados e pensionistas, demissões, privatizações, reforma da previdência, fim do seguro desemprego, entre outras medidas odiosas.

O país foi palco de 33 greves gerais. 33! Apesar dos limites colocados pelas direções sindicais a classe trabalhadora grega quis medir suas forças com a troika parando o país diversas vezes. Os limites eram muito grandes, a importante federação dirigida pelo KKE (PC Grego) atuava separadamente do restante dos sindicatos, impedindo o desenvolvimento da frente-única operária. Atuando conscientemente contra a mesma, boicotando paralisações unitárias, realizando as suas isoladamente, até mesmo em dias diferentes, entre outras medidas. As outras centrais, afins ao PASOK limitavam-se a algum gesto protocolar de reclamar do sectarismo do PC. A oposição parlamentar ao pacote, capitaneada pelo pequeno Syriza, “partido da esquerda radical”, sem peso orgânico no movimento operário não chamava a organizar essa frente única, mas apesar de tudo isso houve imensas lutas. Imensas lutas que não derrubaram as medidas de austeridade.

Como é possível 33 greves gerais não derrotarem os capitalistas?

Politicamente esse processo econômico e social se combinava a um terremoto, a social-democracia implodiu, um pequeno partido de esquerda, o Syriza foi catapultado ao poder com uma promessa de por fim à austeridade. Promoveu um plebiscito para que a população helena votasse se deveriam aceitar ou não um novo pacote extorsivo. Enfrentando-se com uma brutal pressão internacional o povo daquele país pronunciou-se contundentemente pelo não, 61% afirmaram isso nas urnas. Nas concentrações operárias, na juventude das grandes cidades o voto não foi quase unânime.

Uma poderosa força para derrotar a austeridade exigia batalhar por uma perspectiva anticapitalista. Porém o Syriza capitulou. Aceitou o pacote.

O ocorrido não foi uma falta de coragem de Tsipras, o líder daquele partido. Foi a prova de uma estratégia política a que chamamos de neoreformismo, uma estratégia de buscar alterar as condições econômicas e políticas para o proletariado dentro dos marcos do capitalismo e seus regimes políticos. E não a luta pela sua derrubada e constituição de um governo operário de ruptura com o capitalismo.

Faltou estratégia para vencer, faltou uma força revolucionária que organizasse esse descontentamento em ação revolucionária, começando pela batalha da frente única, passando pela auto-defesa dos operários e imigrantes frente a grupos fascistas como o Aurora Dourada e erguesse um programa revolucionário de saída à crise grega, uma perspectiva política que não poderia ser dada por Tsipras nem mesmo pela ala esquerda daquele partido.

Era necessário um programa que fugisse de um reformismo das instituições imperialistas da União Europeia, tal como defendido por Tsipras, e nem caísse no outro demônio: um nacionalismo de esquerda buscando favorecer setores da burguesia local. Essa proposta vendida como um “plano B” pela ala esquerda do Syriza e pelo KKE passava por repetir a desvalorização argentina de 2001 como se fosse uma resposta de esquerda.

Nesse beco sem saída estratégico a classe trabalhadora, a juventude, os setores populares lutaram como puderam, porém não venceram.

Um dos principais dirigentes e teóricos da ala esquerda do Syriza, Statis Kouvelakis traçou em 2015 a seguinte lição sobre a ascensão de seu antigo partido ao poder: “Os 32 dias de greves gerais, as centenas de milhares de pessoas tomando as ruas, não pararam uma só medida dos ‘memorandos’ de austeridade”. E logo em seguida agrega: “Um ponto de vista político era necessário, essa consciência foi o que preparou o terreno para o momento da iniciativa política. O Syriza capturou a imaginação da pessoas, proporcionando uma tradução política que faltava até o momento.”[ (https://www.youtube.com/watch?v=FV2jCTBjlpQ)

Para ele a ascensão do Syriza ao poder era expressão política da derrota na luta de classes.

A maioria da esquerda mundial apoiou o Syriza e sua ala esquerda, os mais eufóricos apoiadores aqui tendo sido Luciana Genro e sua corrente no PSOL, ali provou-se como sem uma estratégia revolucionária não se poderia obter pela manobra eleitoral um resultado que não fora batalhado em meio às 33 greves gerais.

Voltando ao Brasil

Nossa greve geral não foi produto da união das centrais. Foi produto do descontentamento operário que impôs essa ação as centrais. Estas por sua vez batalham para conter o potencial de ação da classe trabalhadora, através de adiar as lutas, como na trégua de 45 dias desse a paralisação nacional de 15 de março, limitando a ação dos trabalhadores para expressar todo o potencial da greve geral, chamando uma greve para ficar em casa e não para organizar desde as bases poderosos piquetes e atos que incendiassem setores onde não há tradição de organização sindical.

Agora essas mesmas centrais atuam para distender a raiva dos trabalhadores em uma espera de qual será a resposta de Temer e dos parlamentares. Não preparam um plano para derrubar Temer e revogar todas suas medidas. Um plano que passa pela preparação de uma greve geral até obter esses objetivos.

Passados dois dias da greve geral brasileira ainda não há um plano de como seguir a luta. Possivelmente a orientação da CUT, sabe-se lá se em comum acordo com a Força que está disposta a negociar com Temer, é de organizar atos de pressão (e não de “assalto”) em Brasília. E se toda a luta não der certo, todos ataques forem aprovados plena ou parcialmente há uma resposta política para a derrota na luta de classes: Lula 2018.

Lula, diferente de Tsipras, sequer se propõe discursivamente a acabar com austeridade, com as reformas de Temer, ele mesmo e Dilma tendo implementado parte dos ataques que a burguesia quer.

Para superar esse limite e abrir um novo horizonte que a greve geral do dia 28 coloca como potencial é preciso de um plano de ação para que triunfemos na luta de classes que passa pela exigência a essas centrais e aos sindicatos de organizar um encontro nacional de delegados para preparar uma greve geral até a derrubada de Temer e todos seus ataques. E associado a esse plano o desenvolvimento de uma força anticapitalista e revolucionária na classe trabalhadora, sem isso podemos dar contornos nacionais ao imenso potencial, imensa disposição de luta mas trágica experiência grega.


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#28A    Política



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