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Opinião | Eleições 2022: Lula-Alckmin não é uma alternativa no combate à extrema-direita e para revogação integral das reformas

O discurso de Lula em sua campanha busca dialogar com o sofrimento da população e pode gerar esperança e confiança para lutar por suas demandas. Entretanto, se eleito, Lula deve garantir os lucros da Faria Lima e do Agronegócio e para isso precisará manter e aprofundar ataques aos trabalhadores, diante da crise econômica.

Babi DellatorreTrabalhadora do Hospital Universitário da USP, representante dos trabalhadores no Conselho Universitário

sábado 29 de janeiro de 2022 | Edição do dia

O ano eleitoral começou, chegamos enfim em 2022. Ano propagandeado pelo PT como o ano em que Bolsonaro e a extrema-direita seriam derrotados…nas urnas. E Lula pautou o debate na mídia com dois temas: sua aliança com Alckmin - símbolo da implementação de uma política neoliberal e privatizante - e a suposta alteração em pontos da reforma trabalhista usando como exemplo o que está acontecendo na Espanha.

Não faltaram manifestações de todos os setores da burguesia, seus políticos, empresários, ministros e a mídia que saíram como cachorros loucos à defender a reforma trabalhista, um dos grandes legados do golpe de 2016. Quem também se manifestou contrário foi o próprio Alckmin que, na disputa eleitoral de 2018, era o escolhido dos setores golpistas, incluindo aí o judiciário e os militares. Alckmin não emplacou na população porque era identificado demais com os partidos do regime que vinham atacando os direitos sociais dos trabalhadores, da juventude, mulheres e negros que protagonizaram enormes manifestações em 2013 e duras greves em 2014 justamente contra esses ataques.

Como dizíamos em 2016, não se tratava de um golpe contra a Dilma e o PT, mas um golpe contra os trabalhadores, uma mudança autoritária no regime político para poder atacar os trabalhadores mais rápida e intensamente do que o PT era capaz de fazer com sua política de conciliação de classes. E os grandes empresários nacionais e multinacionais tinham pressa diante da crise econômica mundial que se aprofundava. Esse giro autoritário no regime despertou as forças e anseios mais reacionários do país, ganhou as ruas e organizou os setores de extrema-direita, vindo à tona valores misóginos, anti operários, antidemocráticos, fazendo ruir o pacto social expresso na Constituição de 88. Nesse sentido, foi um ataque à base social que o PT representava, trabalhadores, movimentos sociais, artistas e a pequena-burguesia progressista. A estratégia de conciliação de classes do PT foi abandonada porque não era mais necessária aos representantes do capital financeiro, uma vez que internacionalmente a situação também girava à direita culminando na eleição de presidentes de extrema direita em vários países, sendo o mais emblemático Trump na maior potência imperialista.

Com a entrada em cena dos trabalhadores e da juventude em países como a França, Chile e mesmo nos EUA, repercutindo na derrota eleitoral da extrema-direita, a burguesia brasileira passa a considerar a possibilidade de lançar mão a uma alternativa política que possa impedir grandes levantes no Brasil. É neste contexto que se reabilitam os direitos políticos de Lula.

No dia de 19 de janeiro, Lula discursou por 2h numa coletiva para mídias independentes com a tranquilidade de quem possui a habilidade de se dirigir aos trabalhadores, jovens e o povo pobre; com a experiência de quem dirigiu o desvio do maior ascenso operário do país na luta contra a carestia de vida e contra a ditadura militar. Ao mesmo tempo em que apresentou à “Faria Lima”, ao agronegócio e à burguesia imperialista, a segurança de manter seus interesses sendo alguém que garantiu em seus 2 governo que os bancos e empresários lucrassem como nunca.

Em seu discurso, Lula expressa as dores e os anseios de um povo trabalhador que passa fome, revira o lixo e espera por osso na fila dos açougues, dizendo que o brasileiro tem que sonhar com a cervejinha e o churrasquinho. Se mostra indignado, e evoca a todos a se indignarem também, diante de tantas mortes e descaso com a vida. Fala de democracia e que o povo decida as coisas através dos conselhos municipais, estaduais. Retoma um ponto de vista popular que a direita e a extrema-direita tripudiaram nos últimos anos. Bolsonaro e o bolsonarismo humilhou as mulheres e os trabalhadores, desdenhou de suas vidas e fez piada das suas perdas. Apresentou para a juventude um futuro pautado pelo passado, sem direitos, sem estudo e trabalho quase escravo em cima de uma bicicleta.

