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VOZ ANTICAPITALISTA | Entrevista com Diana Assunção, pré-candidata a vereadora do MRT pelo PSOL em São Paulo

O Esquerda Diário entrevistou Diana Assunção, trabalhadora da USP, militante do Movimento Revolucionário de Trabalhadores que vai concorrer nas eleições para vereadores pela legenda do PSOL.

sexta-feira 29 de julho de 2016 | Edição do dia

Confira a entrevista com Diana Assunção, que contou ao Esquerda Diário sobre o porquê de sua candidatura e um pouco de sua trajetória.

Esquerda Diário: Você poderia contar um pouco para nossos leitores sobre sua trajetória de militância?

Diana Assunção: Em 2006, quando era estudante de História na PUC-SP, onde me formei, participei da fundação do grupo de mulheres Pão e Rosas, que se iniciou na luta contra a superexploração e as absurdas condições de trabalho das trabalhadoras terceirizadas da limpeza naquela universidade. Elas nos relatavam coisas absurdas, como a empresa fornecer alimento estragado para seu café da manhã.

Desde o início, entendíamos que a luta contra o machismo não podia ser consequente sem uma visão marxista, um recorte de classe que permitisse compreender como a opressão machista é utilizada e faz parte do sistema capitalista para aprofundar a precarização do trabalho e a exploração. Por isso, também me organizei politicamente na antiga LER-QI, que deu origem ao Movimento Revolucionário de Trabalhadores (MRT), organização a qual pertenço hoje e que está impulsionando candidaturas em cinco diferentes cidades pela legenda do PSOL.

Atualmente trabalho na Faculdade de Educação da USP, e há muitos anos participo das lutas dos trabalhadores e estudantes da universidade em defesa da educação pública, e ali também tive a honra de lutar ao lado das trabalhadoras da Higilimp, Dima, União, BKM e outras empresas terceirizadas, que protagonizaram importantes greves. Estou atualmente licenciada da diretoria do Sindicato dos Trabalhadores da USP (Sintusp), no qual impulsiono a Secretaria de Mulheres, uma obrigatoriedade para fazer campanha eleitoral, mas vinha como parte do sindicato sendo uma colaboradora das grandes lutas dessa categoria combativa.

Esquerda Diário: A sua atuação política hoje então está no campo da defesa dos direitos das mulheres e da educação pública?

Diana Assunção: Sim, são algumas das principais lutas que participo, mas não de uma forma isolada. Nós do MRT consideramos que essas lutas fundamentais, como outras, devem estar ligadas a um projeto estratégico, que é de uma luta anticapitalista. Como mencionei antes, a opressão das mulheres hoje está profundamente associada ao capitalismo, é um sistema que se apropriou dessa opressão da sociedade patriarcal que vem de antes do capitalismo e a perpetua para aumentar seus lucros. Portanto, não é possível ser consequente de fato com a defesa de todos os direitos das mulheres, desde a luta contra a violência machista, a cultura do estupro, o direito ao aborto, a desigualdade salarial, entre outras, que são batalhas fundamentais que temos que travar, sem lutar contra o fundamento que se nutre de todas essas opressões: o sistema capitalista.

O MRT se coloca na linha de frente da luta por direitos de todos os setores explorados e oprimidos, os negros, as mulheres, os LGBTs, os indígenas, a juventude que sofre as consequências do desemprego e dos cortes de direitos. Compreendemos que o regime político que existe hoje é um mantenedor dessa estrutura social exploradora e desigual, que mantém um punhado de bilionários vivendo às custas da miséria da esmagadora maioria da humanidade.

ED: E quais você considera que são os principais problemas a serem enfrentados pelos trabalhadores e a juventude hoje?

DA: Hoje vivemos um momento difícil, em que um golpe institucional organizado pelos setores mais reacionários da burguesia e da direita foi desferido para colocar no governo Michel Temer. Esse golpe não foi “contra o PT” meramente, mas em primeiro lugar contra os trabalhadores e o povo pobre. O que ocorre é que nos treze anos de governo petista, os patrões lucraram como nunca – para ficar em apenas um exemplo basta ver os crescentes lucros dos bancos – mas o momento de singular crescimento dos produtos agrícolas exportados pelo Brasil ainda permitiu que mesmo assim Lula e Dilma fizessem algumas concessões mínimas, como o Bolsa Família, FIES, Minha Casa, Minha Vida, aumentos salariais um pouco acima da inflação em diversas categorias, crédito facilmente acessível etc.

