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ENTREVISTA COM PLÍNIO DE ARRUDA SAMPAIO JR | “A lógica dos ajustes e os desafios da esquerda”

sexta-feira 27 de março de 2015 | 00:00

Entrevistamos Plínio de Arruda Sampaio Jr, professor de Desenvolvimento Econômico do Instituto de Economia da Unicamp.

Esquerda Diário (ED): Como você vê a situação do país depois dos atos dos dias 13 e 15?

Plínio: Os atos do dia 13 e do dia 15, evidenciam a presença de uma grave crise política no país. Quando o partido da Ordem vai às ruas para disputar a condução do Estado, é porque o sistema representativo já não funciona mais. E isto, é um sintoma grave de crise. As frações do partido da Ordem estão se engalfinhando numa luta fratricida e isto aponta, para uma perspectiva de uma situação de grande instabilidade política. Este é o primeiro ponto que acho importante ter claro, o segundo ponto, é que os atos do dia 15, embora demostrem uma divisão do partido da Ordem, eles também revelam uma unidade forte do partido da Ordem em torno da prioridade dada ao ajuste como solução para os problemas brasileiros.

O partido que marchou no dia 13, pediu ajustes com defesa do patrimônio público, reforma política e defesa dos direitos humanos e trabalhistas é uma quadratura do círculo, uma impostura. Na verdade, o dia 13 pediu: “respeite as regras do jogo”. O dia 15, sob um mote de defesa da ética e contra a corrupção, na verdade, ameaçava o governo com o espectro de um golpe institucional, preferencialmente, não institucional, caso necessário. O que revela que a instabilidade política nas altas esferas do poder, vai se somar a uma instabilidade social.

Terceira coisa que acho importante, depois do dia 13 e do dia 15, é que o PT colocou a direita da ordem na rua e a presença da direita da ordem na rua, em certo sentido, instiga os trabalhadores a também fazerem política na rua. Então, por mais paradoxal que possa parecer, o PT ensina, em certo sentido, a direita a ir pra rua, mas a direita, indo a rua, por um mecanismo contraditório, mostra para a população que a maneira de fazer política, no momento atual, e que vai tomar a política é quem for pra rua. Então acho que, a partir do dia 15, população brasileira está fazendo um aprendizado, está amadurecendo politicamente.

Na verdade, as manifestações do dia 13 e do dia 15 foi a maior aglomeração de corruptos já vista no mundo, em defesa do fim da corrupção, porque os dois lados não tem nenhuma moral para pedir o fim da corrupção. No entanto, eles são muito bem recebidos. Mas, quando o povo vai pra rua pra pedir água, saúde, educação, é recebido com pancadaria. Estes dois atos foram atos que mudam a dinâmica da política. E a mudança básica é a crise política de tal ordem que os problemas não se resolvem mais exclusivamente nos palácios, nos gabinetes, agora, as pessoas vão ter que mostrar poder efetivo de mobilização e isto é uma outra dinâmica na vida política brasileira.

ED: É possível dizer que o Brasil caminha para uma deterioração econômica em meio à crise econômica internacional?

Plínio: A situação econômica do Brasil é bem difícil. Nós estamos agora colhendo as contradições do ciclo anterior de expansão. A situação europeia é gravíssima e muito instável a economia chinesa, que é a economia que dava algum fôlego a economia mundial, desacelera num ritmo superior aquele que as próprias autoridades chinesas imaginavam e a economia americana que está um pouquinho melhor, não está robusta. A melhoria da situação econômica americana, tem um efeito negativo no Brasil. As autoridades monetárias norte-americanas vão começar a aumentar as taxas de juros e isto, para o Brasil, significa um maior risco de fuga cambial e a necessidade de aumentar o prêmio que se dá para o capital para este entrar no Brasil, ou seja, as taxas de juros, o que agrava ainda mais as tendências recessivas.
A situação é ruim pelo lado internacional e nacional. As famílias brasileiras estão endividadas, o desemprego tende a diminuir a renda e criar problemas de inadimplência e o ajuste fiscal diminui a capacidade de gastos do Estado e gera incerteza com relação ao papel do Brasil na redivisão Internacional do Trabalho. Esta situação não faz com que o Brasil seja a rota dos IDE (Investimento Direto estrangeiro) dos grandes conglomerados internacionais e assim expanda sua capacidade produtiva.

