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ESTADO ESPANHOL | Eleições na Espanha: o Podemos como um sócio menor do PSOE e defensor do regime monárquico

O primeiro debate presidencial frente às eleições do próximo domingo deixou uma troca cínica de críticas sobre quem foi mais “ajustador”. O Podemos evidenciou sua transformação em um partido da ordem constitucionalista do regime monárquico de 78.

Santiago Lupe@SantiagoLupeBCN

quarta-feira 24 de abril de 2019 | Edição do dia

O Estado espanhol teve na noite de segunda (22) seu primeiro debate presidencial das eleições gerais de domingo, 28 de abril. Este primeiro debate teve entre seus participantes os quatro principais candidatos: Pedro Sánchez (PSOE), Pablo Casado (PP), Pablo Iglesias (Unidas Podemos), e Albert Rivera (Ciudadanos). Os quatro candidatos sintetizaram nas breves intervenções as mensagens e argumentos que já foram ouvidos nas últimas semanas, desde a convocação antecipada de eleições.

Pablo Iglesias, candidato à presidência do Podemos, cumprimentou os trabalhadores da RTVE (a rede de televisão através da qual a transmissão foi transmitida) e referiu-se ao debate como um exercício útil para que os cidadãos possam votar com critério no próximo 28 de abril. No entanto, o próprio debate confirmou neste dia, que nenhuma das cédulas representará uma saída para os grandes problemas sociais e às demandas democráticas que se manifestam nas ruas desde 15 de março de 2011 (o chamado 15M).

Iglesias deixou claro em seu discurso que o Podemos, nesses cinco anos de vida, se tornou o maior defensor da Constituição de 1978 e o parceiro incondicional do braço "esquerdo" do antigo bipartidarismo, o PSOE. A Carta Magna e os exemplos fiscais dos países da UE – a mesma instituição que afogou o povo grego e impôs os planos de ajuste desde 2010 – foram as referências que Iglesias levantou para explicar seu projeto de "governo da esquerda" junto com os sociais-liberais do PSOE.

Os dois primeiros blocos do debate trataram das políticas fiscais, econômicas e sociais de cada um dos candidatos. Houve uma troca de acusações, uma mais cínica que a outra, entre o candidato do PSOE e do PP, sobre quem aplicou os piores ajustes. A formação de direita Ciudadanos (Cs), por outro lado, censurou a ambos por não terem ido mais fundo nas "reformas", isto é, no ajuste neoliberal. Podemos, como membro aspirante a sócio de Sánchez, escolheu perdoar o PSOE por ter sido responsável pela reforma trabalhista de 2010, os ajustes de pensão de 2011 e o primeiro plano de ajuste contra funcionários públicos, sobre os quais não disse uma palavra.

Em questões fiscais, PP e Cs propuseram reduzir os impostos para as rendas mais altas e para as empresas, abolindo impostos como o de patrimônio – que incide sobre grandes fortunas – e heranças. Em matéria econômica, eles se contiveram para expor em detalhes seu programa de novas reformas trabalhistas, contrato único e privatização de serviços públicos. Porque se vê que esse programa não vende bem.

O PSOE, entretanto, quis capitalizar as mínimas concessões do breve governo Sánchez, uma boa cortina de fumaça para não precisar explicar que não tem a mínima intenção de reverter os ajustes de Zapatero e Rajoy sobre o trabalho, pensões e cortes. Também parece que não tocar nestes pontos foi a melhor maneira de somar votos.

Podemos cumpriu o papel de sócio "exigente", embora com pouca credibilidade. Criticou o PSOE por não ter aceitado algumas de suas propostas em termos de controle do mercado imobiliário ou impor taxas aos bancos até recuperar os 60 bilhões de euros do resgate. No entanto, em nenhum momento colocou essas propostas – com as quais ele está tentando fazer uma campanha mais à esquerda do que tem sido seu desempenho parlamentar desde 2015 – nem mesmo como uma condição mínima para voltar a apoiar um novo governo do PSOE. Como aconteceu com os orçamentos que votou o PSOE sem grande debate, tudo indica que essas demandas estarão novamente na gaveta depois do 28A, até a próxima campanha eleitoral.

Na questão territorial, a formação de ultra-direita do Vox marcou uma tendência. Embora o partido de Abascal mal fosse nomeado pelos candidatos, poderia ter defendido as políticas propostas por Casado e Rivera. Aprofundar o artigo 155 (norma constitucional que permite a intervenção do Estado central sobre as autonomias, como fez na Catalunha), intervenção da educação catalã, Lei dos Partidos, entre outros temas, foram a tônica das suas intervenções, assim como a acusação ao terceiro sócio deles nesta área – o PSOE, que apoiou Rajoy na intervenção da Catalunha sem vacilar, e que agora é parte da acusação no julgamento do Supremo contra os dirigentes independentistas – de tramar algum indulto a esses líderes.

Sánchez se manteve numa posição de oposição ao independentismo, mas sem reproduzir o discurso ultra da direita. Quanto aos indultos ele não quis se pronunciar. Enquanto não se sabe o que vai acontecer nesta área, longe de qualquer ilusão de que o PSOE vai abrir para uma saída menos repressiva na Catalunha, não parece disposto a fechar as portas para um possível apoio necessário dos deputados catalanistas na coalizão do governo. Se a situação retorna com este assunto, isto é, se o movimento democrático catalão volta a colocar o regime contra as cordas, o PSOE voltará a estar na primeira linha da reação monárquica como em 2017.

Neste ponto, Iglesias evidenciou mais claramente a transformação do Podemos em um partido da ordem constitucionalista. Recusou-se a todo o momento a fazer a mínima condenação da repressão contra o movimento democrático catalão e lançou uma corda a Sánchez, em apuros sobre a questão do indulto. Apoiou sua recusa em pronunciar-se sobre o indulto e abençoou o julgamento do Supremo, dizendo que tinha que deixar a justiça atuar, uma posição inacreditável frente a um julgamento orquestrado pelo regime com o único propósito de disciplinar o movimento catalão, mediante a prisão dos políticos independentistas.

O ponto de "regeneração democrática" passou sem dor ou glória. Que o PP, Cs e o PSOE não questionassem o regime de 78 era esperado. Mas o Podemos se somou a essa defesa do status quo elevando a Constituição como um estandarte e afirmando que já não era uma questão de reformá-la, mas simplesmente de fazê-la ser cumprida.

Finalmente, chegou o tema dos pactos. Cs manteve sua proposta ao PP de governo de coalizão e o Podemos fez o mesmo para o PSOE. Duas incógnitas ficaram sem respostas. O primeiro é o que fará o PSOE se se juntar ao Cs, a opção preferida do establishment e ao qual Sánchez não quis fechar a porta.

Iglesias se queixou de que o atual presidente do governo não quis responder, mas ao mesmo tempo, ele não disse algo que valeria perguntar: o Podemos apoiará um novo governo do PSOE mesmo que ele se recuse a assumir até mesmo as reformas parciais com que o Podemos faz campanha? Tudo indica que voltará a ser um novo sócio incondicional, a pata esquerda que o regime precisa para sobreviver.




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