Essa conjuntura particular, com o PT governando para os patrões mas podendo deixar que algumas migalhas caíssem de sua mesa para os setores explorados e oprimidos, gerou uma ilusão de que, aos poucos, a vida ia melhorando. O golpe da crise sobre o Brasil estraçalhou essas ilusões, pois destruiu imediatamente a máscara do PT: em um dia Dilma falava de uma “pátria educadora”, e quase no dia seguinte implementava um brutal corte na educação. Os ataques se seguiram em todos os serviços públicos, salários, condições de vida; a inflação disparou; o objetivo do PT era seguir governando para os ricos, mas ele não implementou os ataques de forma tão agressiva quanto exigiam os patrões. Por isso, colocaram em marcha o golpe, e Temer hoje está implementando a grande velocidade os ataques dos patrões, e planeja outros muito maiores, como a reforma trabalhista, da previdência, a regulamentação da terceirização, entre tantos outros.

É importante ressaltarmos que quem abriu o espaço para o fortalecimento dos golpistas foi o próprio PT, que durante todo seu governo costurou acordos com esses setores e os colocou como base de seu governo, concedendo-lhes ministérios, apoiando suas propostas e preparando o caminho para que eles dessem um passo à frente no momento necessário. Assim como também se negou a impulsionar uma verdadeira mobilização contra o golpe, pois a única forma de barrar seria com a CUT encabeçando uma mobilização que não quiseram fazer, pois como sempre digo, eles temem mais a luta de classes do que os golpistas.

Em outros flancos também vem a todo vapor a ofensiva golpista: discute-se retrocessos ideológicos tremendos, como o projeto Escola Sem Partido, cujo objetivo é tentar conter e calar os secundaristas que deram exemplos de luta em diversos estados e chegaram a derrotar o governo Alckmin em São Paulo. Há propostas para atacar ainda mais direitos dos LGBTs, como a proibição de que pessoas trans utilizem o banheiro do gênero com o qual se identificam; ataques aos indígenas, como a PEC 215 para rever demarcações de terra e passá-las para o legislativo; ataques às mulheres, com propostas de restringir ainda mais o direito ao aborto ou atacar a licença maternidade. Enfim, a lista é imensa.

Mas não fazemos coro com aqueles que dizem que “tudo está perdido”. Pelo contrário: sabemos que a classe trabalhadora tem força de sobra para derrotas os golpistas e seus ataques. Se a crise do PT está abrindo espaço pela direita, também está fazendo pela esquerda. Junho de 2013 foi um marco a partir do qual liberaram-se forças de movimentos como há muito tempo não se via. Mesmo que haja um refluxo conjuntural, há uma crise profunda e a classe trabalhadora e a juventude não foi derrotada. Mesmo que passe o golpe no Senado, o que é absolutamente o mais provável, ainda virão os grandes combates quando os ataques do governo Temer golpista vierem com força. Seguramente vai haver resistência e não descartamos de nenhuma maneira que possamos virar o jogo a favor dos trabalhadores e do povo. A própria fortaleza eleitoral que está mostrando candidaturas do PSOL em grandes capitais mostra este espaço, independente das diferenças que temos com a direção do partido, pois são milhões buscando uma alternativa à esquerda. Para isso vamos precisar avançar muito em nossa organização, o que queremos nessa eleição é justamente entrar nesse momento de grande politização nacional para dizer aos trabalhadores, à juventude, aos LGBTs, mulheres, negros, indígenas que temos de ser milhares de vozes anticapitalistas para retomar a ofensiva.

ED: Mas se este regime político perpetua esse sistema, existe uma contradição em um grupo como o MRT participar das eleições?

DA: Nós somos revolucionários, pois entendemos que não haverá luta consequente pelos direitos e conquistas que sejam efetivas se limitando a uma via eleitoral ou parlamentar. Somente com a organização dos de baixo, tanto no patamar sindical quanto político – e com um papel central dos trabalhadores, que são aqueles que produzem a riqueza social – podemos obter verdadeiras conquistas. Ainda mais se nosso objetivo é que não sejam tiradas com outra mão pelos governos, o que fazem sempre, e apontar para uma luta de fundo que seja para derrubar a ordem social imposta pelos de cima, na perspectiva de um governo dos trabalhadores de ruptura com o capitalismo.

