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CIRO GOMES | Ciro Gomes no Roda Viva: dureza com greves operárias, pagamento em dia aos capitalistas

Em entrevista ao programa Roda Viva nessa segunda-feira, 28, o candidato à presidência Ciro Gomes (PDT) deixou mais uma vez claro porque, apesar de sua retórica em defesa do "povo", não apresenta um programa que o coloque como uma alternativa para os trabalhadores. Veja um pouco como foi a entrevista.

terça-feira 29 de maio de 2018 | Edição do dia

Muitos hoje se voltam para a candidatura de Ciro com simpatia, procurando no candidato do PDT uma alternativa eleitoral por entender sua candidatura como uma “possibilidade à esquerda”. Pela sua retórica nacionalista, suas críticas aos grandes bancos e suas declarações de que quer governar “para o povo brasileiro”, Ciro pode parecer à primeira vista um defensor dos trabalhadores e de um governo que se volte às necessidades dos mais pobres. Mas, para além dessa retórica, na qual ele é muito habilidoso, é necessário ver qual programa ele apresenta e sua trajetória política até aqui. Queremos aqui apresentar, por meio das suas próprias falas na entrevista do Roda Viva, porque consideramos um equívoco ver em Ciro uma opção política para se opor aos grandes empresários ou à direita.

Por trás de toda a lógica apresentada pelo candidato do PDT está a tentativa de se mostrar como um “candidato viável” para o sistema vigente. Isso quer dizer que toda a estrutura podre capitalista brasileira deverá permanecer intacta, e sua intenção é tocar apenas no que for possível mantendo intacto esse edifício para melhorar o “desenvolvimento nacional” ou garantir alguma mínima concessão. Contudo, se no período de desenvolvimento excepcional dos anos de lulismo (no qual Ciro atuou como nada menos que Ministro da Integração Nacional), isso significava garantir os lucros recordistas e exorbitantes de banqueiros, empresários e agronegócio, e mesmo assim dar uma ou outra migalha ao povo, em tempos de crise capitalista não passa de pura demagogia, pois a preservação dos lucros capitalistas implica em ataques diretos aos direitos sociais. Para entender melhor essa ideia, veja esse texto.

Hoje, para preservar seus lucros, como demonstra o movimento de direita capitaneado pelas patronais do transporte que utilizou os caminhoneiros para defender seus interesses econômicos, diferentes grupos capitalistas estão em disputa para ver quem consegue pilhar os fundos públicos para seus interesses. Ciro Gomes falou disso em sua entrevista, denunciando que Temer entregou R$ 14 bilhões nas mãos desses empresários. Contudo, ele deixa claro que não há nenhuma intenção em seu governo de reverter as privatizações já feitas, reestatizando a Petrobras, e muito menos de mudar seu esquema de gestão, que hoje é uma moeda de troca e um ninho de armar esquemas de corrupção dos governos de plantão.

Ciro será “responsável” para pagar em dia o maior roubo dos capitalistas ao povo

Não é à toa que as respostas de Ciro girem em torno das questões “técnicas”. Por trás de números e dados, se esconde o fundamental: todos os esquemas de roubo praticados pelos capitalistas contra os trabalhadores se mantém intactos. Isso se expressou com muita força em algumas frases de Ciro.
Respondendo a André Perfeito, o “representante do mercado” (leia-se, do capital financeiro) na bancada de entrevistadores, Ciro deu um recado claro aos capitalistas: “Não sendo eu nenhum aventureiro que chegou ontem na praça, eu posso ser julgado pela minha prática, e é isso que eu peço. (...) E tenho uma história. Qual é minha história sob esse ponto específico? Nenhum dia de déficit. Ex-prefeito da quinta maior cidade brasileira, ex-governador do oitavo estado brasileiro, ex-ministro da Fazenda desta República sofrida, e não tenho um dia de déficit. Sabe quantos políticos podem dizer isso? Só eu no Brasil. E é assim que eu vou ser julgado? Sabe como é que eu fiz quando fui governador do Ceará? Tinha 36,5% de receita corrente líquida livres para investimento; fui ao mercado, e comprei 100% da dívida do Ceará com vinte, quinze anos de antecedência no investimento. Sou eu que sou irresponsável?”. Trocando em miúdos, Ciro está dizendo aos capitalistas que o maior mecanismo de roubo do fundo público, do dinheiro que deveria ir para direitos sociais, que é a dívida pública, está totalmente garantido. Que a chamada “responsabilidade fiscal”, ou seja, cortar custos em investimentos sociais para garantir dinheiro aos capitalistas detentores dos títulos da dívida, está totalmente assegurada. Os 36,5% que da receita líquida que deveriam ter ido para saúde, transporte, moradia e educação foram para “comprar a dívida”, ou seja, diretamente para o bolso dos capitalistas.

