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EDUCAÇÃO | A educação pública como alvo

Danilo ParisEditor de política nacional e professor de Sociologia

Mauro SalaCampinas

terça-feira 23 de agosto de 2016 | Edição do dia
foto: Michael Jastremski

Nesse contexto de crise econômica e política, a educação tem sido tema de um intenso debate. Infelizmente, os motivos que fazem da educação tema central no debate político são, na grande maioria das vezes, puramente negativos: estamos debatendo intensamente a educação porque ela tem se tornado um dos alvos preferenciais de ataque do grupo que assaltou o poder governamental.

A “agenda” que debatemos na educação passa, sobretudo, por como resistirmos a esses ataques que precarizam ainda mais a já tão combalida educação pública nacional. Como lutar contra a PEC que congela o orçamento para a educação, contra os cortes no orçamento e a reforma no Ensino Médio, contra a terceirização e privatização da educação, contra a tal mal afamada reorganização escolar paulista e projetos como o “Escola sem Partido” tem se tornado a preocupação central daqueles e daquelas preocupadas com a educação pública em nosso país.

O Projeto de Lei 257/2016, ou “Plano de auxílio aos Estados, Municípios e Distrito Federal”, apresentado pelo Ministro da Fazenda de Dilma, propõe renegociar as dívidas dos Estados e municípios mas exigindo contrapartidas de ajustes, congelando os gastos em serviços públicos e com os servidores, precarizando ainda mais esses serviços. Se se concretizar esse projeto de lei, os professores não vão mais poder ter aumento real de salário, mantendo-o no nível reconhecidamente baixo que temos hoje.

Somado a esse ataque, temos a PEC 241/2016, proposta pelo golpista Michel Temer. Esse Projeto de Emenda Constitucional pretende alterar a Constituição estabelecendo um novo regime fiscal. O ele que faz é estabelecer como o limite máximo o que antes era o limite mínimo a ser investido em educação e saúde. Ele propõe que o investimento em educação seja congelado por vinte anos, só podendo ser reajustado pela inflação do período. Se aprovada, essa emenda constitucional tomará como base o orçamento de 2016, tomando como parâmetro um ano em que a educação, como sabemos, sofreu cortes bilionários. É nesse nível orçamentário, obtido após imensos cortes (só a Dilma cortou mais de R$ 18 bilhões da pasta nos últimos dois anos), que o governo Temer quer manter o investimento em educação pelos próximos vinte anos.

Com esses dois projetos, não poderemos cumprir nem o Plano Nacional de Educação recuado que a presidenta Dilma sancionou em 2014, que prevê a equiparação salarial dos professores com os demais profissionais de nível superior até 2018, e o aumento do investimento nacional em educação até atingir 10% do PIB em 2024.

Esses projetos visam estabelecer de forma contínua os ataques que já sofremos de forma pontual.

Se lembrarmos dos cortes na educação que sofremos nos últimos anos de governo Dilma e nos atuais cortes que o Temer nos quer impor, podemos ter uma medida do que isso poderá significar.

Só esse ano, as Universidades Federais tiveram redução de 45% em sua verba de custeio e manutenção; e a Rede Federal de Educação Ciência e Tecnologia também vem sofrendo enormes cortes, mesmo tento ampliado bastante o número de matrículas e de unidades nos últimos anos.

Para se ter uma ideia, esse mês o MEC divulgou a verba para a manutenção dos Institutos Federais para o ano que vem, e é compatível com o orçamento de 2012, quando a Rede federal contava com um terço das 606 unidades atuais e pouco mais da metade dos 880 mil matriculados que temos hoje. São quase R$ 400 milhões de corte no orçamento para o ano que vem. Corte esse que se soma ao corte de mais de R$ 250 milhões feitos por Dilma em 2016.

