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OPINIÃO | A luta negra nos EUA veio para ficar

Os recentes protestos no país após mais um assassinato da polícia e a luta pela sindicalização na Amazon mostram que, apesar dos fluxos e refluxos momentâneos que o movimento possa sofrer, a luta negra veio para ficar apesar de todas as tentativas de cooptação do Partido Democrata.

sexta-feira 16 de abril de 2021 | Edição do dia

A luta negra nos EUA, encarnada no movimento “Black Lives Matter” se constituiu na maior mobilização dos EUA. Mesmo durante a pandemia, milhões de pessoas encheram às ruas do maior imperialismo do mundo para protestar contra o racismo, pilar da atual estrutura política e econômica dos EUA. Os protestos que começaram em rechaço ao assassinato de George Floyd, mas rapidamente começaram a questionar profundamente o racismo sistêmico dos EUA e demandarem o desfinanciamento da polícia e em alguns casos mais radicais até mesmo a sua abolição. Movimentos históricos, como o movimento pelos direitos civis e os Panteras Negras.

Os protestos agudizaram a crise política americana, já marcada pela crise em sua hegemonia, pela catastrófica gestão da pandemia e pela crise econômica. O forte questionamento ao sistema político do país constituiu um problema de primeira ordem para o imperialismo. Os protestos foram um dos temas principais nas eleições, cujo o ganhador foi Joe Biden do Partido Democrata, que tem como principal objetivo tentar cooptar a mobilização para uma via institucional e por dentro do partido Democrata e relegitimar o sistema político do país.

Após o auge em maio e junho do ano passado, a mobilização foi perdendo tração, ainda que tenha ocorrido manifestações importantes depois de que policiais atiraram em Jacob Blake. Conforme a conjuntura eleitoral foi se impondo aumentaram as ilusões que a eleição de Joe Biden pudesse trazer uma resposta à situação. Ilusões que foram semeadas por muitos setores da esquerda, como Bernie Sanders, os Democratics Socialists of America e vários grupos de esquerda mundo a fora. No entanto – para o desespero de Wall Street e seus agentes no Partido Democrata - engana-se quem acha que o movimento termina aí.

Esse movimento não pode ser analisado apenas pelos seus números e resultados imediatos. Para além dos fluxos e refluxos, marca uma inflexão muito importante na subjetividade dos trabalhadores e dos setores oprimidos do principal imperialismo, tendo reflexos globais.

Um dos primeiros efeitos foi sentido no movimento operário. Entre março e maio, ocorreram pouco mais de 260 greves, segundo o Payday Report. Entre 1 de junho e de 1 de julho esse número saltou para 600. O apoio a sindicalização também aumentou, sendo maior na população negra. Vale dizer que a sindicalização e o apoio à mesma já vinha crescendo nos últimos anos nos EUA, fruto das crises que já se arrastava nesse país.

Esses elementos, ainda que muito incipientes, são muito significativos se pensamos que ocorre na principal potência imperialista do mundo. Também é, dentre os países desenvolvidos, um dos que foi mais atingido pela reação ideológica desencadeada com a ofensiva neoliberal e a restauração burguesa, levando à uma crise subjetiva que representou um retrocesso imenso da sindicalização desde as últimas décadas do último século. Dessa forma, os EUA são o país imperialista com menor taxa de sindicalização, processo que de forma lenta começou a se reverter nos últimos anos e pode ganhar força impulso das últimas mobilizações.

Isso já pode ser sentido na luta pela sindicalização da Amazon. Os trabalhadores do segundo maior empregador dos EUA não são sindicalizados no país – ao contrário do que ocorre na Europa. Não é por acaso que o movimento começou em Bressemer, cidade do Alabama cuja maioria da população é negra e que tem histórico também na luta pelos direitos civis. Apesar de terem perdido a votação para se sindicalizar – após uma campanha anti-sindical ferrenha e ilegal da Amazon – vários outros depósitos da Amazon começaram a discutir a sindicalização, o que pode ser o início de um movimento mais generalizado no país sede da empresa do homem mais rico do mundo.

Outro fato também marcou nos últimos dias. Após Daunte Wright, homem negro, ter sido morto desarmado pela polícia, vários protestos nos EUA se desencadearam nos últimos dias. A situação pode ficar mais tensa após o vazamento de um vídeo ontem que mostra o assassinato pela polícia de Chicago de uma criança de 13 anos desarmada.

Os fatos recentes narrados mostram que as mudanças na subjetividade dos trabalhadores e oprimidos americanos são muito mais profundas do que os refluxos parciais no movimento. Também mostram que não será fácil para o Partido Democrata desviá-lo. A cada conflito que ocorrer, será uma experiência que os setores que ainda mantém ilusão em Biden e nos Democratas verão suas expectativas se chocarem concretamente com a política do governo. Ao mesmo tempo, cada luta nos EUA também tem repercussões em todo o mundo.

Lutar para acelerar a experiência das massas com Biden e os democratas e batalhar por construir um partido revolucionário, antirracista e anti-imperialista nos EUA é uma tarefa fundamental para a esquerda nesse país e é nessa perspectiva que o Left Voice, grupo irmão do MRT nos EUA se coloca.




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