Sendo assim, consideramos uma ilusão a ideia de que a burguesia permitiria que pelo voto questionassemos sua dominação. O sistema político no Brasil é profundamente antidemocrático: organizações como a nossa sequer podem participar das eleições. Só estamos nos apresentando porque fizemos um acordo de filiação democrática com os companheiros do PSOL, que nos cederam a legenda sem que façamos parte do partido. Outros lutadores do movimento não podem se apresentar sem legalizar um partido, o que no Brasil é fácil para os capitalistas que pagam pessoas para coletar assinaturas pelo país, mas que para a esquerda é um obstáculo antidemocrático enorme, já que exige 500 mil assinaturas em 9 estados.

Outro exemplo de como as eleições estão moldadas para favorecer os partidos da ordem é que é absurdamente anti-democrática a distribuição do tempo de TV e, para completar, a recente reforma política permite excluir dos debates televisionados até mesmo o PSOL onde disputa com candidaturas de peso, como Luciana Genro em Porto Alegre, Freixo no Rio de Janeiro, Erundina em São Paulo e outras cidades como Belém, Niterói e Sorocaba. Um absurdo, mas que é igualmente anti-democrático com o PCB, PSTU e PCO que sequer são considerados.

As campanhas à prefeitura de São Paulo – que esse ano gastarão cerca de um quarto do que nas últimas eleições, (pelo menos no que se refere ao financiamento legal, pois corre muito dinheiro “por fora”) – custarão aproximadamente R$ 15 milhões. Esse dinheiro é bancado pelos capitalistas que terão seus interesses muito bem representados pelos políticos que elegerão com seu financiamento. Em contrapartida, esses políticos são “serviçais” dos patrões muitíssimo bem remunerados, tendo salários exorbitantes, além de absurdas verbas de gabinete – sem contar tudo o que enriquecem às custas dos esquemas de corrupção que atingem invariavelmente todos os partidos dos patrões. Esse é um componente chave do esquema de corrupção que o PT assimilou como método como qualquer outro partido que já fazia isso antes.

Mas apesar disso tudo, as eleições são um terreno importante de luta para os revolucionários e todos aqueles que querem questionar essa camarilha de políticos privilegiados e corruptos dos partidos da ordem, porque é um momento onde a população reflete especialmente sobre a política, e nós temos que apresentar uma alternativa, que mesmo que seja modesta hoje, sirva para fortalecer a construção de uma alternativa dos trabalhadores e da juventude.

Por isso apresentamos como uma voz anticapitalista, uma voz dos trabalhadores que cumpra essencialmente três objetivos: fortaleça as lutas nas ruas, locais de trabalho, escolas e universidades; denuncie a podridão desse regime e as negociatas dos políticos e dos patrões para roubar e explorar cada vez mais; e contribua para o avanço da consciência de classe dos trabalhadores, que é sua arma indispensável para lutar contra a exploração.

ED: Você fala de que são necessárias várias vozes anticapitalistas nas eleições, o que isso quer dizer?

DA: Quer dizer que quando fazemos a campanha para mim, ou cada um dos nossos candidatos, não se trata meramente de depositar na minha pessoa a expectativa de mudanças. Que precisamos da força de cada um para enfrentar este sistema e os obstáculos antidemocráticos dos poderosos. Nossa intenção era seguir o exemplo do PTS na Frente de Esquerda e dos Trabalhadores da Argentina, que apresentou mais de mil candidatos e cada um fazia sua própria campanha de forma militante. Mas mesmo isso não sendo possível pela legislação, queremos encarar essa tarefa no mesmo espírito, então o nosso chamado é a que todas e todos entrem com toda força nessa campanha como se fossem sua. Que tenham suas próprias idéias e que construam conosco o Esquerda Diário como uma ferramenta dessa luta. Todos podem fazer parte do Esquerda Diário e se reunimos centenas em todo o país que abraçam essa perspectiva, pode se transformar numa grande referência para setores de massa no país.




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