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SOBRE JULGAMENTO DO LULA | Financial Times: "mal-estar" nas finanças com a situação brasileira?

André Barbieri São Paulo | @AcierAndy

sexta-feira 26 de janeiro de 2018 | Edição do dia

Em momentos de grande comoção social ou de eventos que modificam traços importantes da situação política, é muito útil observar a reação das outras classes sociais - e também de nossa classe inimiga. Lênin dava grande importância a esse exercício, dizendo que a consciência das massas operárias "não pode ser uma consciência de classe verdadeira, se os operários não aprenderem a aproveitar os acontecimentos políticos de grande atualidade para observar cada uma das outras classes sociais" em todas as manifestações de sua vida intelectual, moral e política.

A condenação arbitrária de Lula no TRF4 de Porto Alegre por três desembargadores, de forma unânime, representou sem dúvida a continuidade do golpe institucional de 2016 pela via de um crescente autoritarismo judiciário. Os direitos democráticos das massas foram violados: uma pequena casta privilegiada - neste caso, três desembargadores! - definiram em quem milhões de trabalhadores podem ou não votar.

Os capitalistas, os grandes empresários, a imprensa oficial, as instituições estatais, se interessam em obrigar Lula a abrir mão de sua candidatura, que poderia por em risco um aspecto muito importante que motivou o golpe institucional: a agenda "própria" de ataques que o PT vinha aplicando - e vem prometendo aplicar - não obedece exatamente o ritmo de "marchas forçadas" que a burguesia deseja. Precisam do que fez Temer na Suíça: prometer uma draconiana reforma da previdência para já, dilapidando o tesouro público para comprar deputados.

Ver aqui: Repudiamos a condenação arbitrária de Lula: greve geral contra as reformas e pelo direito do povo decidir em quem votar

Entretanto, ao atacar os direitos democráticos, incrementar a bonapartização do regime e avançar ataques, nem tudo são "águas de rosa" para a burguesia. Podemos enxergar isso na manifestação de um dos principais representantes das finanças mundiais, o jornal britânico Financial Times, que apontou suas "preocupações". Vale a pena observar a conduta deste inimigo de classe dos trabalhadores.

"Making Brazil Great Again"?

O título do editorial do Financial Times sobre Lula, no dia seguinte à condenação, é "O julgamento da sentença contra Lula não ’fará o Brasil grande de novo’" (numa crítica àqueles que, usando o tema eleitoral de Trump - Make America Great Again - disseram que a condenação de Lula é um "Make Brazil Great Again"). Isso é por si só sintomático da preocupação que existe num setor das altas finanças, apesar de todo o alarde com a alta nas Bolsas. Em síntese, estão preocupados que a polarização social - luta de classes - e a falta de liderança prejudique as reformas.

Apesar de defender a imparcialidade da Lava Jato, dizem que "é espantoso que uma Corte tenha decidido o curso da eleição presidencial no Brasil, e não os eleitores".

Mas a preocupação vai além; "Os muitos oponentes de Lula estão enganados em sua alegria. Mesmo seu rival, o ex-presidente FHC, disse que sua potencial prisão seria ruim para o país. O Brasil, um dos países mais desiguais do mundo, precisa de um forte partido de centro-esquerda, tal como o PT; a condenação de Lula apenas o enfraquece. A remoção de sua candidatura polarizaria ainda mais uma corrida eleitoral já polarizada [...] Protestos nas grandes cidades são quase certos".

Depois, problematizam as ilusões dos mercados, que fizeram campanha aberta pela condenação unânime de Lula como a melhor forma para facilitar um próximo presidente "market-friendly" (amigo dos mercados) para aplicar os ajustes. "A polarização social aberta é um obstáculo grande à passagem destes mesmos ajustes. O drama ao redor do julgamento do TRF4 mostra a profundidade da raiva popular brasileira".

Por último, problematiza o vácuo de liderança que emerge com a possível saída do político mais popular do país. Segundo o jornal britânico, "Acima de tudo, as ramificações da possível remoção da candidatura de Lula revelam o vácuo de liderança que reside no coração da política brasileira, e a ausência de alternativas. [...] Atualmente Jair Bolsonaro está em segundo lugar nas pesquisas de voto, um ex-capitão do exército cujas opiniões fazem os tweets de Trump parecerem doces. Isso não é grandioso; é triste. Com apenas nove meses até as eleições, é também preocupante".

Sintomas do acirramento da luta de classes?

O alarme deste gendarme das finanças é claro: governabilidade. Se em geral é útil o incremento do autoritarismo estatal para alterar a relação de forças entre as classes e permitir ataques mais duros, por outro lado debilitar um mecanismo de contenção da luta de classes (PT) numa situação de completa crise de autoridade do regime político - crise orgânica nas palavras de Antonio Gramsci, traduzido por "profunda ira popular contra todos os políticos" pelo Financial Times - pode desencadear efeitos consideráveis e imprevisíveis.

Esta crise orgânica - que segundo o marxista italiano envolve uma crise econômica, política e social que afasta e separa massas da população de suas representações políticas tradicionais, devido à crise de autoridade da classe dominante - dá impulso cada vez maior à polarização social. Em meio à crise econômica brasileira, arroubos autoritários de instituições do Estado - por mais "prestigiadas" que estejam, ainda que com contradições, como o judiciário - dão larga margem para que a polarização social se aprofunde e a raiva popular se expresse em novas formas de pensar à direita, mas também à esquerda.

O perigo para a burguesia (inclusive internacional) é que o PT deixe de ser entendido como o "mal menor" dentro do regime, e outras soluções sejam buscadas - nas palavras de Vladimir Safatle, soluções que sejam expressão "do colapso de todo horizonte de conciliação na política nacional".

Para isso, é imperativo organizar a classe trabalhadora para defender seus direitos democráticos - em primeiro lugar o de poder votar em quem quiser, sem interferência do judiciário - e lutar contra a reforma da previdência, e pela abolição da reforma trabalhista. Isto não pode ser feito por setores da esquerda golpista que passaram da "revolução democrática" à defesa do bonapartismo judiciário.

Ver aqui: PSTU e a esquerda golpista: juntos ao judiciário contra o direito de milhões votarem em quem quiserem

Os tempos da modificação da situação exigem um acompanhamento milimétrico: é urgente que as centrais sindicais, a CUT e a CTB, parem de rastejar atrás da agenda parlamentar e organizem já uma greve geral em todo o país, parte de um plano de luta para barrar a reforma da previdência e defender o direito democrático da população de decidir em quem votar.

No interior deste combate colocamos o Esquerda Diário e o MRT inteiramente a serviço de superar a estratégia de conciliação de classes do PT pela esquerda, buscando construir uma ferramenta anticapitalista e revolucionária dos trabalhadores, convidando todos os trabalhadores e jovens, assim como organizações como o PSOL, a tirar as conclusões necessárias do fracasso do projeto do PT.




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