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EUROPA | França: Os trotskistas do Revolução Permanente na Marcha das Liberdades contra Macron e a extrema-direita

No último sábado, dezenas de milhares foram às ruas da França contra a crescente ideologia de extrema-direita, as políticas repressivas de Macron e o racismo do Estado francês. Uma data que marcou uma nova fase para os militantes do Révolution Permanente, expulsos do NPA por lutarem contra os acordos eleitorais à direita e por defenderem um partido revolucionário de trabalhadores.

quarta-feira 16 de junho de 2021 | Edição do dia

Como havíamos noticiado aqui no Esquerda Diário, a conjuntura francesa vem sendo marcada por uma ofensiva repressiva autoritária e pelo racismo islamofóbico tanto do macronismo quanto da extrema-direita de Le Pen. Diante disso, uma ampla gama de sindicatos, movimentos sociais e organizações políticas, do Novo Partido Anticapitalista (NPA) aos verdes (EELV), convocaram uma jornada de luta para o último sábado (12), batizada de Marcha das Liberdades.

As marchas reuniram milhares de pessoas, principalmente a juventude que foi às ruas há 7 meses atrás, nas grandes mobilizações contra a policialesca Lei de Segurança, entre novembro e dezembro de 2020. No total, os organizadores afirmam que 150.000 pessoas foram às ruas em 140 cidades diferentes. Em Paris, milhares marcharam junto aos blocos do Révolution Permanente e também da organização antifascista La Jeune Garde.

Essa foi a primeira atuação em que apareceram de maneira independente os companheiros que conformavam a corrente de oposição de esquerda do NPA, Corrente Comunista Revolucionária (CCR) (conhecida pelo nome de seu jornal Révolution Permanente), após serem sumariamente expulsos do partido por denunciarem sua deriva em acordos político com o reformismo e ameaçarem o controle da ex-maioria que arrasta o NPA na contramão de uma política de independência de classe.

Eles representavam cerca de um terço da militância do partido, incluindo boa parte da juventude e os principais dirigentes operários que foram porta-vozes das lutas emblemáticas do último período. Agora, buscam a construção de um novo partido revolucionário a partir da fusão do balanço crítico do trotskismo francês com a nova vanguarda operária do país.

A crise terminal do NPA e de mais um projeto de partido amplo “anticapitalista” deveria servir para abrir profundas discussões de estratégia na esquerda mundial - aqui no Brasil, principalmente no PSOL, que vem em um giro de adaptação ao PT e em uma crise interna de rupturas à direita. Isso porque a crise do NPA se assemelha muito à crise do PSOL que o reivindica: a crescente ausência de independência de classe e a subordinação à linha eleitoral do reformismo. Na França, porém, houve uma corrente dinâmica que esteve na linha de frente da luta de classes e lutando até o limite por uma estratégia revolucionária, e que agora entra em uma nova fase.

[Dossiê] A crise do NPA e o chamado à construção de um novo partido revolucionário na França

A contradição da esquerda institucional que anda de braços com a direita e a polícia

Com a aproximação das eleições presidenciais francesas, a principal questão política que pairou sobre o ato era que alternativa opor à ofensiva policialesca, racista e liberticida do governo e do regime. Seria possível lutar contra as ideias da extrema-direita ao lado dos que contribuem para essa ofensiva, atualmente encabeçada por Macron? Nesse sentido, após a participação deles em um comício chamado pelos sindicatos policiais em frente à assembleia nacional, e ao lado do partido da extrema-direita e do ministro mais racista de Macron, parecia uma contradição profunda a presença das figuras do Partido Socialista (PS), do Partido Comunista da França (PCF) e dos verdes (EELV), ou da própria seção policial da central sindical CGT.

Diante disso, vários manifestantes passaram a defender a necessidade de uma resposta à extrema-direita que critique abertamente os compromissos da esquerda institucional e se desenvolva com total independência das instituições reacionárias do regime, a começar pela polícia.