Ele segue explicando sua “responsabilidade” com o “mercado”, em primeiro lugar dizendo ele mesmo com todas as letras qual o crime de saque dos capitalistas aos cofres públicos (muito mais do que todos os esquemas de corrupção juntos e multiplicados por dez): “50%, metade do gasto público brasileiro é despesa financeira. A metade do orçamento brasileiro, de tudo que se arrecada de imposto, etc. é despesa financeira: juros e rolagem da dívida.” E o próprio André Perfeito concorda: “segundo os dados do FMI, 46% das receitas são gastas com juros no Brasil”. E frente a esse crime brutal, que coloca o país subordinado a especuladores bilionários, Ciro deixa claro para todos, que será conivente: “Eu sei que eu sou muito responsável, porque eu sei que a dívida pública corresponde basicamente à poupança da sociedade (...) eu sei do que eu tô tratando. Fui lá e comprei a dívida do Ceará, não dei calote não, comprei a dívida do Ceará que é o que eu pretendo fazer com a do Brasil”. Só que a dívida não é a “poupança da sociedade”, mas sim a poupança dos capitalistas que engordam seus bolsos com o roubo do orçamento público. E o que Ciro está dizendo é que pretende pagar religiosamente por esse roubo. Ele critica o pagamento indefinido de juros, mas em um momento de crise profunda no país, com corte de gastos em todas as áreas sociais, com ataques a direitos e que a burguesia quer acabar com a previdência, Ciro diz que pretende poupar trilhões de dólares para comprar os títulos da dívida enriquecendo os capitalistas. Impossível ser mais claro para dizer que seu governo é para os ricos. Em outro momento ainda afirma que é vítima de “uma boataria de calote” e se gaba “sou campeão de superávit primário” (traduzindo: cortar dos investimentos sociais para guardar dinheiro para dar aos capitalistas).

Saiba mais: http://www.esquerdadiario.com.br/Nao-pagar-a-divida-publica-e-a-unica-resposta-a-crise-do-pais

Para que não reste nenhuma dúvida, Ciro arremata: “O problema no Brasil não é o tamanho da dívida, é o criminoso prazo que tá se impondo ao Brasil”. Uma dívida que ele mesmo denuncia, desmascarando dados oficiais do governo que camuflam o montante, é de 5,2 trilhões de reais. Esse é o tanto do dinheiro público que ele quer usar para comprar a dívida. Imagine-se a falta que esse dinheiro fará em todas as áreas sociais para os trabalhadores e a população pobre. A postura de Ciro não é novidade, basta ver que o “Manifesto Unidade Para Reconstruir o Brasil”, que o PDT assina junto com PSOL, PT, PCdoB e PSB tem como um de seus pontos o respeito à “responsabilidade fiscal”.

Mão dura com as greves operárias

Ciro relata e assume o papel para si de ter sido responsável por desmontar a greve dos petroleiros de 1994, quando era ministro no governo de Itamar Franco, sentando para conversar com o burocrata sindical Vicentinho, então presidente da CUT, e o presidente da FUP (Federação Única dos Petroleiros). Orgulhosamente, diz como desmontou uma luta operária comemorando com um chopp em meio aos burocratas sindicais. Ele mesmo fala como os petroleiros “apanharam pra cacete” e “foram muito mal tratados” do “Fernando Henrique pra cá”. Parte fundamental disso se deve ao papel traidor das lideranças que junto com Ciro sentaram para desmobilizar a sua greve e da qual ele se orgulha tanto.

Agora, na oposição e fazendo demagogia eleitoral, Ciro diz que apoia a greve dos petroleiros marcada para essa quarta-feira porque esta se coloca contra a política de preços de Pedro Parente (PSDB) na presidência da Petrobras. Mas não há motivo para se iludir e achar que o lado de Ciro é o dos trabalhadores. Como ele colocou, o presidenciável do PDT segue um “manual”: “Em greves dessa natureza, com esse potencial explosivo, você endurece e aí senta pra negociar”.

