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CALOURADA NA USP | Calourada da História-USP debate o centenário de Paulo Freire e seu legado para hoje

No primeiro dia da calourada do curso de História da USP foi organizada uma live sobre o centenário de Paulo Freire, e também seu legado e sua importância para a educação hoje. Participaram Lisete Arelaro, professora da Faculdade de Educação da USP, Taís Araújo, mestra em História Social e doutoranda em educação e Lucas Marcelino, professor da Escola Tamuya de Formação Popular.

João SallesEstudante de História da Universidade de São Paulo - USP

quarta-feira 14 de abril de 2021 | Edição do dia

(Foto: print da live)

A mesa foi aberta com a fala de Taís, que fez uma recapitulação do trabalho de Paulo Freire em estados do Nordeste antes do golpe de 1964, e destacando as Quarenta Horas de Angicos, onde o educador, através de um novo método, conseguiu alfabetizar um grupo de 300 trabalhadores em 40 dias. A partir disso, ressaltou algumas das visões de Paulo Freire, como a substituição dos professores por mediadores de debate, que questionam o aprendizado enquanto uma passagem de conhecimento do professor para os alunos.

Lucas seguiu falando o sistema produtivista que se coloca hoje nas escolas, com diversas provas que supostamente serviriam para medir o ensino, como Prova Brasil e Saresp, mas que funcionam para pressionar os professores, servindo também para definir alocação de verbas nas escolas, e que junto a isso vem um processo de mercantilização da educação, com a entrada de grupos privados no mercado educacional. Mas que apesar disso, as diretrizes da educação básica no Brasil são influenciadas por Paulo Freire, pois permitem certa liberdade ao professor em relação ao currículo. Colocou também sobre a educação libertadora, que teria o papel de formar sujeitos críticos e não apenas transmitir conteúdo.

E a professora Lisete encerrou essa primeira rodada de falas discutindo sobre a contradição que existe entre a garantia legal do pleito das vagas nas instituições de ensino superior públicas e o filtro social do vestibular. Também como o legado de Paulo Freire na educação tem sido alvo constante de ataques por parte do governo Bolsonaro, justamente que esse legado enxerga a educação enquanto um ato político e um aspecto integral da visão de mundo. Em um cenário de calamidade com mais de 350 mil mortos pela pandemia e uma naturalização da desigualdade e da morte pelo governo é fundamental assumir um compromisso com a transformação do mundo e que vê na educação aspecto fundamental disso.

Passando para uma breve contextualização da obra de Paulo Freire no contexto do desenvolvimento do pensamento "Nacional-Popular" e da participação política dentro da República burguesa dos analfabetos a partir de exercerem seu direito cidadão ao voto, necessitando da alfabetização para tal e conclui com a ideia de que o processo de ensino deve estar ligado ao contexto social dos educandos e educadores, definindo o conhecimento como uma totalidade interdisciplinar e que está presente nos mais diversos espaços da sociedade civil, para além das escolas e da reprodução da lógica "bancária" neoliberal de disciplina das mentes e corpos.

Após as falas, foram feitas perguntas e intervenções do chat, que abriram um debate. Foram abordados temas como a Educação a Distância (EaD), a capacidade da educação de mudar o mundo e o histórico golpista e autoritário do Brasil, e o impacto disso na educação brasileira.

Partindo deste debate, há que se colocar como os avanços e retrocessos na educação são profundamente ligados à situação política e ao modelo econômico do país. Neste sentido, o avanço dos ataques à educação, que se dão pelo aumento do seu caráter “bancário”, ampliação do EaD e da mercantilização, simbolizados na Reforma do Ensino Médio, se intensificam após o golpe de 2016, mesmo que já viessem desde os próprios governos petistas, como parte do modelo neoliberal que foi aprofundado, de um país cada vez mais dependente das exportações de commodities e do setor de serviços.

Por isto, é fundamental lutar contra esses ataques à educação como parte da luta contra o regime do golpe no Brasil, se opondo energicamente ao avanço do EaD como a professora Lisete fez no debate, ou contra os cortes de orçamento, por exemplo. Ao mesmo tempo, lutando contra o modelo de educação bancária e defendendo uma educação que forme pessoas que sejam sujeitos críticos da realidade.

Ao mesmo tempo, ver que não é a educação, por si, que irá mudar o mundo. Por ser moldada, em grande parte, pelas mudanças da realidade política e econômica, a verdadeira transformação da educação não pode vir sem a mudança desta realidade. Uma questão que se levantou no debate foi se é possível construir uma educação libertadora dentro do capitalismo.

O sistema capitalista sempre será uma força que empurrará a educação contra o princípio de formar sujeitos. Os elementos progressistas que ainda hoje resistem no modelo educacional brasileiro são fruto de fortes lutas dos professores, estudantes e movimentos populares em geral, que funcionam como contra-pressão às visões da burguesia. No entanto, se não houver um avanço de derrubar o capitalismo, estes elementos tendem a se tornarem cada vez mais minoritários, e os elementos reacionários, bastante funcionais a um sistema que torna a educação um espaço de acumulação de capital, tendem a se fortalecer.

Para aprofundar estes debates, com foco sobre o papel da universidade dentro do capitalismo, a juventude Faísca está organizando uma atividade de apresentação nesta quarta-feira (14/04), às 16h, com o tema “A USP é para todos? Uma visão marxista sobre gênero, raça e classe na universidade”, e que faz parte da calourada da USP. Contará com a participação de Letícia Parks e de um trabalhador da Ford de Taubaté. Estão todos convidados!




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