Anasse Kazib, ferroviário candidato à presidência e um dos militantes do Révolution Permanente que se manifestaram pela primeira vez de forma independente após a exclusão do NPA, definiu a situação como uma em onde “vemos parte da esquerda institucional surfando em ideias reacionárias, defendendo a repressão policial, a xenofobia…”. Ele se referia não só ao PS, cujo compromisso com o fortalecimento do arsenal repressivo e racista do Estado imperialista francês deixou de ser uma novidade faz tempo, mas também aos stalinistas do PCF, marcado pela recente xenofobia de seu candidato presidencial, Fabien Roussel.

A necessidade de uma luta intransigente e de baixo para cima contra a extrema-direita, o macronismo e o racismo estatal

Ao contrário dos compromissos da esquerda institucional francesa, o Révolution Permanente levanta que a luta contra as ideias de extrema direita é inseparável da luta contra o governo francês e todos os políticos que querem fazer acreditar que o problema dos explorados são os árabes, os negros, muçulmanos ou migrantes em fuga da miséria e das guerras provocadas pelo imperialismo e seus bilionários, os verdadeiros responsáveis pela crise. Como coloca Anasse, essa luta não pode ser travada numa perspectiva institucional e se condenar a legitimar instituições profundamente racistas como a polícia, e ao abandono sistemático das pautas operárias e da esquerda, uma vez no poder.

Se a estratégia predominante na França for uma potencial "união de esquerda" capaz de reinventar um governo reunindo o La France Insoumise (LFI), o Génération.s e setores do PCF e EELV, não é nas urnas que será possível enfrentar as ideias da extrema-direita. Em Toulouse, o companheiro Gaëtan Gracia, trabalhador da indústria aeronáutica e militante do Révolution Permanente , levantou a necessidade de construir uma correlação de forças dos trabalhadores: “não é nas urnas que vamos lutar contra as ameaças físicas da extrema-direita, é na rua e pela greve!“. Uma resposta ao dirigente do LFI, Jean-Luc Mélenchon, que disse que “os tapas vamos dar nas urnas“, pedindo bandeira branca logo depois de um militante de extrema-direita lhe atirar farinha no início de uma manifestação e no dia seguinte que um Youtuber reacionário chamou ao assassinato de “esquerdistas”.

Construir forças para enfrentar a extrema-direita exige romper com a lógica aritmética e institucional de buscar o “menor denominador comum” com uma série de partidos e políticas burguesas, enquanto se chama à manifestar sem nem nomear as leis reacionárias do governo (aprovadas inclusive com a ajuda do PS e PCF). Nesse sentido, a presença de cúmplices da ofensiva policial nos atos foi a contra-face da ausência das Comissões de Verdade e Justiça antirracistas e, de forma mais geral, dos jovens dos bairros populares e multiétnicos que se mobilizaram em peso em 2020, no calor do Black Lives Matter, com a chamada do Comitê Adama, mas também setores do movimento sindical organizado que, no entanto, ainda devem desempenhar um papel central na luta contra o governo, o racismo de Estado e a extrema-direita.

A luta contra a ofensiva racista e policialesca na França deve estar ligada àquela contra os capitalistas, que estão determinados a fazer com que os trabalhadores e as camadas populares paguem pela crise. Não será construído em torno de um projeto eleitoral, mas por meio da luta de classes, como Anasse destacou na Place de la République:

“O que assusta eles é quando todo mundo só fala em greve e emancipação. No terceiro ato dos coletes amarelos, havia um helicóptero instalado no Palácio do Eliseu pronto para partir. Esperamos que o retorno da luta de classes force Macron a entrar no helicóptero, que ele vá embora e que os trabalhadores possam tomar o poder para construir uma sociedade melhor!"

Nós do Movimento Revolucionário de Trabalhadores (MRT), que impulsionamos o Esquerda Diário no Brasil e compomos, junto com os camaradas do Révolution Permanente francês e de outros países, a Fração Trotskista - Quarta Internacional, consideramos que é fundamental aprofundar os debates na esquerda brasileira sobre essas questões estratégicas da luta de classes internacional e ao mesmo tempo dar uma batalha em comum para enfrentar todos os ataques do governo Bolsonaro e do regime do golpe, exigindo que as burocracias sindicais e estudantis construam as mobilizações do dia 19 de junho a partir da base e coloquem de pé uma paralisação nacional, coordenando também as lutas em já em curso, como escrevemos em nosso último editorial.




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