Além desses ataques com cortes no orçamento da educação, também estamos diante de propostas de reformas que atacam a educação em sua concepção. O próprio MEC está discutindo uma proposta de reformulação do Ensino Médio que vai na direção de uma maior diferenciação dos percursos escolares, acentuando as características da “dualidade escolar”, que redundará em uma formação profissional ainda mais desprendida da formação geral para os jovens da classe trabalhadora. Trata-se de uma formação profissional ainda mais aligeirada para os jovens trabalhadores, onde a formação técnica será reduzida à simples qualificação profissional, separando ainda mais o fazer do saber.

Também no estado de São Paulo a educação tem sofrido ataques.

No Ensino Superior paulista também foram imensos cortes de verbas. Juntas, a USP, a UNESP e a UNICAMP perderam cerca de R$ 286 milhões em seus orçamentos em 2016. Esses cortes deram razão à greve nas estaduais paulistas que lutaram contra os cortes, mas também contra o golpe e por cotas raciais. E agora o corte de 20% no PIBIC-UNICAMP mostra que esses ataques seguirão.

Mas não é só no Ensino Superior Paulista que vemos esses ataques. A educação básica paulista também tem sido alvo de duros golpes. Além de seus professores não terem reajuste pelo segundo ano seguido, gerando perda salarial de quase 20%, o governo tucano de Geraldo Alckmin insiste com o seu projeto de reorganização escolar que, apesar de ter sido derrotado pelas ocupações de escolas pelos estudantes secundaristas no ano passado, tem fechado milhares de salas por todo estado enquanto mantém outras milhares superlotadas.

O projeto é claro: precarizar a educação pública para preparar sua privatização.

Não à toa, é nesse contexto que a Kroton se funde com a Estácio criando um imenso monopólio do Ensino Superior no país, que controlará mas de 1,6 milhão de matrículas. E também é nesse contexto que redes inteiras são entregues à gestão privada, privatizando a educação pela terceirização de sua oferta e de sua gestão.

É diante desses ataques que se faz fundamental uma lei como a da “Escola Sem Partido”. Pois diante de tantos ataques contra a educação é necessário impedir qualquer politização por parte dos estudantes, professores e demais trabalhadores das escolas. O “Escola Sem Partido” é o “cala boca” necessário para tentar diminuir as resistências contra os ataques já implementados, os já anunciados e os que virão.

O governo sabe o que a politização da juventude contra esse projeto de desmonte da educação pública é capaz. As ocupações das escolas por todo país o mostraram. Assim eles tentam duas saídas: ou buscam canalizar a seu favor essa politização da juventude, controlando os instrumentos de organização dos estudantes como os grêmios, como tenta fazer o governo paulista; ou buscam implementar uma Lei que simplesmente busca silenciar o coro dos descontentes, como quer o “Escola Sem Partido”.

É diante desses ataques que a educação tem se tornado pauta de intensos debates. Embora os ataques sejam muitos, eles não podem nos acovardar. Nossas escolas e universidades são nossas fortalezas. É partindo delas que teremos que resolutamente nos unir a todos que querem defendê-las dos ataques que querem precarizá-las para privatizá-las. Não precisamos de menos verbas, menos escolas e menos professores; precisamos de mais. Mais verbas para que possamos remunerar melhor nossos professores, mas também para que possamos reduzir o número de alunos por sala. Mais verbas para ampliarmos ainda mais o número de vagas para finalmente atingirmos a universalização da educação básica no país. Mais verbas para acabar com a falta de vagas na educação infantil, direito da criança e de sua mãe. Mais verbas para que possamos transformar as boas escolas e universidades públicas em espaços que possam ser ocupados por todos os jovens, sem terem que se acotovelar no filtro social que é o vestibular. Mais verbas para garantir não só o acesso desses jovens à educação, mas também sua permanência. Mais verbas para realizar a sempre prometida escola pública, gratuita e de qualidade. Assim, a educação deixará de ser o alvo e passará a ser nossa meta.




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