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ELEIÇÕES ARGENTINAS | As eleições primárias e a aposta da esquerda argentina

Um breve balanço sobre a campanha eleitoral paras as eleições primárias da argentina.

Fernando ScolnikBuenos Aires | @FernandoScolnik

sexta-feira 9 de agosto de 2019 | Edição do dia

A poucas horas do final da campanha eleitoral para as PASO, fizemos um balanço provisório do que foi feito até aqui e suas implicações para o futuro próximo.
O turbilhão de notícias, o rumo da campanha e a sensação de estabilidade que, desde o oficialismo, buscaram criar artificialmente durante as últimas semanas, exigem que pensemos antes de votar no que está em jogo, visando mais além das urnas do próximo domingo.

Os principais bloqueios políticos apontaram não apenas à polarização, mas também que nessas PASO se vote com a sensação do presente, escondendo o que está por vir.

No caso do macrismo, pelas mãos do FMI e altas taxas de juros, desde outubro ou novembro, buscam manter artificialmente o dolar em “modo eleitoral” (ainda que com um certo nervosismo nos últimos dias por causa da incerteza nas votações e pelos efeitos da economia internacional). Com essa política e alguns pequenos incentivos financeiros ao consumo, querem instalar a ideia falsa de que “o pior da crise já passou”, para então continuar os ajustes caso ganhem as eleições. Para Durán Barban e sua equipe este ano, o ideal seria recriar a vitória de 2015, ainda que para alcançar este milagre, depois de tanta crise, devem apontar mais ao rechaço ao kirchnerismo que para suas próprias adesões. Por isso a corrupção e a obra pública têm uma preponderância na campanha do Juntos pela Mudança.
Por outro lado, a Frente de Todos busca articular uma maioria eleitoral em base no enorme rechaço social que geraram há quase quatro anos de políticas de ajuste e entrega. Sob a consigna de que “nada pior que Macri pode nos acontecer”, justificam qualquer aliança e ocultamento das implicações que seu programa governamental.

Quanto às terceiras forças vinculadas às classes dominantes, queremos apenas salientar que a candidatura de Roberto Lavagna nada mais fez do que deflacionar e a de José Luis Espert nunca foi especulado que ele tivesse a chance de disputar. Além deste domingo, ambos os espaços podem tender a ser reduzidos já em outubro.

Os dramas do futuro, os enganos do presente

Como de costume, os partidos do regime disputam as eleições baseados em demagogia. Das promessas de "revolução salarial e produtiva" às de "pobreza zero", entre muitas outras, as eleições das últimas décadas foram caracterizadas por serem atormentadas pela enganação contra as grandes maiorias.

Neste caso, ambos os espaços majoritários concordam em esconder do eleitorado o sofrimento brutal que o espera sob seus governos hipotéticos se a economia seguir (como propõem) vinculada ao infernal Fundo Monetário Internacional.

Quanto ao macrismo, entretanto, uma parte da verdade é filtrada quando este fala com os poderosos, pros quais ele promete que, se ganhar, vai “fazer o mesmo, porém mais rapidamente”. Ou seja, vai acelerar os ajustes e reformas estruturais que o FMI exige. Serão inúmeros ataques aos salários, aposentadoria, saúde, educação... Além de mais precarização do trabalho. Sangue, suor e lágrimas serão derramados pelo povo para pagar uma dívida ilegal e ilegítima, hipotecando o futuro de gerações.

Sobre a Frente de Todos, para desmascarar sua demagogia de campanha que promete um futuro melhor, talvez o melhor seja rever os giros do kirchnerismo dos últimos meses, para que a memória ajude a desvendar o sentido da flecha a qual aponta sua política.

O ano começou para este espaço apoiando governadores da direita peronista como Omar Perotti e Juan Schiaretti (grande amigo de Macri) entre outros, nas eleições adiantadas, para terminar a operação com Cristina Kirchner nomeando Alberto Fernández como candidato a presidente.

Aos governadores, a ex-presidenta Cristina Kirchner a um homem com um passado de funcionário menemista, legislador eleito nas listas de Domingo Cavallo, amigo de corporações como as patronais do campo e Clarín, que perambulou através do massismo e do randazzismo depois de romper com o kirchnerismo, e agora retornou com o CFK como candidato a presidente.

Esta opção da ex-presidenta foi a que acabou abrindo caminho para uma Frente de Todos... mas todos. Assim, à aliança somou-se Sergio Massa, para terminar de conformar um espaço com legisladores que votaram quase todas as leis de Macri, os burocratas da CGT que deixaram tudo passar sem luta e governadores que aplicam tantos ajustes quanto o Cambiemos.

A foto de encerramento de campanha, desta quarta-feira em Rosario, com outros dirigentes como Juan Manzur, inimigo das mulheres, Gildo Insfrán, responsável político por assassinatos de membros de comunidades da região, e Gustavo Bordet, o amiguinho dos agrotóxicos, completam o quadro.

