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GIRO PELA AMÉRICA LATINA | A que veio fazer o primeiro-ministro de Israel na América Latina?

Benjamin Netanyahu, primeiro-ministro de Israel acaba de passar pela Argentina, a primeira escala de uma agenda de visitas de 10 dias que segue por Colômbia e México e culmina em Nova York, onde se reunirá com o presidente estadunidense e participará na Assembléia Geral das Nações Unidas.

Claudia CinattiBuenos Aires | @ClaudiaCinatti

sexta-feira 15 de setembro de 2017 | Edição do dia

Enquantro que em outros rincões do mundo Netanyahu é considerado um criminoso de guerra, o presidente argentino Mauricio Macri, o recebeu como um “amigo”. Cedeu-lhe a tribuna da casa rosada para que apresentasse sua lista de reclamações e condenasse ao Irã, acusando esse pais de “promover o terrorismo” em Barcelona, París e Londres, sem importar que o Estado Islâmico reivindicou esses atentados, é um inimigo impetuoso do regime iraniano.

Desde seus anos de chefe de governo na cidade de Buenos Ayres, Macri vem construindo uma relação institucional e pessoal com Netanyahu. É conhecida sua predileção pelos serviços de inteligência do Estado sionista. Com sua chegada à presidência esses vínculos se estreitaram. Grande parte da inovadora parafernalha repressiva e de vigilância que empregam as forças de segurança locais são de origem israelita e tem sido testadas primeiro nas ruas da Cisjordânia e os territórios ocupados contra a resistência palestina.

Os benefícios parece serem mútuos. Netanyahu usou sua visita à Argentina para ampliar sua mensagem a Washington e Macri para agitar a causa contra a CFK pelo memorando de Irã, que serve tanto para aprofundar a polarização eleitoral como para dissolver o impacto do caso Maldonado.

Na Colômbia, Netanyahu ficará ainda mais à vontade. Os governos da direita colombiana tem sido aliados incondicionais, ao ponto de ser um dos poucos países da região que segue sem reconhecer nas Nações unidas ao Estado Palestino. Os une a guerra suja e o terrorismo de Estado, na Colômbia contra as FARC, em Israel contra a resistência Palestina.

No México há que se observar, mais além da boa vontade do governo de Peña Nieto e dos múltiplos negócios, como se dirige o apoio explícito que Netanyahu prestou a Trump para a construção do muro na fronteira com esse país.

A turnê latinoamericana de Netanyahu deve ser que interpretada como parte de uma política exterior proativa que tenta aproveitar o clima geopolítico mais amistoso para os interesses da extrema direita sionista, sob a cobertura da “guerra contra o terrorismo”, criada com a chegada de Trump à Casa Branca e, em particular, pela mudança de signo político na América Latina, com governos mais propensos ao alinhamento automático com a Casa Branca. Há que se recordar que durante as duas presidências de Obama as relações entre Tel Aviv e Washington havia alcançado seu ponto mais baixo, ainda que sem questionar a aliança estratégica entre os Estados Unidos e Israel. Netanyahu considerou quase uma traição o acordo nuclear com o Irã e desafiou a política diplomática do então presidente estadunidense incrementando a construção de assentamentos de colonos na Cisjordânia e Jerusalém.

Os objetivos do primeiro-ministro israelense, mais políticos que econômicos (ainda que também o sejam), são precisos e ambiciosos, tendo em conta a crise interna de seu governo e o desprestígio do Estado de Israel por seus crimes de guerra. São objetivos:

Recompor a legitimidade internacional do Estado de Israel, em particular, gerar uma contratendência à exitosa campanha BDS (Boicotes, desinvestimentos e Sanções) da qual participam centenas de organizações e acadêmicos de todo mundo, entre eles muitos de origem judaica, que põem em primeiro plano a condenação à ocupação militar e o terrorismo de estado exercido contra o povo palestino.

Reverter a chamada “maioria automática” nas Nações Unidas, onde pela primeira vez em dezembro do ano passado, a abstenção de Estados Unidos – ainda sob a presidência de Obama porém já com Trump eleito – permitiu que se chegasse a uma condenação de Israel pela expansão dos assentamentos ilegais em territórios palestinos.

Criar, se não um sistema de alianças, ao menos uma massa crítica de apoio na “comunidade internacional” que convença a Trump e ao congresso norte-americano a endurecer a política contra o Irã. Isso implicaria minimamente reformular os termos do acordo nuclear e maximamente repudiar esse acordo sem descartar alguma ação militar pontual contra objetivos iranianos. Nisso Israel tem um acordo de conveniência com a monarquia da Arábia Saudita que rivaliza com o Irã pela hegemonia regional.

