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X CONFERÊNCIA DA FRAÇÃO TROTSKISTA | Antes e depois do Brexit no Reino Unido

No marco da discussão internacional, a conferência explorou o significado do referendo que definiu a saída do Reino Unido da União Europeia. Entrevistamos Alejandra Ríos, impulsionadora do Left Voice no Reino Unido.

terça-feira 16 de agosto de 2016 | Edição do dia

Poderia comentar que fenômenos políticos poderia estar expressando o Brexit?

A saída do Reino Unido (é dizer Inglaterra, Gales, Escócia e Irlanda do Norte) estava completamente por fora das previsões, não somente dos cientistas políticos e agências de pesquisas e sim das formações de todo o arco político, desde o partido conservador, passando pelo xenófobo UKIP e incluindo os partidos e alianças de esquerda. Falava-se de que o remain (ficar) iria a ganhar por uma margem muito pequena, porém não do triunfo do Brexit (saída). O impensável se converteu em realidade; por isso distintos analistas britânicos vem colocando um antes e depois do Brexit já que foi obrigado a uma recomposição política e gerado giros inesperados em "ambos lados" do referendo.

O primeiro ministro impulsionador do referendo, David Cameron, se viu obrigado a renunciar aos catorze meses de sua eleição, já que uma de suas principais promessas da campanha eleitoral de 2015 havia sido a convocatória a um referendo sobre o pertencimento ou não do Reino Unido a União Europeia (UE) para "apaziguar" a ala euroescéptica dentro do seu próprio partido. Sem embargo, a jogada se saiu mal. Porém as consequências do Brexit vão mais além do que as aspirações políticas pessoais do Cameron e as de seu próprio partido sendo que também aprofundou a crise do Partido Laborismo, o que toma forma na disputa pela condução partidária.

O Brexit pôs em evidência os nefastos efeitos da desindustralização neoliberal que começõu com o thatcherismo, que deixou uma enorme massa de desempregados, em alguns casos com duas gerações por fora do mercado de trabalho.

Que setores votaram pelo Brexit?

É difícil falar de um voto "de classe", no sentido de dizer que foi um voto nitidamente operário. É interessante analisar o exemplo de Boston, um povo na região de Lincolnshire em que o voto euroescéptico alcançou 75%, já que se trata de uma região próspera economicamente, com importantes plantas frigoríficas ou de embalagem ligadas a agroindústria. Esta zona veio nos últimos anos em um enorme fluxo de trabalhadores da UE, segundo números do censo oficial de 2011, 13% da população havia nascido em outros países da UE, em sua maioria no leste europeu que chegaram próximo de 2004. Sem embargo, esta nova força de trabalho não "retira" trabalho dos locais, já que o desemprego no povo é mais baixo que a média: 4,4% em comparação com 5,2%a nível nacional. Em um sentido geral, podemos dizer que as pessoas não se movimentam regiões em que não há emprego e em muitos casos mobilidade laboral traz associada a mudanças estruturais na economia e geram uma reativação da economia. Por outro lado, o aumento demográfico colocou pressão no serviços públicos sanitários , escolares, e de estradas que veem a falta de inversão por parte dos governos de turno. Poderíamos indicar que, no caso de Boston, o voto ao Brexit combina um rechaço aos estrangeiros porém não porque geram desemprego e sim porque afetam os serviços.

Por outro lado, em regiões desindustrializadas em áreas ao redor de Manchester, berço da revolução industrial, Sheffield, centro da indústria de aço e em muitos ex povos mineiros, que apresentam altos índices de desemprego com enormes linhas de trabalhadores deixados por fora da economia e esquecidos pelos partidos tradicionais, o voto ao Brexit é um rechaço a sua situação de empobrecimento. "Os Esquecidos" do neoliberalismo foram outrora o centro do desenvolvimento imperialista a partir da revolução industrial. Estes setores de trabalhadores não economicamente ativos tem sido historicamente votantes do Partido Laborista que ao ver-se deslocado giram para saídas chauvinistas e xenófobas como o UKIP.

O panorama é algo diferente se olharmos Londres ou outros grandes centros urbanos e Escócia votaram majoritariamente por "ficar". Londres é uma cidade com significativo número de trabalhadores ao redor dos serviços, educação, saúde, etc.; em alguns distritos com um alto componente de imigrantes, a saída pela permanência na UE chegou ao 79%. Estas cifras indicam que a presença de imigrantes não gera por si a xenofobia, algo que se evidenciou também com a eleição de um alcade de origem muçulmana, Sadiq Khan, para a cidade de Londres, uma das principais capitais ocidentais. O voto por "ficar" em Londres é o de setores da população economicamente ativos.

Que nos diz o Brexit das tensões nacionais no Reino Unido?

É interessante que na Escócia, onde o referendo pela Independência deste país do Reino Unido, perdeu por pouca diferença, o voto por "ficar" na UE alcançou 62%, o que chegou a reativar a reclamação das forças nacionalistas escocesas por um segundo referendo sobre sua independência.

No país de Gales e na Irlanda do Norte, o voto por permanecer na UE também ultrapassou o Brexit; é dizer, que em países com demandas independentistas o que estava em jogo era também a relação com Westminister, o palácio do governo e em certo modo reativou a relação de Inglaterra com o resto dos membros do Reino Unido.

Como se posicionou a esquerda?