Ou seja, em um momento de crise, no qual os conflitos operários têm um grande potencial “explosivo” e se colocam frontalmente contra os ataques aos direitos dos trabalhadores (vide a vitoriosa greve dos professores municipais em SP), está muito claro que um eventual governo de Ciro teria “mão de ferro” para reprimir duramente as lutas dos trabalhadores. Ele complementa ao ser questionado sobre o “endurecimento”, afirmando que “o Brasil precisa restaurar a autoridade”. Autoridade para manter os pagamentos religiosos aos capitalistas em tempos de crise é sinônimo de ataques impiedosos aos que se levantem por direitos sociais.

De mãos dadas com o papa, muita demagogia para fugir do tema do aborto e das drogas

Depois de defender sua política de alianças que é “mais do mesmo” da governabilidade com alianças com todos os setores da direita, como os golpistas do PP, dizendo que “não é candidato a madre teresa”, Ciro foi questionado por temas democráticos fundamentais e conhecidos por serem polêmicos.

Em primeiro lugar, foi questionado sobre políticas públicas para combater a violência contra as mulheres e sobre a legalização do aborto, temas fundamentais em que o Brasil tem níveis escandalosos e recordistas tanto de feminicídios quanto de mulheres mortas em abortos clandestinos. De saída, Ciro mostra como a vida das mulheres é uma questão “moral” para ele ao dizer que não é “candidato a guru de costumes” mas a “chefe do Estado brasileiro”, atribuindo sua responsabilidade como a de “promover o debate” chamando “todos os grupos de opinião interessados no assunto”. Ou seja, uma forma de ficar em cima do muro e dizer que as mulheres que morrem aos milhares por abortos clandestinos terão (supostamente) o mesmo direito de opinião dos grupos fundamentalistas que querem lhes proibir o direito elementar de decidirem sobre seu próprio corpo. Não seria, para Ciro, papel do “estadista” fazer todos os esforços para estancar essa carnificina que assassina cotidianamente as mulheres pobres que não possuem dinheiro e condições de fazerem abortos clandestinos em segurança. Melhor é se poupar para ganhar votos do que se pronunciar em defesa do direito à vida as mulheres.

Sobre a questão da legalização das drogas, Ciro mostra como também está disposto apenas a fazer demagogia e usar o Estado para abrir o caminho à propaganda conservadora das instituições religiosas mais reacionárias. Assim, quer ter como interlocutor privilegiado sobre a legalização ninguém menos do que o papa. Em um país com centenas de milhares de encarcerados por conta do tráfico, com outras centenas nas mãos do tráfico, com milhares de mortes pela política criminosa de guerra às drogas, Ciro Gomes quer tratar a questão da legalização como um problema moral e religioso. Sua posição é até mais conservadora e demagógica do que aquela que apresentava o PT, que antes da eleição defendia esses direitos mas no governo mostrou como não moveu uma vírgula por essas questões que afetam drasticamente a vida da juventude negra e das mulheres; pelo contrário, apenas retrocederam com uma lei das drogas que ajudou a encarcerar em massa e com um acordo Brasil-Vaticano que tirou a educação sexual das escolas.

Ciro diz que não quer “empurrar goela abaixo”, mas em oposição a isso quer chamar o papa para debater a questão, e não a juventude negra que morre cotidianamente massacrada pela polícia e pelo tráfico nas favelas e periferias.

Essas foram apenas algumas das colocações de Ciro Gomes no Roda Viva que deixam claríssimo porque ele está longe de ser uma opção para os trabalhadores, a juventude, os negros, mulheres, LGBTs. Longe de usar a eleição como ponto de apoio para qualquer processo de luta real por mudanças que só poderá ocorrer enfrentando esse regime apodrecido e corrupto e o fundamento que o sustenta: a propriedade privada dos capitalistas, Ciro mostra que o seu plano é se mostrar ao “mercado”, a setores conservadores, aos políticos dos partidos patronais (como Marina Silva, a quem tece elogios rasgados de olho numa aliança de segundo turno) que é um ótimo candidato a gerente desse Estado, mantendo intocada a estrutura social que nos garante dia a dia a miséria e a exploração cotidiana, e que em meio a uma crise econômica internacional só poderá se intensificar.




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