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#JustiçaporLuanna | Declaração Pão e Rosas: #JustiçaPorLuanna e todas as vítimas da violência machista

No dia 17 de novembro a jovem Luanna, de apenas 25 anos foi encontrada sem vida, 12 dias após ter sido vítima de estupro por seu chefe, no restaurante onde trabalhava na zona norte do Recife.

Cristina SantosRecife | @crisantosss

sexta-feira 17 de dezembro de 2021 | Edição do dia

A morte de Luanna foi o desfecho da grave violência sofrida, dentro do ambiente de trabalho. Segundo matéria divulgada pelo Brasil de Fato PE, consta no boletim de ocorrência feito por ela no dia 12 de novembro que foi seguida até o vestiário durante seu expediente pelo estuprador, que a agrediu fisicamente e sexualmente.

O fato do estuprador ser o chefe de Luanna é ilustrativo de como nossos corpos são tratados como propriedade alheia no sistema capitalista. Não basta as horas extenuantes de trabalho, onde deixamos todos os dias uma parcela da nossa vida, o abuso sexual infelizmente não é uma questão pontual no que diz respeito ao ambiente de trabalho. Ao longo da história isso se demonstrou em mulheres que eram estupradas pelos patrões nas fábricas, no tratamento dos “senhores” escravistas às mulheres escravizadas, as recentes denúncias sobre os abusos sexuais praticados por Samuel Klein - fundador das Casas Bahia - contra suas funcionárias e filhas de suas funcionárias; segundo pesquisa realizada pela LinkedIn, 47% das mulheres já sofreram assédio sexual no trabalho.

Pessoas próximas a Luanna informaram que os 12 dias que se seguiram até a sua morte ela passou sentindo nojo de si mesma. Uma história que se repete na vida de milhares de meninas e mulheres que são abusadas e violentadas e encontram na sociedade machista o julgamento que as aponta como culpadas da violência sofrida. A maioria das vezes, esse julgamento começa na polícia, que ao pedir os detalhes do ocorrido para a vítima, questionam coisas do tipo “que roupa você estava usando?”, “isso são horas de estar na rua?”, “mas não existia algo entre vocês?”, entre diversas outras maneiras de “justificar” a violência. Isso inclusive é uma das razões pelas quais muitas das vítimas de violência sexual não fazem nenhum tipo de registro nestas instituições, pois sabem que aí a misoginia se expressa com força e se expor a isso pode significar duplicar a dor.

O crime contra Luanna é uma realidade frequente fruto de um sistema machista, que faz das mulheres mera propriedade. Neste caso, foi o seu chefe direto o responsável pelo crime. Numa sociedade que ideologicamente coloca mulheres em papel de subordinação, como propriedade de seus pais, depois de seus maridos e patrões e do estado, é preciso batalhar para que encontremos força junto a outras mulheres e homens que lutam por destruir o patriarcado e o sistema capitalista que o utiliza para nos explorar ainda mais.

Friedrich Engels, no seu livro, “ A origem da família, da propriedade privada e do Estado ”, coloca como o desenvolvimento da sociedade de classes, através da acumulação individual, foi um grande marco quanto ao papel social das mulheres, que para garantir a herança do que foi acumulado, era cada vez mais limitada à vida privada do lar e tida como propriedade do homem. Esta relação de propriedade é sob o que se ampara a violência contra as mulheres, como coloca Engels no trecho que discute o quão estrutural é a opressão à mulher na sociedade de classes:

“Para assegurar a fidelidade da mulher e, por conseguinte, a paternidade dos filhos, a mulher é entregue sem reservas ao poder do homem, quando este a mata, não faz mais que exercer seu direito”.

Esta passagem, bastante ilustrativa, nos arma para afirmar categoricamente que é necessário organizar a luta contra o patriarcado a partir de uma perspectiva socialista, de combate contra o capitalismo e nesse caminho, colocar abaixo o patriarcado.

