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ENTREVISTA | Esquerda Diário entrevista Gabriela Viola

Educadora do Paraná afastada por lecionar Marx cedeu entrevista ao Esquerda Diário, falando um pouco do afastamento, Escola Sem Partido e campanha Aula Protesto.

terça-feira 26 de julho de 2016 | Edição do dia

Foto: Paulo de Jesus /Mídia Ninja

Esquerda Diário: Marx é conteúdo obrigatório nas disciplinas de Sociologia e Filosofia, em vários temas como Trabalhado e Ideologia. Porém, seu afastamento está ligado ao ensino de Marx, por que acha que isso aconteceu?

Gabriela Viola: Marx está dentro das diretrizes curriculares da sociologia, como os outros teóricos. A disseminação do vídeo nas redes sociais esteve primeiramente ligada a páginas de pessoas que tem pensamento contrário ao autor, que são as páginas de direita. E os ataques não vieram apenas ao pensamento do autor. Os ataques também estavam relacionados ao estilo musical escolhido, o funk, que nós sabemos que é um estilo musical periférico e marginalizado. Este estilo musical fortemente criticado por pessoas que tem o pensamento etnocêntrico. O que seria esse pensamento? São pessoas que consideram que a sua visão de mundo é superior do que as demais. Então dito isso, eu acredito que a disseminação negativa que teve do tema do trabalho, e da maneira como foi abordado, contribuiu sim para o meu afastamento, ainda que já tenha retornado a escola, embora muito provavelmente por causa da repercussão e apoio que tive.

Esquerda Diário: Você considera o ensino de Marx importante na formação dos nossos alunos?

Gabriela Viola: Assim como outros pensadores como Durkheim e Weber, Marx é um clássico da sociologia. A contribuição dele e dos outros autores são contribuições essenciais e muito importantes, para fazer uma análise social. O que eu julgo de importante para uma educação, para a vida, é a pluralidade de conhecimento, de pensamento de cultura. Só desta forma que vamos caminhar para uma educação que de fato transforme. Uma educação que respeita a pluralidade dentro da sala de aula e não que faça um ataque a este ou aquele pensador.

Esquerda Diário: O projeto Escola Sem Partido tem o objetivo de cercear mais ainda a liberdade dos professores em sala, algo para além dos livros, apostilas e currículos. Por que acha que estão querendo impor esse projeto nesse momento?

Gabriela Viola: Primeiramente, essa nomenclatura dada ao projeto de lei Escola Sem Partido está errado. O nome que deve ser dado é escola da mordaça.

Por quê? Porque este projeto não respeita o que está dito em constituição, que é pluralidade de ideias. E respeitar a pluralidade de ideias, é respeitar o sistema democrático, em que todos nós podemos pensar e agir de maneiras distintas, de maneiras diferentes. Toda vez que a gente vive um momento, um processo de instabilidade política, social e econômica sentimos sim, os resquícios vindos da ditadura. Este projeto que visa colocar os professores em constante vigilância nada mais é do que mais um passo dado a caminho por uma sociedade antidemocrática.

Esquerda Diário: Como acha que seria possível barrar o projeto? Qual papel cumpririam os sindicatos em sua opinião?

Gabriela Viola: Chegou um momento que nós precisamos de uma organização nacional, que esta luta não seja direcionada apenas para as educadoras e educadores. Nós precisamos abrir um diálogo com a sociedade civil, com os secundaristas e seus familiares. Como? Por meio de rodas de conversa, brigadas populares pela educação gratuita, laica e de qualidade para a juventude. Nós precisamos mostrar para sociedade civil o que está por trás de fato deste projeto de lei. Que esta mordaça não vem apenas para nós, enquanto professoras e professores. Esta lei da mordaça vai para os alunos também, e toda sociedade de certa forma.

Esquerda Diário: O que tem achado das aulas protestos em todo país por conta do projeto em solidariedade a você e inúmeros outros professores cerceados de sua liberdade de expressão?

Gabriela Viola: As aulas protesto demonstram que nós podemos ser mais unidos enquanto categoria de professoras e professores em âmbito nacional. Ela coloca em pauta novamente esse debate em torno deste projeto de lei que é um retrocesso na conquista de direitos do povo. Eu sei que eu não sou a primeira professora a ser reprimida e não serei a última. Fez com que eu me sentisse apoiada e renovada pra levar a frente debate sobre a educação laica, gratuita e de qualidade. Parece que assim, foi como se fosse uma faísca que reascendeu essa chama nos professores enquanto categoria e vai servir de apoio para várias outras educadoras e educadores que podem passar pela mesma situação de repressão que eu passei e que vão denunciar, e que vão se sentir apoiados para denunciar sem medo.

Esquerda Diário: Ano passado teve uma importante greve de professores no Paraná. Você participou? Como foi a experiência?

Gabriela Viola: Então, no dia 29 de abril foi um dia marcado pelo massacre. Foi mais de 20 minutos de bombas e balas de borrachas em nós educadoras e educadores. Foi um cenário de guerra que é muito difícil de esquecer e tirar da mente. Toda vez que eu falo 29 de abril, vem aquelas cenas horríveis, cenas de massacre. Foi uma representação de como nós educadoras e educadores vimos sendo tratados pelo Estado. Como diria Weber né, é o Estado que tem o uso legitimo da força e ele usou muito bem. Foi um abuso de poder do mais alto grau.

Gosto de afirmar que nós professores temos as mãos sujas de giz, enquanto a deles está suja de sangue.

Foi um dia que nós perdemos direitos conquistados historicamente e os ataques aos nossos direitos continuam como esse projeto lei da mordaça. E continua ferozmente, mas nós não podemos abrir a mão de direitos conquistados, e nós não abriremos.




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