×

CULTURA | Cultura e Revolução: Reflexões de Trotsky I

Havia muitos problemas, um pais que a séculos foi regido por uma monarquia não se transformaria num passe de mágica. Uma das grandes dificuldades era que tanto a monarquia como burguesia perderam seus postos de poder e o controle dos meios de produção. Mesmo assim o trabalhador russo continuava vivendo seu dia a dia a partir de costumes conservadores, que antes contribuíam para o maior lucro e dominação burguesa, ainda era muito forte o machismo, o racismo e a homofobia, na Rússia os Judeus sofriam uma grande perseguição, além de que as mulheres ainda continuavam majoritariamente exploradas com o trabalho doméstico. Como superar essa contradição?

Mateus CastorCientista Social (USP), professor e estudante de História

sexta-feira 29 de julho de 2016 | Edição do dia

Existem muitas definições do que se entende a partir de cultura. Dentro das universidades ainda ocorre um intenso debate entre as mais diversas correntes antropológicas e sociológicas a respeito do real significado de cultura, o que seria cultura e qual o melhor modo de estudá-la.

Não só no meio acadêmico, usamos muito o conceito em diversas situações, em conversas ou lemos alguma vez em livros, inclusive, no Brasil, temos um Ministério da Cultura, que para direita é extremamente inútil e serve apenas para jogar dinheiro fora, tal posição foi confirmada com a tentativa do ilegítimo governo Temer de acabar com o Ministério, felizmente não teve sucesso, foi derrotado pela ampla mobilização de artistas e da juventude que ocuparam diversos prédios da Cultura e outras instalações consolidando uma forte mobilização.

Não é de hoje que discutimos o que é cultura e divergimos sobre. Mas é de certa forma consenso que ela se manifesta a partir de costumes, hábitos, rituais, ritos, religiões, gostos, modos de se expressar, de se relacionar e ver o mundo. Ela foi posta em debate e disputa também na União Soviética, antes, durante e após os primeiros anos de revolução, lá começaram amplos debates a cerca dos hábitos e costumes dos trabalhadores e camponeses.

Para Trotsky, era urgente uma intensa transformação de tudo que compusesse a vida humana. Tal necessidade estava envolta pela destruição da guerra civil russa, onde vários exércitos imperialistas invadiram a Russia na tentativa de derrotar a revolução, uma maioria esmagadora da população ainda não sabia ler e nem escrever, não tinham noções básicas em ciências e viviam em base das mais heterogenias formas de se viver.

Havia muitos problemas, um pais que a séculos foi regido por uma monarquia não se transformaria num passe de mágica. Uma das grandes dificuldades era que tanto a monarquia como burguesia perderam seus postos de poder e o controle dos meios de produção. Mesmo assim o trabalhador russo continuava vivendo seu dia a dia a partir de costumes conservadores, que antes contribuíam para o maior lucro e dominação burguesa, ainda era muito forte o machismo, o racismo e a homofobia, na Rússia os Judeus sofriam uma grande perseguição, além de que as mulheres ainda continuavam majoritariamente exploradas com o trabalho doméstico. Como superar essa contradição?

O partido bolchevique quebrava a cabeça tentando pensar em ações concretas que transformassem a cultura que antes era ditada e moldada pela burguesia, ações que educassem o trabalhador a respeito de novos costumes e hábitos, pois diferentemente do momento anterior, em especial 1917, a transformação de tudo o que se entende por cultura é um processo mais demorado, pois em uma sociedade são extremamente resistentes a mudanças e são extremamente enraizados na população.

Temos o exemplo da classe trabalhadora Inglesa, que sempre teve dificuldades de se organizar e visar a tomada de poder. Por ser muito antiga, um dos locais onde ocorreram as grandes revoluções industriais, o trabalhador inglês tinha seus hábitos, costumes e aspirações extremamente enraizados e de origem diretamente da burguesia industrial e monarquia inglesa, simplificadamente sua vontade era dominar as etiquetas, a moda e a vida que um burguês tem, seus costumes e hábitos eram dados por essa dominação de classe, que num dos maiores impérios era extremamente consolidada e propagandeada.

Já o proletariado russo era jovem, vinha da migração do campo, era também extremamente religioso, machista e anti-semita, mas não passou por séculos de cristalização de cultura burguesa, como ocorreu com o proletariado inglês. Isso já era um ponto que fez com que os trabalhadores absorvessem as ideias revolucionárias e as colocasse em prática como nunca antes foi visto.

No século XXI a luta contra as opressões se desenvolveu consideravelmente, hoje em dia não podemos falar de revolução e de uma transformação radical de nossas vidas sem também nos colocarmos contra o machismo, o racismo, lgbtfobia, xenofobia, e todas as formas de preconceitos que impregnam a classe trabalhadora e atrapalham na sua organização contra o verdadeiro inimigo, a burguesia que lucra muito em cima disso. No século XX também.

Trotsky, em 1923 escreve Modos de Vida, 2 anos após a Guerra Civil Russa, ele da continuidade a uma importante reflexão sobre como superar o conservadorismo, as opressões, hábitos, costumes, analfabetismo, e outros traços que impregnavam os trabalhadores e oprimidos. Mas isso deixarei para o próximo texto.


Temas

cultura    Trotsky    Teoria



Comentários

Deixar Comentário


Destacados del día

Últimas noticias