Isto tudo quer dizer o que? Que não haverá crescimento nem em 2017 e nem num prazo que consigamos deslumbrar. O que temos pela frente? O ajuste, que é aumentar a liberalização da economia, diminuir direitos dos trabalhadores e criar negócios. Estes negócios podem ser na área de petróleo, na privatização dos bancos públicos, na privatização da água, enfim, o que tiver de negócio o capital internacional, em tese, vai examinar pra ver se é de interesse ou não. Nós estamos no início de um longo ciclo de crise econômica que vai ser administrada pela lógica do ajuste da econômica brasileira às exigências do capital internacional.

ED: Você vê um governo de Dilma Rousseff mais débil nos próximos anos?

Plínio: Se o governo da Dilma, ficara mais fraco? Bom, o governo da Dilma... ele já começou fraco antes dela assumir. O governo já estava vivendo uma crise econômica, uma crise política profunda. A crise vem de vários lados: de um lado, é uma crise dentro do próprio governo e dentro da própria base de apoio do governo e dentro do partido de sustentáculo da Dilma, a base do governo. A Dilma, monta um arco de alianças que se alimenta no assalto ao patrimônio brasileiro, na verdade, nos propinodutos. É isto que o Caso da Petrobrás está mostrando (...).

Dilma não controla os seus ministérios, não controla ao PT e não controla a sua base de aliados. Então na verdade, ela não manda nada. E, em momentos de crise, o papel negociador do líder é vital. O que nós vamos ver nos próximos anos é um governo fraco, comandado por uma, digamos, uma pessoa que não tem nenhuma capacidade de interlocução com as coisas políticas que ela representa ali dentro. [Dilma] é desacatada todos os dias pelo presidente da Câmara e do Senado, pelo Judiciário e a mídia e pelo partido que lhe dá sustentação. (...)

Por enquanto, a burguesia tem ajustes mais a cooptação de sindicatos e movimentos sociais e isto ainda é conveniente, quando não for conveniente, a burguesia libera os operadores dos partidos da direita e da ordem para que eles coloquem em marcha um golpe democrático que será feito sem cerimônia, porque este é um novo mecanismo de golpe na democracia burguesa contemporânea na América Latina.

ED: Acredita que o governo federal conseguirá passar as medidas de ajuste contra os trabalhadores?

Plínio: Eu acho que sim, que a coalizão da ordem está determinada a passar os ajustes, deste ponto eu não vejo nenhum problema maior, a não ser pequenas rusguinhas que são utilizadas para a pequena política. Há um consenso entre os partidos da ordem que agora é necessário fazer o ajuste. A premissa é fazer os ajustes e as coisas vão voltar a crescer. Os ajustes só não serão feitos se houver uma composição forte dos trabalhadores. (...) Isto supõe que a classe trabalhadora consiga se desvencilhar do PT.

A premissa desta resistência para que ela tenha força e a amplitude necessária para barrar os ajustes e não apenas para uma negociação corporativa de como o ajuste vai ser feito em cada setor, depende primeiro: que a classe trabalhadora perca qualquer ilusão em relação à capacidade do PT de defender seus interesses ou até de atenuar os ataques aos seus interesses. Depende da liquidação do PT e da sua desmoralização na classe operária. Coisa que eu acho que está em marcha (...). Depende, em segundo lugar, da classe trabalhadora criar instrumentos políticos concretos para poder transformar a energia de resistência, a força da classe operária em força política concreta. E isto, na minha opinião, passa pelo que eu chamo de superação do programa democrático popular, pela superação do PT.

Eu acho que a classe operária não precisa negar o PT, ela precisa superar o PT. O que quer dizer, superar o programa democrático–popular? É compreender que o tempo dos marcos institucionais, a classe trabalhadora não consegue acumular forças suficientes (...) acabar com qualquer ilusão em relação à possibilidade de um capitalismo dócil (...) e de que o poder vem com a eleição de deputados e senadores, com a ocupação do Estado.

Em resumo. O primeiro pré-requisito é que a classe trabalhadora perca todas as ilusões no PT. O segundo requisito: é a superação do programa democrático popular e a construção de novos instrumentos. Isto será feito com um processo histórico de luta concreto e, em certo sentido, isto já está sendo feito. Lentamente.

ED: Como vê as mobilizações de resistência entre os trabalhadores e a juventude nesse ano?

Plínio: É importante termos a capacidade e competência de aturarmos juntos [diferentes tradições da esquerda] respeitando nossas divergências, senão, seremos trucidados pela ofensiva do capital. (...) Como o partido da ordem se junta? Contra o medo do povo, ou seja, ele não terá hesitação em reprimir os de baixo. Se os de baixo não estiverem fortes, unidos, conscientes, a burguesia vai aplicar uma nova rodada de ajustes que será muito mais dolorosa ainda e que a classe trabalhadora vai, digamos, sofrer duramente este processo. É isso.




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