Nem parece que com esta “equipe” vão cumprir as promessas de manter-se contra o FMI para poder combater a pobreza e o desemprego, aumentar as aposentadorias e os salários ou que vão dar medicamentos a todos. Se a isso somamos a desvalorização já anunciada por Alberto Fernández, fica ainda mais claro.

Porém, é claro que deve ser “pior que Macri”. A operação “mal menor”, outra vez na história argentina, está à tona. Uma das últimas experiencias deste tipo terminou na terrível crise de 2001, depois de que, sob estes mesmos argumentos, foi chamado a votar na De la Rúa e Chacho Álvarez para colocar fim no menemismo.

Apenas votando na esquerda que começa a resistência aos próximos ataques do FMI

A esquerda é o único espaço político que nesta campanha eleitoral disse a verdade para todos os trabalhadores, mulheres e para a juventude.

Não é com “reformas estruturais” para “modernizarmos”, nem com esta tal de “renegociação dura” com o FMI que virá algo bom para o povo trabalhador.
Para os próximos quatro anos, a Argentina terá que pagar comprometidamente a dívida de mais de 40 mil milhões de dólares anuais. Este é um valor exorbitante e impagável, cujo prazo de pagamento o FMI aceitará renegociar apenas em troca da imposição de mais ataques contra o povo.

Depois das promessas de campanha, o que vem não é o que anunciam para ganhar votos, e sim um cenário mais parecido com o da Grécia e de outros países que passara, por grandes crises sob os planos do capital financeiro internacional. Inclusive, neste país europeu, os ataques não foram aplicados por agentes diretos da “troika”, e sim por um governo de “esquerda”, amigo da Cristina Kirchner, que havia prometido fazer o contrário do que no final acabou fazendo.

Por essa razão, votar em qualquer alternativa que de uma forma ou de outra siga com o FMI, é atrasar e debilitar uma perspectiva de luta que busque evitar que outra vez essa história termine em um saque contra o povo, como na ditadura, em 89-91 e em 2001.

Apenas o voto na Frente de Esquerda e dos Trabalhadores Unidade é um voto de resistência a esses planos e uma mensagem aos poderosos. Uma demonstração de que somos centenas de milhares, ou mais, que nos preparamos desde agora para que sejam os capitalistas que paguem pela crise. Não fornecemos um único voto que dê força àqueles que nos atacarão amanhã.

Fortalecer a FIT-U nestas eleições é dar força aos que se preparam para o que virá e, mais cedo ou mais tarde, se depararão com o descontentamento de milhões que hoje ainda confiam em outras variantes, ou votam nelas como “mal menor”, mas que amanhã se verão afetados pelos novos ataques, dando lugar a novas experiências políticas. Se o Juntos pela Mudança ganha, talvez enfrentemos desde o próximo 10 de dezembro um governo muito debilitado. Porém, se ganha o peronismo, abre-se a possibilidade histórica de uma nova experiência com esta força no poder, a qual dará lugar ao surgimento de novos fenômenos políticos e da luta de classes.

A esquerda, que ampliou sua unidade, colocou nessa campanha uma ideia clara: inverter as prioridades. Não estamos dispostos a aceitar pagar uma dívida ilegal e ilegítima com a fome dos nossos aposentados, hipotecando o futuro das nossas crianças, aumentando a pobreza, deteriorando mais ainda a vida, a saúde e a educação. Nossas vidas valem mais que suas ganâncias. #NoAlFMI.

Com essas ideias, articularas ao redor de um programa anticapitalista e revolucionário, Nicolás del Caño e mais cem candidatos andaram pelo país. Foi chave o papel dos milhares de militantes que levaram estas ideias a cada canto do país, em uma campanha feita a plenos pulmões e desde baixo, ao contrário deles, que são financiados por empresários para os quais pretendem governar.

Como disse Nicolás del Caño no ato de encerramento da campanha, nesta quarta-feira, estas propostas despertaram uma grande simpatia, especialmente na juventude, que é a que mais sobre com o desemprego, a precarização do trabalho ou as dificuldades para estudar; entre as mulheres, lembrando que a FIT-U é a única coligação política que levanta o direito ao aborto legal, seguro e gratuito e as demandas das mulheres trabalhadoras; entre muitos trabalhadores sindicalizados que querem se organizar para expulsar a burocracia sindical.

Para enfrentar o que está por vir precisamos de um programa anticapitalista, mas também da força de luta necessária para que estas propostas se tornem realidade. Por isso milhares de companheiros e companheiras levam estas ideias a todos os lugares, mostrando o programa e a força necessária para a batalha deste domingo, para a de outubro e, sobretudo, para dar a batalha nas ruas, nos espaços de trabalho e estudo, para girar a roda da história e que desta vez sejam os capitalistas que paguem pela crise. É para isso que nos preparamos.




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