A cadeia de desamparo que pode levar uma pessoa vítima de violência sexual a tirar a própria vida é reforçada por esse sistema, que mantêm mulheres e meninas como a maioria entre os pobres e miseráveis do mundo – este ano, o tema da pobreza menstrual tomou os holofotes quando o reacionário Bolsonaro vetou projeto que visava garantir a distribuição de absorventes - ; mulheres em geral possuem salários que chegam a ser 30% a menos que dos homens e no caso de mulheres negras, estamos relegadas aos piores postos de trabalho e reformas nefastas como a trabalhista aprovada no governo golpista de Temer e a da previdência de Bolsonaro e Guedes, atingem principalmente as mulheres.

Se olhamos para o século XX e para nosso atual século XXI, com certeza nos damos conta de que a vida das mulheres mudou radicalmente: na maior parte do globo podemos votar, ser votadas, temos pílula anticoncepcional, hoje se discute sobre humanização do parto, amores livres... mulheres assumem cargos importantes, presidência de países, nos Estados Unidos da América, mesmo em decadência ainda o grande imperialismo mundial, uma mulher negra é a vice presidente da república.

Mas precisamos marcar que todo avanço é parcial se seguimos no marco de uma sociedade que segue jogando milhões de mulheres e meninas na miséria. A vice negra dos Estados Unidos terminou por ser a primeira mulher negra a bombardear mulheres e crianças na Síria, mulheres em grandes posições de chefia contratam outras mulheres, pobres e em sua maioria negras, para realizar o trabalho doméstico em suas casas, pagando salários de fome. O empoderamento de algumas não impediu que Luanna fosse estuprada e morta por essa cadeia de violência que está intrinsicamente aderida ao capitalismo.

Precisamos nos ancorar nos pontos de apoio que encontramos na organização das mulheres, como quando as mulheres colocaram para correr um grupo de bolsonaristas reacionárias alentadas por Damares Alves e Clarissa Tercio que foram hostilizar a criança de 10 anos que teve que recorrer a um procedimento de aborto no Recife; ou a maré verde que tomou conta da Argentina e fez com que naquele país conquistássemos o direito a decidir sobre nossos próprios corpos; ou as milhares de mulheres que se reuniram para mostrar que o movimento de mulheres não iria aceitar pacificamente a presidência de Donald Trump e aqui no Brasil, quando em 2018 saímos as ruas no #EleNão para mostrar nosso repúdio a Bolsonaro. Nos apoiar nesta força sem ilusões reformistas em partidos como o PT, que não vacilou em rifar os direitos das mulheres em seus mais de 13 anos de governo em nome da governabilidade com setores conservadores.

Seguimos na luta por Luanna, Roberta, Kalyndra, Piu Piu, Fabiana.. mulheres vítimas da misoginia, da transfobia no estado de Pernambuco, desde onde escrevemos esta nota. Estado governado pelo PSB de Paulo Câmara, que usa de uma retórica reformista, mas não garante o mínimo necessário para garantia de vida digna para as mulheres e população LGBTQIA+. O CECH - Centro Estadual de Combate à Homofobia - nunca esteve tão sucateado, com denúncias de que não podem realizar atendimento por não possuir linha telefônica, computador e até mesmo equipe qualificada, responsabilidade direta do governador.

Neste sentido, afirmamos que precisamos fortalecer nossa luta, em cada local de trabalho e de estudo e também nas ruas, colocando que não vamos permitir que casos como o de Luanna sigam impunes, assim como batalhando por justiça por cada uma das mulheres vítimas da misoginia e do machismo ao mesmo tempo colocando de pé a necessidade de um plano de emergência contra a violência machista, que englobe a construção de casas abrigo, subsídio do estado para que mulheres e pessoas em situação de vulnerabilidade possam deixar suas casas com amparo estatal, assistência psicológica para vítimas de violência, legalização do aborto realizado pelo SUS; um plano sob controle de trabalhadores da saúde, assistentes sociais, pedagogos em conjunto com movimentos de mulheres e LGBTQIA+.

Nós do grupo de mulheres Pão e Rosas, nos solidarizamos com os familiares e amigos de Luanna que estão encampando o coletivo #Justiçaporluanna e os acompanhamos em sua luta, e colocamos a necessidade de batalhar para construir força material contra este sistema misógino patriarcal, pela vida plena de milhões de mulheres e meninas e dizemos que não vamos aceitar nem uma a menos!




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