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TRIBUNA ABERTA | Flexibilização e extermínio são duas faces da mesma repressão

"À militarização do Estado se liga a militarização das fábricas e empresas, nas quais os trabalhadores são coagidos ao silêncio, sob pena de dispensa imediata (ocasionando um aumento do assédio moral e sexual e uma incidência cada vez maior de doenças ocupacionais)".

segunda-feira 30 de maio de 2016 | Edição do dia

Foto: Repressão na USP

A ruptura democrática aponta para uma escalada repressiva contra os trabalhadores, o que exige um debate não só a respeito da flexibilização dos direitos trabalhistas, que hoje é uma das prioridades do governo ilegítimo de Michel Temer, mas também a respeito da violência policial e da crescente militarização do Estado.

De fato, para garantir um ambiente de desestruturação dos direitos sociais, com ampliação irrestrita da terceirização, possibilidade de prevalência do negociado sobre o legislado, reforma da previdência e cortes em programas sociais, é necessário, por parte do Estado, uma estrutura militarizada que permita reprimir e silenciar os movimentos sociais e sindicatos que se insurjam contra esses ataques.

É bem verdade que esse cenário de repressão e militarização não é uma novidade, nem atributo exclusivo do governo golpista de Temer. Essa dinâmica já vem sendo denunciada há muito tempo. Todavia, o golpe institucional, por seu caráter e objetivos a implementar, pode representar uma mudança qualitativa na política de repressão.

A escolha do Ministro interventor da Justiça Alexandre de Moraes, famoso por querer restringir o direito de manifestação e dar aval para que a Polícia Militar invada ocupações sem mandado judicial em SP, é expressão dessa tendência.

Mas não é só na restrição a direitos que essa violência se expressa. É também, e principalmente, por meio do extermínio da juventude pobre e negra nas periferias e favelas.

Conforme apurado em pesquisa, no município de São Paulo, especificamente, dois terços dos mortos em decorrência de violência policial em 2014 são negros[1].

No Brasil, em 2015, 3.022 pessoas foram mortas pela polícia, um aumento de 37% em relação ao ano anterior, aponta o Anuário Brasileiro de Segurança Pública[2].

Ainda, conforme apurou a "Folha", "em cinco anos, de 2009 a 2013, as forças de segurança no Brasil foram responsáveis por 11.197 mortes, enquanto, nos EUA, com população 60% maior, cifra parecida (11.090), foi atingida em três décadas”[3].

Essa situação de violência policial generalizada e impune, com a proliferação de diversos “esquadrões da morte”, foi o que motivou, inclusive, o Conselho de Direitos Humanos da ONU a emitir recomendação ao governo brasileiro, em 2012, para a dissolução da polícia militar.

Todo esse cenário se agrava se considerarmos a recém aprovada Lei 13.260/16 (antiterrorismo).

O fato é que a Comissão da Verdade, desacompanhada da Justiça, favoreceu a manutenção das estruturas de poder de repressão datadas da Ditadura Militar. Sem a justiça aos crimes de ontem, ficamos reféns dos crimes de hoje. A tortura e o extermínio se mantém, assim, como instituição paralela.

Nesse cenário, a violação dos direitos humanos nas periferias reflete, em maior ou menor grau, as violações aos direitos humanos nos locais de trabalho. À militarização do Estado se liga a militarização das fábricas e empresas, nas quais os trabalhadores são coagidos ao silêncio, sob pena de dispensa imediata (ocasionando um aumento do assédio moral e sexual e uma incidência cada vez maior de doenças ocupacionais).

A perspectiva da militarização e da violência policial não é algo distante. O ataque a sedes de sindicatos, a invasão de assembleias sindicais pela polícia, os tiros e as emboscadas que deixaram militantes de movimentos sociais mortos ou feridos é expressão disso. O extermínio nas periferias é o extermínio dos trabalhadores. Flexibilização e extermínio são duas faces da mesma repressão.

É urgente uma resposta unificada ao problema, tanto na perspectiva da luta contra o golpe quanto de defesa da democracia.

Artigo publicado em versão reduzida no Jornal Visão Oeste, em 27/05/2016.

[1] Prefeitura de São Paulo. Juventude e violência na cidade de São Paulo. I Seminário Municipal de Segurança Pública e Direitos Humanos. Disponível em: <http://www.prefeitura.sp.gov.br/cid...> . Acesso em: 25.05.2016.

[2] Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Anuário de Segurança Pública. Ano 9. 2015

[3] Folha de São Paulo. Agentes da insegurança. Editorial. 06.08.2015. http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/228551-agentes-de-inseguranca.shtml




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