Lamentavelmente, a esquerda entrou nas regras do jogo impostas pelo chamado de Cameron e se dividiu ao redor das posições apresentadas pelos partidos tradicionais da burguesia e UKIP. Por um lado estão as formações trotskistas mais conhecidas como Socialist Workers’s Party e o Socialist Party, que de maneira independente, é dizer sem formar um polo, chamaram por votar pelo Brexit. E se bem é certo que trataram-se de diferenciar-se impulsionando o Lexit (união da "left" - esquerda - "exit" - saída) o certo é que a bandeira euroescéptica esteve sempre encabeçada pelo seu exlíder Nigel Farage da formação xenófoba UKIP. Estes partidos de esquerda justificaram sua posição com o argumento de que o Brexit significaria um grande golpe para o governo conservador de Cameron e abriria uma possibilidade dos trabalhadores e da população pobre afetada pelos cortes que eventualmente poderiam levar inclusive a Jeremy Corbyn, o líder do laborismo, ao governo. Obviamente, este prognóstico não se deu. É muito difícil que, produto de uma vitória dos setores mais de direita pudesse surgir uma onda de lutas. Além disso, frente a política antiimigrante que vem levando adiante os governos europeus, um triunfo do Brexit evidenciou mais as tendências chauvinistas.

No outro extremo do arco político da esquerda, a formação Left Union, da qual o cinematografista Ken Loach é um dos seus principais referentes, chamou a votar por um voto crítico ao remain em uma lógica de mal menor, argumentando que se ganhasse Brexit abriria uma situação mais reacionária.

O certo é que tanto no campo do Brexit (sair) como do remain (ficar) havia setores da classe dominante. No campo pela permanência se localizavam muitos ativistas que realizaram atividades pelos direitos dos imigrantes e dos refugiados, que expressava uma sensibilidade distinta. Sem embargo, não se pode deixar a bandeira da defesa dos refugiados no campo encabeçado por Cameron e outras forças burguesas.

A esquerda britânica perdeu uma grande oportunidade já que se podia ter feito uma campanha que se localizava independente de ambos os lados da classe dominante, como por exemplo o chamado a um boicote ativo, que denunciava tanto o populismo da direita e as propostas xenófobas do UKIP como as políticas antiimigrantes levadas adiante pelos governos da União Europeia, como o evidencia as milhares de pessoas que morrem tentando chegar a europa. Foi uma grande oportunidade para apresentar uma alternativa independente que denunciasse as instituições da União Europeia e ao governo nacional que agrupou os milhares que vem se manifestando nos atos contra os ajustes, pelos direitos dos imigrantes e defesa dos serviços públicos. Os trabalhadores e os setores populares afetados pelas políticas do partido conservador não tem porque pronunciasse em um referendo que foi chamado por Cameron para resolver sua crise interna.

Qual a situação do Partido Laborista?

A situação mais dinâmica dentro desta formação é o novo influxo de jovens reunidos ao redor da iniciativa Momentum, uma plataforma de apoio a candidatura de Jeremy Corbyn e que se propõe a transformar o Laborismo em uma organização mais aberta na qual os membros de base tenham mais poder nas políticas e orientações partidárias. Calcular a quantidade de membros exatos é difícil, porém devemos ter em conta que quando se anunciou que Corbyn era um dos candidatos para a direção do partido de setembro de 2015, mais de 100.000 pessoas se inscreveram como simpatizantes do partido para poder votar por Corbyn na corrida pela direção. No primeiro turno, o veterano esquerdista obteve 59,5% dos votos, número que aumentou ao contabilizar-se a segunda opção de voto, já que é um sistema de voto transferível.

É bem ala a direta do laborismo, começou sua campanha anti-corbyn nem bem se deu a conhecer os resultados da eleição pela condução da formação, perto do triunfo do Brexit a mesma escalou um maior nível de tensão. O partido atravessa uma situação que podemos definir de "guerra civil" como se viu próximo a renúncia de mais de um terço do gabinete conduzido por Corbyn, Uma ala do partido desafiou seu rol como líder e se convocaram novas eleições para a direção que durariam entre agosto e setembro de 2016. O interessante é que o comitênacional do Partido, NEC em inglês, decidiu que os simpatizantes que haviam se inscrito em setembro de 2015 não poderiam votar e que se quisessem participar nas próximas internas teriam que voltar a se registrar em um prazo de 48 horas e pagar uma soma de 25 libras esterlinas (uns 35 dolláres aproximadamente). Segundo os números oficiais do Partido Laborista 180.000 simpatizantes vão todos a votar por Corbyn, se estima que uma boa parte sim o fará.

Linhas deste novo influxo de simpatizantes nutre a Momentum e participa em marcha contra os ajustes, aulas públicas, mobilizações em defesa do imigrantes, plataformas contra a guerra, agrupações estudantis contra a orientação pró-mercado das universidades e iniciativas como Black Lives Matters no Reino Unido e outras ações de ativistas. Muitos destes jovens estiveram nas ruas contra o aumento dos deveres universitários na luta de 2010. O feito de que não se atingem diretamente o partido laborista indicaria sua reticência a um dos partidos principais do regime e seu ex lider Tony Blair, enquanto qu guardam expectativas no deputado laborista e referente esquerdista Corbyn.

Que papel pode cumprir Left Voice?

Desejamos que Left Voice se desenvolva como um instrumento que nos permita estabelecer um diálogo as setores desencatados co os partidos tradicionais, que buscam uma nova forma de fazer política, que se opõe as injerências guerristas e são contestadores das alternativas dominantes e buscam participar n vida política. Queremos abrir nossas páginas como tribuno aberto para os milhares de jovens que busca se organizar contra esse sistema de opressão.




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