O objetivo da candidatura de Lula, para a burguesia que devolveu seus direitos políticos, é de estabilização do regime político pós-golpe e conservação de todas as reformas e ataques contra os trabalhadores. É para evitar que surjam mobilizações de massas, como as que ocorreram nos países vizinhos, que questionem e coloquem abaixo toda a obra do golpe. Porém, diante de tanto reacionarismo, é possível que discursos como o que Lula fez na semana passada inspire esperança nas massas trabalhadoras e pobres e que permita retomar moral e confiança nos locais de trabalho, estudo e nos bairros para lutar por melhores condições de vida. É uma hipótese a ser considerada, que se daria como “efeito adverso” do objetivo estratégico da burguesia de estabilização desse regime que vem permitindo aprovar as reformas.

Na pesquisa Ipespe, onde Lula aparece com 44% das intenções de votos, já expressa que as massas enxergam nele um tipo de resposta às suas demandas, o que é perfeitamente compreensível ainda que equivocado.

Contudo, a esquerda socialista, os trabalhadores e jovens de vanguarda não podem se dar o direito de não dizer ao conjunto dos trabalhadores e todos os setores oprimidos do país que foi justamente a conciliação de classes do PT, tendo Lula como seu principal ator político e a CUT como principal braço sindical, que permitiu o fortalecimento da direita, da bancada religiosa e do agronegócio no Congresso, que levou ao impeachment de Dilma, a prisão de Lula e a eleição de Bolsonaro.

Também é preciso construir desde já uma alternativa dos próprios trabalhadores que supere a conciliação promovida por Lula e o PT, a esquerda socialista - como setores do PSOL e PSTU - deveriam unir forças em base a um programa operário para enfrentar a crise econômica e a pandemia, ampliando o Polo Socialista e Revolucionário. Um exemplo disso é a Frente de Esquerda e dos Trabalhadores - Unidade (FIT-U, em espanhol) que reúne partidos trotskistas e outros da esquerda argentina com um programa que propõe não pagar a dívida pública com o FMI, como forma de enfrentar a ingerência imperialista na Argentina que descarrega a crise em ataques aos trabalhadores.

A FIT-U luta também pela redução da jornada de trabalho para 6 horas, 5 dias na semana, e a divisão das horas de trabalho entre todas as mãos disponíveis, sem redução salarial, para unificar empregados e desempregados; luta pela nacionalização dos bancos e do comércio exterior. Dessa forma, apresenta uma lógica oposta ao reformismo que diz que, para ter sucesso eleitoral, é preciso rebaixar o programa e fazer alianças com partidos burgueses. Nas eleições de 2021, com esse programa operário, a FIT-U superou os liberais e se consolidou como a 3ª força política do país alcançando quase 1,3 milhão de votos e elegendo para o Congresso Nacional um gari, um ex-trabalhador do telemarketing, mulheres representantes da luta feminista, dos direitos humanos e professoras.

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Nesse sentido, é um erro o caminho que o PSOL tem discutido de fazer uma aliança com a Rede, um partido burguês, conformando uma federação nacional na qual terão que atuar juntos nos próximos 4 anos e nas próximas eleições em todo o país. Os parlamentares da Rede votaram a favor de medidas como as reformas trabalhistas e da previdência, além de apoiarem o golpe institucional de 2016. Enfrentar as leis eleitorais que são cada vez mais restritivas aos trabalhadores e movimentos sociais não significa rebaixar o programa ou se aliar com setores burgueses, como demonstrou a FIT-U na Argentina.

Uma proposta como a da FIT-U poderia amplificar o alcance da esquerda socialista no Brasil unificando a força que já possui com centrais sindicais como CSP-Conlutas e Intersindicais e seus parlamentares permitindo que a vanguarda dos trabalhadores, juventude, mulheres, negros e indígenas se organizem em torno de uma alternativa política de independência de classes para combater desde já Bolsonaro, Mourão e lutar pela revogação integral da reforma trabalhista e todos os ataques aos trabalhadores e ao povo.

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