Garantir que nunca vai existir um Estado Palestino, nem sequer na configuração atual de gueto e absolutamente compatível com um regime de apartheid.
Porém, nem tudo são flores para Netanyahu. No plano externo acaba de sofrer um golpe com a suspensão por parte dos governos africanos da primeira cúpula entre Israel e África que se realizaria em outubro, a resistência partiu de movimentos solidários com o povo palestino.

Enquanto na geopolítica regional, está claro que a Trump não falta vontade para avançar contra o regime iraniano. De fato sua primeira viagem ao exterior, que foi ao Meio Oriente, culminou com a conformação de uma “aliança sunita” contra o Irã, encabeçada pela Arábia Saudita. Porém, em cima da hora, essa política se mostrou exacerbar ao extremo os conflitos em uma região já incendiada. Além de que, por agora, o conflito com a Corea do Norte (quer dizer, com a China) concentra grande parte da política exterior estadunidense.

No plano interno, seu governo,, uma coalizão instável de organizações e indivíduos da extrema direita sionista, atravessa uma crise de magnitude.
Netanyahu está sendo investigado por pelo menos três casos de corrupção, um deles envolve também sua esposa e membros de sua família. Em um ato organizado pelo Likud, o partido da direita ao qual pertence netanyahu, o primeiro ministro acusou a oposição, à “esquerda” e á mídia de querer dar um “golpe de estado” e substituir seu governo por outro que faça “concessões aos palestinos”. . Isso o leva a superar as medidas contra a população palestina, desde a expansão dos assentamentos até pedir a pena de morte para “terroristas” e ameaçar de fechar a filial israelense da cadeia Al Jazeera.

Por hora a unidade de seu partido se mantém, porém se avançarem as denúncias não se pode descartar uma evolução da crise política. O antecedente mais próximo é o do ex-primeiro ministro Ehud Olmert, que renunciou para evitar ser destituído por casos de corrupção, e foi sentenciado a um ano e meio de prisão.

O outro grande escândalo que enfrenta Netanyahu por esses dias é sua lentíssima reação contra as manifestações neonazistas em Charlottesville, Estados Unidos, e a indulgência diante das declarações justificatórias de Trump em um dos piores atos de violência racista. Como se não fosse pouco, seu filho também lhe vem dando dores de cabeça. Nenanyahu Junior resolver caricaturar a inimigos de seu pai, entre eles o magnata soros e ao ex-primeiro ministro Ehud Barak, com simbologia antissemita, o que foi celebrado por grupos da “alt right” estadunidense.

Ainda que pareça um paradoxo, o que une a extrema direita neonazista e israelense está com Trump, com a extrema direita sionista é o racismo, o colonialismo e a xenofobia. Contra as minorias latinas, os negros, os árabes e muçulmanos.
Os crimes do estado de Israel contra o povo palestino são cada vez mais difíceis de ocultar. Não só os grandes massacres, como a operação “Margem de proteção” para nomear só a última guerra israelense contra a Faixa de Gaza, mas o pesadelo da vida cotidiana de milhões de Palestinos que vivem sob a ocupação militar, como cidadãos de segunda em Israel ou como refugiados permanentes na Jordânia e outros países da região.

A manobra de comparar a crítica ao Estado sionista com o antisemitismo perdeu efetividade. Entre aqueles que denunciam essa situação colonial há dezenas de milhares de pessoas de origem judaica que formam parte de campanhas como BDS. O historiador Ilan Pappé documentou valentemente não só o “fato colonial” da fundação do Estado Sionista sobre a base da limpeza étnica da população local, mas também a perpetuação do terrorismo de Estado, ao que se chama de “genocídio incremental”. E contra a reafirmação do caráter exclusivamente judio do Estado Sionista, propõem um Estado único binacional, aproximando-se da posição da esquerda árabe laica que encarnava figuras como o intelectual Edward Said.

Este debate estratégico está aberto. Porém, mas além de como se resolva a situação colonial que está na essência mesma do Estado sionista, e que é um componente fundamental da política imperialista no meio Oriente é o que recria permanentemente, desde a Argentina até os Estados Unidos, e desde a Europa até a África, a solidariedade dos explorados e oprimidos com a resistência do povo palestino e a defesa de seu direito à autodeterminação nacional.

Tradução: Zuca Falcão




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