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OUTRA ENORME MOBILIZAÇÃO LIDERADA POR GREVISTAS E PELA JUVENTUDE NA FRANÇA | 350 mil pessoas marcham em Paris contra a reforma de Macron

Os manifestantes se sucedem e não parecem ser os mesmos. Se a manifestação do dia 16 esteve longe de ser honrosa, o dia de greve e a manifestação em Paris desta sexta (24) confirma que o movimento não está morto. Muito longe disso.

sexta-feira 24 de janeiro de 2020 | Edição do dia

Muito bem, se tomarmos como elemento de comparação a paralisia quase completa dos transportes nas semanas passadas, podemos dizer que chegamos a outra etapa. Não resta dúvida que a RATP (rede rodoviária que cobre Paris) ficou extremamente interrompida hoje em razão do número de grevistas entre motoristas e maquinistas, além de outros setores, que estão se inserindo na mobilização. Será isto uma conquista? Os próximo dias determinarão, mas só de ver o nervosismo do governo é claro que essa hipótese não está completamente fora do radar.

O impacto é talvez menos visível ao nível dos transportes comunitários, porém a greve esteve bem na ordem do dia em Ile-de-France, no seu 51° dia de mobilização desde 5 de dezembro, e pela 7° jornada nacional de greve entre categorias convocada pela intersindical desde o início do movimento. Esse cenário também possui seu sentido na sequência histórica de lutas. Não importa o quanto Macron fale até ficar rouco, que suas polícias lancem suas armas de forma ostensiva, que alguns ministros cresçam seus músculos, que outros prometam diálogo e negociações no debate parlamentar, nada muda. A rua continua sendo nossa!

O primeiro elemento que confirma o enraizamento da mobilização é o seu tamanho e o dinamismo de uma vasta mobilização que teve como vanguarda os jovens e os grevistas, organizados em torno de suas instituições, universidades, garagens rodoviárias, estações ferroviárias e locais de trabalho. No começo da manifestação, à frente do bloco liderado pelo sindicato oficial, cuidadosamente cercado por um solido SO, havia um longo desfile de grevistas, todos muito ressentidos contra Macron e seu mundo. Na realidade, não é apenas a reforma previdenciária apresentada esta sexta no Conselho de Ministros que está na mira dos manifestantes: também está a escolha de um tipo de sociedade em que é sintomático que ela seja contestada por, literalmente, “todo o mundo”.

O presidente é vaiado nos blocos de rua, seguido de perto no Top 10 dos mais detestados por Jean-Michel Blanquer, seu ministro da Educação, logo um dos mais populares do governo até pouco tempo. Os professores, na prática, constituíram a maior parte dos manifestantes em Paris, que partiu às 15h da Praça da Concórdia. Instituições em luta, reagrupamentos por bairros ou localidades, bandeiras departamentais como a de professoras e professores (muito mobilizados por sinal) e a de diversas instituições escolares. Todos reunidos ali reivindicam em seus cartazes e intervenções de fazerem parte dos “0,1%” de professores que se opõem à greve, como afirmou o ministro da Educação, na sua nova versão. Testes escolares não puderam ser realizados hoje, exceto sob cobertura policial, como ocorreu no liceu de Lisle-Adam, na região de Val-d’Oise, em que foi ocupado por policiais para que as provas pudessem ser realizadas. Afinal, “0,1%” são muitos manifestantes.

A coordenação grevista RATP-SNCF (rodoviários e ferroviários, respectivamente) finalmente tiveram a inserção de companheiros de dois últimos setores, que para além disso, contou com o dinamismo da mobilização de rua que teve seu início na Praça da República. Na frente e atrás, milhares de professores e estudantes do ensino superior, que com suas bandeiras de faculdade, até mesmo de suas entidades, caminharam lado a lado com seus colegas secundaristas. Em todo o caso, a juventude e os estudantes do ensino superior, por mais que tenham entrado mais tarde na mobilização, marcaram presença. Um dos elementos novos, em comparação com as mobilizações precedentes, é a presença notável de estudantes do ensino superior mais precário, variável dos ajustes feitos em que proporcionou a “universidade 2.0”, que se consolidou durante os governos de Chirac, Sarkozy e depois pelo socialista Hollande, demonstrando que o modelo adotado se generalizou por todas as partes.

O sindicato Interpros, em certa altura da mobilização, se separou do resto do ato junto aos grevistas das linhas de metrô e dos trens regionais da RER, que ainda mantêm a sua pressão contra a reforma. Por todo lado, é claro o orgulho dos trabalhadores de estarem acumulando 7, 15 e até 51 dias de greve e a vontade aberta de continuarem até a retirada total do projeto previdenciário. Um movimento nesse sentido também histórico. Pois, por mais que o texto tenha sido apresentado oficialmente no Conselho de Ministros, com seu corpo de novas emendas, como a aposentadoria aos 65 anos, a greve e a contestação estão ainda profundamente inscritos na paisagem.

Entre os setores particularmente mobilizados e à frente nos atos, inclusive entre os balões dos sindicatos, se notará “todo o pessoal da cultura na rua”, como das bibliotecas e dos museus, da ópera e da Comédia Francesa, dos assalariados da prefeitura de Paris, do ministério do Trabalho, dos trabalhadores e trabalhadoras da energia que estavam por trás de sérias operações de perfuração, dos aeroportos de Paris e da Air France, assim como o pessoal da limpeza e dos esgotos de Paris. Por todo lado a mesma palavra de ordem: a guilhotina de Louis XVI poderá voltar ao serviço em 2020, e Macron não tem nada de bom a oferecer.

Outro elemento notável, diferente da mobilização de 16 de janeiro: o tamanho dos blocos sindicais. Percebemos que as direções se esforçaram para mobilizar as suas bases de maneira mais consequente, com blocos departamentais fornecidos pela FSU, assim como da CGT. Alguns departamentos também estiveram particularmente representados, como o de Val de Marne.

A cifra dada pela CGT foi de 350.000 manifestantes hoje em Paris. Por sua vez, a agência “independente” Occurrence, financiada pela grande mídia, deu uma cifra mais de dez vezes menor: 38.400. O que é certo, no entanto, é que tanto a nível nacional, com 1,3 milhões para a CGT contra 800.000 dados horas antes, é que ao nível de Paris, o 24J marca, se não uma reativação, pelo menos um enraizamento do conflito que deixa à vista de todos, sobretudo nas ruas, o nível de oposição que deve enfrentar o governo em todo o país.

As ações que se querem prosseguir, daqui até a próxima quarta, em que ocorre nova jornada de mobilização, será o teste para avaliar a capacidade de persistência dessa radicalização não convencional, em Paris como em toda a região. Espera-se, por outro lado, que se acabe com as tergiversações, as hesitações e os calendários burocráticos da Intersindical, pois os grevistas e os setores em luta, tanto os que estão desde o início como aqueles que aderiram a menos tempo na mobilização, têm tudo a ganhar se se auto-organizarem para fazer valer suas reivindicações contra Macron e seu mundinho. Enquanto, por outro lado, o governo está longe de ter ganhado essa partida.




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